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ELIO GASPARI
Quantos seqüestros compram este espaço?
As empresas jornalísticas
devem responder à
bandidagem com um
regime de tolerância zero
HOJE O GOVERNO dos Estados
Unidos não negocia com
bandidos. Ponto. Em 1969,
quando uma dúzia de jovens brasileiros seqüestraram o embaixador
americano Charles Burke Elbrick, o
presidente Richard Nixon estava
noutra. Solicitou ao governo brasileiro que tomasse "todas as medidas,
repito, todas as medidas" para salvar
a vida do diplomata. A ditadura permitiu a transmissão de um manifesto e libertou 15 presos políticos. Entre a posição de 1969 e a de hoje passou-se não só o tempo, mas acumulou-se experiência.
Diante do seqüestro do repórter
Guilherme Portanova e do técnico
Alexandre Calado pela bandidagem
paulista, sem a pressão do acontecimento inesperado, as empresas de
comunicação brasileiras estão diante de um problema institucional.
Com calma, trata-se de responder à
seguinte pergunta: ocorrendo o seqüestro de jornalista deve-se dar voz
aos bandidos?
No limite, uma quadrilha poderia
seqüestrar o signatário numa terça-feira para obter a publicação de um
manifesto neste espaço, na quarta?
Exagerando: quantos jornalistas em
cativeiro seriam necessários para
garantir a uma quadrilha o espaço
de uma coluna diária?
A melhor resposta é o regime de
tolerância zero. A bandidagem saberá, antecipadamente, que as empresas, seguindo uma norma geral, não
transformarão seu espaço em numerário de resgate. Uma política de
concessões pode custar mais caro
em vidas, pois não há como especular onde fica o limite da exigência
dos bandidos.
No caso de seqüestro de diplomatas e aviões, as negociações dos anos
70 tornaram-se um estímulo, enquanto a tolerância zero dos 80
mostrou-se solução eficaz. Há precedentes que contrariam alguns aspectos dessa argumentação. Em
1995, o "New York Times" e o "Washington Post", aconselhados pelo
FBI, cederam a uma ameaça e publicaram um imenso e delirante manifesto do terrorista Unabomber. Não
havia uma ameaça direta e se buscava também ampliar a investigação. A
iniciativa influiu para a captura do
bandido, um ano depois.
Num regime de tolerância zero,
perdem os jornalistas, pois correm o
risco de serem mortos por conta de
uma extorsão contra as empresas
onde trabalham. Algo como seqüestrar o padeiro para extorquir uma
distribuição de bisnagas ao dono da
padaria.
Havendo esse novo risco, as empresas de comunicação deveriam
anunciar que assinarão contratos de
seguro de vida para todos os empregados, do porteiro ao diretor. Cada
funcionário teria uma cobertura relacionada com o tamanho do perigo
a que é exposto pela empresa.
Os grandes jornais americanos
mandam repórteres para áreas de
risco com seguro proporcional ao tamanho da encrenca. Se uma especialização profissional traz mais perigos que outra, a cobertura desse
risco deve ser contratada entre os
jornalistas e as empresas para as
quais trabalham. Fica entendido
que acompanhar regularmente o
trabalho de repressão ao tráfico e ao
crime organizado não é um serviço
semelhante ao da cobertura da chegada do papa a Aparecida. Pode-se
concluir que a profissão de jornalista ficou mais perigosa. Verdade. Melhor lidar com essa situação do que
fingir que ela não aconteceu.
Os jornalistas pareciam blindados
diante da crise da segurança pública.
O seqüestro de Portanova e Calado
mostrou que a bandidagem cortou
mais uma fatia do salame. Isso aumenta o tamanho do problema mas
também ajuda na busca da solução.
Quanto mais gente se der conta de
que ou há segurança para todos ou
não há para ninguém, melhor.
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