São Paulo, quarta-feira, 15 de setembro de 2004

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CANDIDATOS NA FOLHA/SERRA

Tucano diz que, se eleito, fará "estudo com viés para o cancelamento" do contrato de R$ 10 bilhões, que ainda precisa ser homologado, e deixou a impressão de que pode buscar apoio do PP no 2º turno

Serra admite rever licitação do lixo e evita críticas a Maluf

Jorge Araújo/Folha Imagem
O candidato José Serra, durante sabatina promovida pela Folha


JOSIAS DE SOUZA
COLUNISTA DA FOLHA

José Serra (PSDB) disse ontem que vê como "plausível" a hipótese de que tenha ocorrido corrupção na licitação para coleta de lixo em São Paulo, ainda pendente de homologação pela prefeitura. Serra disse que, eleito, fará "um estudo com viés para o cancelamento".
Referindo-se ainda à licitação, o candidato disse que não acha "correto" que a prefeita Marta Suplicy (PT) tenha licitado "um contrato de R$ 10 bilhões, por 20 anos, em final de mandato". Serra foi além: "Na varrição de rua, o que tem de corrupção comprovada não está escrito".
As declarações de Serra foram feitas durante sabatina promovida pela Folha. O candidato tucano foi o terceiro a ser ouvido.
Referindo-se ainda à licitação do lixo, o candidato do PSDB disse que não acha "correto" que a prefeita Marta Suplicy tenha licitado "um contrato de R$ 10 bilhões por 20 anos em final de mandato". Serra foi além: "Na varrição de rua, o que tem de corrupção comprovada não está escrito".
As declarações de José Serra foram feitas durante sabatina promovida pela Folha. O candidato tucano foi o terceiro a ser ouvido. A primeira foi Luiza Erundina (PSB), na sexta-feira passada. E o segundo, Paulo Maluf (PP), ontem. Amanhã, será a vez da prefeita Marta Suplicy (PT).
Antes de submeter-se à sabatina, Serra fez uma exposição de dez minutos. Disse que "essa eleição não será decidida à base de promessas, mas de valores". Ele acha que o eleitor está atento à "biografia" dos candidatos, às suas "idéias" e às "companhias" que ostenta.
"Nosso conceito do que seja governo começa pela concepção republicana", afirmou Serra: "A função do governante é atender ao público, não aos interesses pessoais ou partidários".
Perguntou-se ao candidato se não teria descuidado do quesito "companhia" ao escolher como candidato a vice o pefelista Gilberto Kassab, cuja evolução patrimonial (316%) está sob investigação do Ministério Público. E Serra:
"Não se ganha eleição nem se governa nada no Brasil se não tiver maioria. A aliança com o PFL se impunha, é boa. O problema não é a aliança, mas o que você faz com ela. Eu não farei loteamento político."
Serra prosseguiu: "Ele (Kassab) foi secretário do Celso Pitta. Mas saiu do secretariado e diz que se arrependeu". Quanto às dúvidas patrimoniais que rondam a biografia do companheiro de chapa, Serra disse: "Ele já apresentou os elementos sobre isso. O problema não é aumentar o patrimônio, mas não ter explicação sobre o aumento. Ele tem explicação. Considero o assunto superado".
O candidato do PSDB chegou ao Teatro Folha (Shopping Pátio Higienópolis), local da sabatina, com 13 minutos de atraso. Respondeu a perguntas do psicanalista Contardo Calligaris (colunista da Ilustrada) e dos jornalistas Clóvis Rossi e Gilberto Dimenstein (colunistas e membros do Conselho Editorial da Folha), Renata Lo Prete (editora do Painel) e Nilson Camargo (editor responsável do Jornal "Agora"). Foi inquirido também por pessoas da platéia.

PAULO MALUF
Embora venha sendo criticado com crescente acidez pelo ex-prefeito Paulo Maluf, Serra não quis refutar a hipótese de buscar um entendimento com o malufismo caso venha a participar de eventual segundo turno. De novo, deixou no ar a impressão de que, nos seus planos políticos, as alianças eleitorais podem se sobrepor à seleção das "companhias".
O candidato tucano teve três oportunidades para recusar uma aproximação futura com Maluf. "Cada coisa a seu tempo", disse. "Não vou tratar disso agora", insistiu. Por último, esboçou impaciência: "De novo esse assunto...".

ESTRATÉGIA DO P
Numa analogia com o célebre gesto da mão espalmada de FHC na campanha presidencial, Serra disse que fará uma administração aferrada a cinco letras "P":
1) abre a lista o "P" de "primeira hora". "Trabalharemos desde o início. Não deixaremos coisas para fazer perto da eleição";
2) "parceria": "Não é possível governar apenas a partir da prefeitura. É preciso compartilhar tarefas e projetos com a população, com as ONGs";
3) "prioridades": "Quando tudo é prioritário, nada é prioritário". Na opinião de Serra, as administrações do PT, tanto a de Brasília quanto a de São Paulo, não buscaram fixar prioridades;
4) "planejamento": "Um exemplo magnífico de falta de planejamento é o Fura-Fila". Trata-se, diz Serra, de um projeto ruim e caro. "A atual administração gastou mais do que a anterior. E ficamos no meio do caminho em tudo. Nós faremos diferente";
5) "parcimônia": "Como dinheiro público vem do bolso do contribuinte, é preciso extrair dele o máximo em termos de ganhos financeiros e sociais".

