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NO PLANALTO
Conheça a última esperteza da Justiça do Trabalho
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
E m Brasília nada é tão definitivo que não comporte
uma segunda interpretação. Alguém que tenha a ventura de cruzar com uma medida de aparência moralizadora deve acautelar-se.
Não convém soltar fogos de cara. Melhor abrir os olhos, levar a
mão ao bolso, segurar firme a carteira e esperar. Cedo ou tarde,
uma esperteza interceptará a tal
medida, deformando-a. Uma esperteza como a que se relatará
abaixo.
Lembra dos juízes classistas?
Sim, os classistas. Aqueles que, em
contatos íntimo-institucionais
com Eduardo Jorge, o juiz Lalau
ajudava FHC a selecionar. Pois é,
o Congresso aprovou, não faz sete
meses, a sentença de morte dessa
gente, eis a boa medida.
Nomeados para períodos de três
anos, os classistas terão a cabeça
apartada do pescoço ao final dos
atuais mandatos. Pôs-se fim a
uma sinecura que premiava, desde 1946, apaniguados de sindicatos patronais e de empregados. Ficou estabelecido que os cargos deveriam ser extintos assim que vagassem. Deveriam...
Mas, como se sabe, é mais fácil
um boi voar e FHC topar uma
CPI contra os seus do que a administração pública ceifar um cargo. Assim, conservando a tradição, o TST saiu-se com uma idéia
astuta.
Sapateando sobre a autoridade
(?) do Congresso, o tribunal autorizou os TRTs, braços da Justiça
Trabalhista nos Estados, a acomodar juízes togados nos assentos dos classistas, eis a esperteza
deformadora.
No trenzinho do TST cabem 148
togas, ao custo mensal de R$ 8.910
cada. Arrancou-se da boca da
viúva a perspectiva de poupar
anualmente algo como R$ 171 milhões, novesfora o custo dos gabinetes dos juízes.
É preciso levar em conta que um
juiz não é andorinha que faça verão sozinha. Nos TRTs, cada gabinete acomoda pelo menos dez
assessores. Há casos em que o time passa de 15. Numa estimativa
modesta, incluindo parentes e
aderentes, está-se falando de uma
legião superior a 1.500 pessoas.
A providência moralizadora,
como se sabe, grita alto e saltita
diante das lentes das câmeras. O
cadafalso dos juízes classistas foi
montado em praça pública. A
condenação à guilhotina foi festejada por governistas e oposicionistas.
A esperteza, ao contrário, é muda e discreta. A boquinha dos juízes togados entrou pelo porão e
subiu escadas secretas do TST.
Aprovada no final de junho, conservou-se invisível.
A coisa está sendo feita no apagar das luzes da presidência de
Wagner Pimenta, que se encerra
no final deste mês. Uma fase marcada pela inconstância da opinião dos ministros do TST.
Em dezembro de 99, logo depois
da decisão do Congresso, o tribunal baixou resolução (número
665) em que anotava: "É vedado
o provimento das vagas decorrentes da extinção da representação
classista pela convocação ou promoção de juízes do primeiro grau
para os Tribunais Regionais".
Em 29 de junho passado, a mesma resolução ganhou número
(708) e redação diferentes. O texto
ficou assim: "Os cargos vagos em
decorrência da extinção da representação classista nos Tribunais
Regionais do Trabalho serão
preenchidos nos termos da Constituição da República".
Segundo Wagner Pimenta, os
ministros pensaram melhor. E
concluíram que o Congresso extinguiu o mandato dos classistas,
não os cargos. O senador Jefferson
Peres, que relatou o projeto, discorda. Ele lembra que, debatida
no Congresso, a idéia de trocar
classistas por togados foi repelida.
Mas, sob Wagner Pimenta, o
TST parece mesmo decidido a
melhorar as estatísticas de desemprego. Além da astúcia que beneficiou juízes togados, o tribunal
remeteu ao Congresso projeto de
criação de 269 novas varas de
conciliação. Argumenta-se que o
Judiciário Trabalhista está sobrecarregado.
O governo ainda não teve tempo de estimar os custos da brincadeira. Mas, a julgar pelos comunicados que escorregam dos escaninhos oficiais nos últimos dias,
ninguém há de criar problemas.
Se, por hipótese, os ministros do
TST enviassem ao governo ofício
pedindo verbas para contratar
um grupo de mulatas para animar as sessões do tribunal, o dinheiro decerto seria liberado.
"Não nos cabe interferir", diria a
Fazenda. "O Judiciário é autônomo", ecoaria o Planalto. "É
usual", arremataria o Planejamento.
Em telefonemas disparados nos
bastidores, o ministro Aloysio
Nunes Ferreira, substituto de
Eduardo Jorge no Planalto, já encomenda ao TST a instalação de
uma junta trabalhista num minúsculo município paulista.
As nomeações dos novos juízes
togados e a sanção do projeto que
cria as novas repartições dependem de FHC. Recomenda-se ao
presidente que abra bem os olhos
e leia os papéis antes de apor a assinatura sobre eles. Já está em
Brasília o primeiro pedido de nomeação de juiz que pousará sobre
sua mesa. Veio do Rio Grande do
Norte.
Mudança: antes, FHC pedia que
esquecêssemos o que havia escrito. Agora, pede-nos para desconsiderar o que assinou. Nesse ritmo, acaba repetindo Figueiredo,
que pediu ao povo que o esquecesse.
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