São Paulo, domingo, 15 de dezembro de 2002

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OUTRO LADO

Coteminas não vê ilegalidade

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Coteminas reconhece que recomprou em leilões da Conab lotes de algodão que já havia adquirido previamente, mediante contrato direto com fornecedores. Para a direção da empresa, o procedimento não fere a lei.
"A regulamentação da Conab e os editais de leilão não proíbem. Logo, é permitido", disse Josué Gomes da Silva, filho do vice-presidente eleito, José Alencar, e superintendente da Coteminas. Segundo ele, a operação de recompra nos leilões favoreceu a todas as partes envolvidas.
Eis o raciocínio: "Beneficiou o produtor, que recebeu R$ 1,91 [preço mínimo fixado pela Conab] pelo kg de algodão, contra R$ 1,80 previstos no contrato anterior. Beneficiou a Coteminas, que, graças à subvenção do governo, pagou R$ 1,75 e não R$ 1,80. E respeitou a filosofia do programa da Conab, que visa garantir um preço justo ao produtor".
As palavras esbarram nas revelações contidas em ação judicial movida contra a Coteminas por sua maior fornecedora de algodão, a família Vasconcelos Bonfim.
No texto da ação, os produtores sustentam que devolveram à Coteminas todo o dinheiro recebido por ocasião do leilão. "É mentira", refuta Josué. "Nossa contabilidade é transparente e está à disposição."
A Folha esperou duas semanas pela manifestação da Coteminas. A reportagem fez contato telefônico com o vice-presidente eleito, José Alencar. "Respondo pelos atos da minha empresa. Mas, como estou afastado da gestão, peço que conversem com o meu filho."
Num primeiro telefonema, Josué Silva negou que a Coteminas tivesse levado a leilão o algodão que comprara anteriormente. "Essa insinuação é absolutamente improcedente", disse.
A reportagem esclareceu que dispunha de cópias de depósitos em que os Bonfim devolviam à Coteminas importâncias recebidas. E Josué: "Não é incomum. Muitas vezes há um pedido para que você antecipe alguma parcela de um contrato, para que o fornecedor faça face a um compromisso de folha de pagamento, uma colheitadeira que ele comprou. E ele devolve o dinheiro alguns dias depois."
A reportagem enviou a Josué, por fax, uma relação de depósitos. E pediu-lhe que informasse a que se referiam. Dias depois, Josué enviou à Sucursal da Folha em Brasília oito volumes. Contém o histórico dos contratos entre a Coteminas e os Bonfim. Referem-se a transações da safra 1999/2000. Nenhuma referência aos cheques.
Na última terça-feira, Josué voou de São Paulo para Brasília. Em visita à Sucursal da Folha, deu a versão final da empresa. Houve, reconheceu, a recompra. Nada, porém, que afrontasse a legislação.
Josué estava munido de nota técnica que encomendou depois de ter sido procurado pela reportagem. Redigiu-a, em 9 de dezembro, o conceituado advogado Carlos Ari Sundfeld, de São Paulo. Em resposta a questões levantadas pela empresa, Sundfeld sustenta:
1) a regulamentação do prêmio concedido pelo governo nos leilões da Conab não impôs "nenhuma limitação que atingisse produto objeto de negociações anteriores..."
2) "no momento da divulgação do aviso específico do leilão, os contratos [da Coteminas com o seu fornecedor] ainda não haviam sido plenamente executados, faltando ainda a necessária entrega do produto à empresa compradora. Diante da divulgação do plano de incentivo governamental, as partes envolvidas, de comum acordo, desconstituíram o pacto inicial e celebraram novos contratos, nos termos exigidos na regulamentação para obtenção do incentivo."
A Folha ouviu dois funcionários da Conab, um deles ocupante de cargo de direção. Disseram que a recompra de produtos afronta a filosofia que norteou a criação do PEP (Prêmio para o Escoamento de Produto). O objetivo da subvenção é escoar, a preços justos, produtos ainda não comercializados. "Se é assim, é preciso alterar os regulamentos", diz Josué Silva. (JS)


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