VAMPIROS
Perguntou-se a Serra se não teria negligenciado o"P" de"parcimônia" durante a sua gestão como ministro da Saúde de Fernando Henrique Cardoso, entre 1998 e 2002. Mencionou-se o caso das compras fraudulentas e superfaturadas de hemoderivados pelo ministério. Embora o escândalo tenha estourado no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a Polícia Federal informou que a quadrilha agia no Ministério da Saúde antes, durante e depois da gestão de Serra -pelo menos desde o início dos anos 90.
"Em matéria de parcimônia, eu poderia dar outros exemplos", respondeu Serra. "Poderia citar os medicamentos da Aids. Reduzimos enormemente os preços, inclusive quebrando patentes."
E quanto aos"vampiros": "Não havia essa quadrilha funcionando lá. Os grandes implicados são pessoas contratadas na atual gestão. Os outros são funcionários de carreira", declarou.

SÃO PAULO DOS SONHOS
Para José Serra, a paulicéia ideal se parece com a capital da sua infância. "Não quero voltar no tempo, mas a cidade ideal pra mim é a cidade onde haja mais oportunidades. Quando menino, eu morava numa vila, na Mooca, que tinha 25 casas. Não havia naquelas casas nenhum desempregado. A minha inquietação era o que eu ia fazer. Mas não tinha dúvidas de que ia trabalhar."

CULPAS DE FHC
A propósito do desemprego, Serra foi inquirido acerca das responsabilidades do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na elevação da taxa. O ex-ministro do Planejamento disse que é preciso analisar o fenômeno com perspectiva histórica. O país enfrenta uma "semi-paralisação", segundo as suas contas, "há 23 anos". Quanto a FHC, sua "obra" não privilegiou "o crescimento econômico, mas a estabilização da economia". Lula teria herdado, segundo o seu raciocínio, um país pronto para dar o salto desenvolvimentista, com um "crescimento sólido". Mas "não aproveitou a oportunidade".

SUMIÇO DE FHC
"Por que o ex-presidente Fernando Henrique não aparece no seu horário eleitoral?" Serra aconselhou a Folha que fosse entrevistar o ex-presidente. "Perguntem o que ele acha da minha candidatura e publiquem na Primeira Página. Vai ser mais propaganda." O postulante tucano assegurou que FHC e a mulher dele, Ruth Cardoso, estão do seu lado.

SAÚDE
A propósito da passagem de Serra pelo Ministério da Saúde durante a gestão FHC, perguntou-se a ele por que faz tanto alarde da experiência. "Fiz muitas outras coisas, mas a experiência mais marcante para a população foi a minha passagem pelo Ministério da Saúde."

OUTRA RAZÃO
"Na rua, ouço sempre duas coisas; 90% das pessoas me dizem que suas maiores preocupações são o desemprego e a saúde."

UM TERCEIRO MOTIVO
"Foram os adversários que trouxeram o problema da saúde para o primeiro plano da campanha." Sem mencionar o nome do marqueteiro, Serra insinuou que Duda Mendonça, hoje a serviço de Marta Suplicy, tentou repetir uma "mágica" que realizou na propaganda eleitoral do ex-prefeito Celso Pitta.
"O PT procurou um Fura-Fila novo. E veio com as maquetes do CEU-Saúde. Acontece que o Fura-Fila colou no passado. Agora não cola mais."

ALÉM DA SAÚDE
Serra disse que, obviamente, não se ocupará apenas dos problemas relacionados à Saúde caso venha a ser eleito. "A médio e longo prazo, a educação, por exemplo, tem grande importância". Referiu-se em timbre pejorativo ao projeto CEU-Educação de Marta Suplicy: "Os CEUs têm 5% dos alunos e consumem 40% da verba destina à educação".
O candidato acha que há muito a fazer também para melhorar o problema do trânsito. Repisou uma tecla que vem martelando no horário eleitoral: em parceria com o governo do Estado, investirá em metrô. Planeja proibir o trânsito de caminhões de carga pesada no miolo da cidade durante o dia. Seriam obrigados a transitar à noite e de madrugada.

TERRORISMO ELEITORAL
Serra recusou-se a admitir que foi pioneiro na prática de terrorismo eleitoral. Referindo-se à última campanha presidencial, disse que, pessoalmente, jamais fez terrorismo. Não negou que seus assessores tenham levado ao ar, na propaganda eleitoral, a mensagem de que o governo Lula equipararia o Brasil à Argentina."Mas o que a prefeita (Marta Suplicy) fez agora foi diferente", comparou. Para Serra, Marta estaria jogando o jogo se dissesse que ele faria um mau governo na prefeitura. Mas ela foi além do razoável, acha o tucano, ao dizer que sua eleição eleição geraria crise institucional e que a Brasília petista não se entenderia com uma prefeitura sob mando do PSDB.

EXPECTATIVA DO ELEITOR
Para Serra, são modestas as expectativas do eleitorado. "A população não quer muito. Quer apenas oportunidade e decência na administração pública. Quer saber que tem [na prefeitura] alguém que está do lado dela". Disse que o PT sempre defendeu a tese da ruptura na administração pública. No poder, "eles viraram a anti-ruptura extrema". Na opinião de Serra, o melhor é optar por"um processo gradual de ganhos". Ele explica: "A população precisa sentir que hoje está melhor do que ontem e que amanhã será melhor do que hoje".


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