São Paulo, domingo, 15 de setembro de 2002

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BASTIDORES

Equipes de inteligência acumulam informações sobre o adversário e se preparam para eventual "guerra de dossiês"

Em silêncio, Lula e Serra recolhem 'munição'

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Com a crescente troca de farpas, as campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de José Serra (PSDB) recolheram mais munição pesada uma sobre a outra.
Todas as campanhas presidenciais possuem departamentos de inteligência que atuam na sombra, colecionando dossiês e informações sobre adversários que, quando vêm à tona, são classificados pelos próprios candidatos como jogo baixo.
Um dos objetivos desse arsenal é servir de arma psicológica. O expediente lembra a Guerra Fria, quando as duas superpotências do planeta, Estados Unidos e União Soviética, impunham limites às ações do inimigo ameaçando detonar bombas atômicas.
Por enquanto, os times de Serra e Lula prometem não baixar o nível e usam a munição pesada para uma guerra fria eleitoral. Na última semana, por exemplo, já houve troca de ameaças nos bastidores. Quando circulou que os serristas podiam aumentar a intensidade de ataques a Lula, o PT avisou que o revide seria duro.
A campanha petista ficou contrariada com Serra por suspeitar que partiu de aliados do tucano a divulgação na internet de um vídeo em que Lula faz uma brincadeira em relação à cidade de Pelotas (RS). Na eleição de 2000, ele disse que a cidade era um pólo exportador de homossexuais.

Investigações
A exemplo do que fez com Ciro Gomes (PPS), a Folha apurou que o time de Serra colecionou frases infelizes e críticas de Lula sobre Itamar Franco e José Sarney, dois ex-presidentes da República que apóiam o petista e hostilizam o candidato do PSDB.
Amigos e familiares de Lula foram investigados. As administrações do PT, especialmente as do Estado do Rio Grande do Sul e as prefeituras de São Paulo e de Santo André, receberam visita de equipes de TV e de assessores indiretos (profissionais que não participam da campanha e, portanto, não podem ser ligados diretamente ao candidato).
A equipe de Lula não está passiva. O PT recebeu informações sobre movimentação financeira e transações imobiliárias de amigos e familiares de Serra e de outros caciques tucanos.
Por enquanto, peças com críticas a Lula são testadas pela campanha de Serra em pesquisas qualitativas -levantamentos em que se mede a reação imediata de pequenos grupos de perfil predeterminado (só eleitores de um candidato, por exemplo).
O recurso ao ataque é cuidadosamente estudado, porque o tiro pode sair pela culatra. O marketing serrista avalia, por exemplo, que Lula tem imagem consolidada de honestidade, já passou por três eleições presidenciais e que o ataque tem de se concentrar na falta de experiência administrativa do petista e em problemas das administrações do partido.
O eventual uso de informações do arsenal pesado será obrigatoriamente submetido a uma bateria prévia de testes em pesquisas qualitativas.
O banco de dados de Serra é o mais abrangente. Há até pastas sobre tucanos, como o ministro Paulo Renato Souza (Educação) e o ex-governador Tasso Jereissati (CE). Ambos, em momentos diferentes, disputaram com Serra a indicação presidencial do PSDB e foram derrotados.
A Folha conversou com dirigentes de campanha que contaram como funciona a busca por este tipo de informação.
Parte do trabalho é feita por assessores. Normalmente, ex-repórteres vasculham arquivos de jornal, de rádio e de TV em busca de declarações infelizes e contraditórias com o discurso atual.
A campanha negativa no horário eleitoral gratuito que Serra usou para derrubar Ciro do segundo para o terceiro lugar nas pesquisas foi quase toda preparada por uma equipe assim.
Ciro disse que a campanha foi suja. Mas a Justiça Eleitoral e até Lula, adversário de Serra, disseram que a propaganda serrista era aceitável porque mostrou o que o próprio Ciro declarara.
A parte que se costuma chamar de "trabalho sujo" cabe a profissionais sem vínculos partidários que aproveitam as temporadas eleitorais para grampear adversários, procurar antigos desafetos que possam dar testemunhos incômodos e até bisbilhotar a vida íntima dos candidatos.
Geralmente, o candidato tem um assessor ou amigo mais discreto que se encarrega do contato com profissionais da sombra. Às vezes, um dublê de empresário e financiador de campanha é quem encomenda e paga o serviço.
Ex-policiais e ex-funcionários do extinto SNI (Serviço Nacional de Informação, órgão criado no regime militar) têm forte atuação nesse ramo. Serviços de inteligência de polícias militares também são usados, de forma não assumida, por políticos com influência em seus Estados.


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