São Paulo, quinta-feira, 15 de setembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/HORA DA CASSAÇÃO

Em discurso antes de ter mandato cassado, deputado chama Lula de "omisso" e diz que Dirceu tratou Câmara como "prostíbulo"

Corrupção vem do Executivo, diz Jefferson

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

O deputado cassado Roberto Jefferson (PTB-RJ), 52, autor das denúncias sobre o "mensalão", disse ontem no plenário da Câmara, antes do resultado de sua cassação, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cometeu o crime da "omissão" e buscou transferir a responsabilidade pelo escândalo para o Congresso.
"Estamos em uma guerra fratricida, sanguinária, entre nós, quando a corrupção está na praça do lado de lá, de lá partiu a corrupção, do lado de lá", disse Roberto Jefferson, numa referência ao Palácio do Planalto.
"Tirei a roupa do rei, mostrei ao Brasil quem são esses fariseus, mostrei ao Brasil o que é o governo Lula, mostrei ao Brasil o que é o Campo Majoritário do PT", afirmou o deputado.
Sobre a figura do presidente, Jefferson disse: "O meu conceito do presidente Lula é que ele é malandro, ele é preguiçoso. O negócio dele é ó [fez um gesto de avião com a mão], passear de avião, governar que é bom ele não gosta. [...] Se não praticou o crime por ação, pelo menos por omissão", afirmou Jefferson, para quem o ex-ministro José Dirceu "tratou a Câmara" como "um prostíbulo".
Jefferson afirmou ainda haver "ministro" que recebeu o "mensalão". "E a turma que financiou isso, vai ficar de fora? Tem ministro que recebeu o "mensalão", crime administrativo claro. E tá tudo em silêncio, não vem depor na CPI, não são pesquisados, não são confrontados, e a culpa é só nossa, somos a Geni no Brasil", disse, fazendo alusão à personagem de uma canção de Chico Buarque.
Apesar disso, não apresentou novas denúncias sobre o suposto esquema, como era esperado, nem informou o destino dos R$ 4 milhões que admitiu ter recebido do PT, sem registro na Justiça Eleitoral, a título de financiamento de campanha.
A sessão de cassação, iniciada logo após as 16h, foi presidida pelo primeiro-vice-presidente da Casa, José Thomaz Nonô (PFL-AL), pois Severino Cavalcanti (PP-PE) passou o dia recluso.
Jefferson foi acusado no parecer do Conselho -feito pelo deputado Jairo Carneiro (PFL-BA)- de ter assumido tráfico de influências em estatais, ter admitido recebimento de dinheiro em caixa dois repassados pelo PT e de ter feito acusações sem provas.
Ele foi o primeiro parlamentar cassado na esteira do escândalo e ficará inelegível até 2015.
O petebista foi bastante aplaudido por parte das galerias da Câmara, que estavam lotadas, e por aliados no plenário, que diziam que ele seria absolvido após o discurso, que durou 41 minutos.
Em sua fala, o petebista usou claramente a estratégia de jogar os deputados contra o Palácio do Planalto e não poupou o PT, a quem chamou de "rato magro", que se "lambuzou" ao chegar ao poder. "Para mim esse é o governo mais corrupto que testemunhei nesses meus 23 anos de mandato, o governo do presidente Lula, o mais escandaloso processo de aluguel de parlamentar", disse. "Rato magro! Quem nunca comeu mel se lambuza, rato magro! PC Farias é aprendiz de feiticeiro diante dessa gente que assaltou o Brasil", disse, em referência ao tesoureiro do ex-presidente Fernando Collor (1990-1992).

 

LULA - Desde o início da crise política, Jefferson vinha procurando poupar Lula. Apesar de não acusar diretamente o presidente de envolvimento em esquema de corrupção, o petebista ontem não deixou de atacá-lo. "Disse ao próprio presidente: o Delúbio vai botar uma bomba debaixo dessa cadeira. Essa história do "mensalão" é um escândalo, nunca vi uma coisa igual na história parlamentar", afirmou. "A corrupção partiu de lá, as ligações do Marcos Valério são para o gabinete do senhor presidente, 111."
Segundo o petebista, Lula "é como o José Genoino [ex-presidente do PT], assinou empréstimo, houve acordo, mas não leu, não sabia. O presidente virou uma espécie de Genoino na Presidência, não sabe o que lê, não sabe o que assina, não sabe o que faz."

CONGRESSO X PLANALTO - A tática do deputado foi tentar angariar votos de última hora com a tese de que o Planalto, para se livrar da crise, promove uma "guerra fratricida" entre os parlamentares. "[Lula] escolheu o ministro José Dirceu como uma espécie de Jeany Mary Corner [cafetina de Brasília], o rufião do Planalto para alugar prostitutas. Tratou essa Casa como se fôssemos um prostíbulo", disse. "Fez aqui na Casa o conflito como se fôssemos um valhacouto de corruptos."

DEFESA E ATAQUE - O petebista acusou o relator Jairo Carneiro de ter feito um relatório "fascista" e de cometer irregularidades no governo da Bahia. Jairo nega. Afirmou que o que sofre hoje é perseguição política e diz que teve o seu nome usado indevidamente por Maurício Marinho, ex-chefe de departamento nos Correios. "Eu não posso evitar que alguém peça dinheiro em meu nome. O Rogério Buratti [ex-assessor do ministro Antonio Palocci, da Fazenda] fez isso com o ministro Palocci."

MENSALÃO - Apesar de dizer que o "mensalão" está provado, Jefferson afirmou que ele pode ser chamado de "bimestralão" ou "trimestralão". "Se o relator fica ofendido com a palavra mensalão (...), use o "bimensalão", o "trimestralão", o que ele quiser falar, mas essa transferência constante de recursos para alugar partidos da base aliada tinha de acabar."

PT - O deputado bateu duro no PT. "Nunca bati no peito para dizer que sou paladino da ética e campeão olímpico da moralidade. Todo fariseu e farsante emprega culpa ao adversário como se fosse um biombo para esconder os seus defeitos", disse. "O PT não rouba, não deixa roubar. Ouvi isso da cúpula do partido. Rouba, mas rouba sozinho, e muito!"

DESPEDIDA - "Entrego 23 anos de mandato. Confesso que estou um pouco cansado, mas honrei o Parlamento. Todos os dias investigam minha vida, não conseguiram colocar nada no jornal que pudesse ferir minha honra. Saio de cabeça erguida." Seus advogados disseram que vão recorrer ao STF para tentar reaver o mandato. (RANIER BRAGON, FÁBIO ZANINI, SILVIO NAVARRO E LUIZ FRANCISCO)

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