São Paulo, Sexta-feira, 16 de Julho de 1999
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ANÁLISE
Reforma resume-se a punir amigos

CLÓVIS ROSSI
do Conselho Editorial

A reforma ministerial tão anunciada, e adiada para hoje, resumia-se ontem a um grande espetáculo de informações desencontradas on line e ao afastamento de amigos pessoais do presidente Fernando Henrique Cardoso, punidos exatamente por serem amigos e, portanto, passíveis de demissão sem reclamações fortes.
É o caso de Celso Lafer, ao que parece ex-ministro do Desenvolvimento, e, ao que tudo indica, de Luiz Carlos Bresser Pereira (Ciência e Tecnologia).
Além de amigos, os dois têm uma segunda característica em comum: baixo teor de respaldo interno em seu próprio partido, o PSDB, o que reforça a comodidade em dispensá-los.
Se o objetivo da reforma era o de mostrar autoridade e passar a imagem de que o presidente já não pretenderia submeter-se à ditadura dos partidos que formam sua base de sustentação parlamentar, o fracasso será total, se limitada ao que se sabia ontem.
Fracasso que começou no episódio de "nomeação" pela TV e on line do advogado Manuel Alceu Affonso Ferreira para o Ministério da Justiça, apenas para o governo submeter-se ao constrangimento de ver o convite ser recusado, igualmente on line.
Com isso, ficou vago o Ministério da Justiça, já que seu ocupante, Renan Calheiros, despediu-se do posto, ainda por cima afirmando que jamais teve "apego a cargos".
Mas os amigos do presidente não perderam tudo. Além de José Serra e Paulo Renato Souza permanecerem onde estavam, Clóvis Carvalho passaria da Casa Civil para o Desenvolvimento. Posto de outra forma: o presidente trocou um intelectual amigo por um burocrata amigo, sem que o intelectual tivesse tido tempo para transformar o nome de sua pasta (Desenvolvimento) no mote principal do segundo mandato, ao contrário do que esperavam políticos do PSDB e muitos empresários.
É pouco razoável imaginar que onde fracassou (por falta de tempo ou de vocação) o intelectual, vá dar certo o burocrata, até porque Clóvis Carvalho, em seus quatro anos na Casa Civil, tornara-se virtual unanimidade: a maioria dos integrantes do governo mais aliados como Tasso Jereissati, governador do Ceará, não poupam críticas a Carvalho.
Com as presumíveis nomeações para a Agricultura (de Marcus Vinícius Pratini de Moraes) e para Ciência e Tecnologia (de Luiz Bittencourt ou Euler Morais), FHC exuma nomes de dois esquemas políticos colocados sob suspeição.
Pratini foi ministro de Minas e Energia no governo Collor, depois de ter servido ao regime militar. Euler e Bittencourt pertencem ao grupo político do senador Íris Resende (PMDB-GO), acusado de uso irregular de fundos durante a campanha eleitoral do ano passado.
Na véspera da reforma, o ministro Pimenta da Veiga (mantido nas Comunicações e, aparentemente, na coordenação política) dizia que "o presidente está montando o quebra-cabeça (do ministério) com liberdade de ação". Ou seja, não estaria sendo submetido à pressão dos partidos.
Pode ser, mas o resultado dificilmente será lido dessa forma. Primeiro, porque as mudanças até aqui conhecidas são tão pouco significativas que PSDB e PFL nada perderam, e, segundo, porque o PMDB, que perdeu a Justiça, ganharia Ciência e Tecnologia e o recriado Ministério do Interior, talvez para Fernando Bezerra.
Igualmente na véspera da mudança, o governador Mário Covas (SP), uma das principais lideranças tucanas, dizia que a reforma deveria ter como eixo a indicação do que o governo pretende com a reforma. A resposta não veio nem remotamente, pelo menos ontem.


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