São Paulo, domingo, 15 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / CRISE DO DOSSIÊ

Acusados se contradizem sobre dossiê

Em depoimentos à PF, suspeitos de participar de compra de dossiê contra tucanos desmentem as afirmações uns dos outros

Se esclarecidas, dúvidas poderiam ajudar a elucidar a origem do R$ 1,7 milhão apreendido com Gedimar e Valdebran em São Paulo

RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

A leitura das 30 páginas de depoimentos prestados pelos protagonistas da tentativa frustrada de compra de um dossiê contra José Serra (PSDB), governador eleito de São Paulo, revela pelo menos quatro contradições, que, resolvidas, poderiam levar à origem do dinheiro usado na operação.
Uma divergência diz respeito a ligações telefônicas que o empresário Valdebran Padilha afirmou ter feito quando já estava em São Paulo, hospedado no hotel Íbis, para Jorge Lorenzetti, ex-chefe do "grupo de informações" da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva.
Valdebran disse ter falado com Lorenzetti na noite de 14 de setembro, uma quinta-feira, por meio do telefone celular do advogado Gedimar Passos, horas antes das prisões feitas pela Polícia Federal. Àquela altura, Passos já havia recebido R$ 1,7 milhão para comprar o dossiê.
A confirmação das chamadas poderia implicar Lorenzetti no ato do pagamento pelo dossiê. A quebra do sigilo do telefone de Lorenzetti, já pedida pelo Ministério Público Federal, poderia confirmar ou não as chamadas (Gedimar teria inutilizado o chip de seu celular).
"Em São Paulo, [Valdebran] manteve contatos pessoais com pessoas ligadas ao Partido dos Trabalhadores, somente com Gedimar e a pessoa que se apresentou como Expedito, e por telefone com uma pessoa que se apresentou com o nome de Jorge. (...) Falou com Jorge através do telefone de Gedimar, duas vezes, na quarta-feira à tarde [13/09] e na quinta-feira à noite [14/09]. Jorge se apresentou como sendo chefe de Gedimar", disse Valdebran Padilha, no depoimento prestado à PF de Cuiabá (MT).
Em seu depoimento, Lorenzetti negou as ligações. "As declarações de Valdebran prestadas quando de sua prisão, em 15/09/06 em São Paulo, dizendo que o declarante teria falado com ele por telefone, não se tratam de verdade", disse.
Os depoimentos também são contraditórios a respeito da identidade da pessoa, entre os petistas implicados no episódio, que teria recebido a incumbência de organizar e coordenar o recebimento o dossiê em São Paulo -por extensão, seria a pessoa responsável também pelo pagamento da papelada.
Este é o principal ponto cego das investigações. Os três integrantes da campanha de Lula envolvidos no episódio -Lorenzetti, Osvaldo Bargas, ex-assessor do Ministério do Trabalho, e Expedito Afonso Veloso, ex-diretor do Banco do Brasil- confirmam as negociações e a "análise" do material enviado pela família Vedoin, mas nenhum afirma ter tomado conhecimento de esquemas de pagamento em dinheiro.
Veloso, que também afirmou nada saber sobre dinheiro, disse em depoimento que, quando procurado por Valdebran, orientou-o a procurar Bargas, que estaria fazendo o papel de "coordenador" em São Paulo. Bargas apresentou uma versão diferente: "Não mantinha contato com Gedimar e não sabia o que ele fazia em São Paulo quando foi preso, muito menos qual a origem do dinheiro encontrado em seu poder".

Ordem
Um terceiro ponto contraditório se refere a quem deu a ordem a Gedimar para que pagasse R$ 1,7 milhão pelo dossiê.
Gedimar primeiro afirmou em depoimento à PF que teria sido uma pessoa de nome "Froude ou Freud", mais tarde identificada como sendo Freud Godoy, ex-assessor especial da Presidência da República. Dezoito dias depois, em manifestação enviada ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), disse que citou o nome de Godoy apenas para ser solto pela PF.
Em depoimento, Godoy negou ter relação com o pagamento e disse que o último contato com Gedimar foi ocasional, no dia 29 de agosto, por telefone. Godoy não consegue identificar um motivo pelo qual Gedimar teria decidido envolver seu nome no episódio.
Uma quarta discrepância entre os diversos depoimentos está ligada a uma suposta tentativa do empresário Abel Pereira, ligado ao ex-ministro da Saúde Barjas Negri, de comprar o dossiê para abafar o caso.
Lorenzetti afirma ter ouvido de Veloso e de Bargas que Pereira teria oferecido, pelo dossiê, R$ 10 milhões aos Vedoin.
O empresário Luiz Antonio Vedoin não confirmou a informação. Segundo ele, Pereira procurou-o em Cuiabá "provavelmente em vista da acusação que [Vedoin] havia feito na 2ª Vara da Justiça Federal, mas evitou falar com ele".


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