São Paulo, Terça-feira, 16 de Novembro de 1999
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Investigação no Estado foi ampliada há dois meses

do enviado especial

A mudança no comando do Ministério Público Estadual ocorrida há dois meses está promovendo mudanças na apuração dos crimes de morte tidos como insolúveis no Acre, muitos deles atribuídos ao esquadrão da morte supostamente liderado pelo ex-deputado Hildebrando Pascoal. Pelo menos 35 casos ocorridos nos últimos quatro anos estão sendo agora reabertos e investigados.
Até setembro, o órgão era comandado pela procuradora Vanda Denir Milani Nogueira, cunhada de Hildebrando (casada há 25 anos com seu irmão Silas Pascoal). Vanda comandou o Ministério Público por dois anos até perder as eleições. Por duas ocasiões nos últimos 15 anos, ela foi subprocuradora-geral do Estado, segundo cargo na hierarquia.
O atual procurador-geral, Edmar Azevedo Monteiro Filho, 47, eleito em setembro, está concluindo uma denúncia que irá apresentar contra sua antecessora em aproximadamente 20 dias no Tribunal de Justiça do Estado.
Monteiro Filho tem em mãos dois interrogatórios que afirmam que Vanda, uma semana antes de a CPI do Narcotráfico estar em Rio Branco, no começo de setembro, tentou convencer uma testemunha (que poderia depor) a mentir aos deputados federais e também a acusá-los de tentar lhe oferecer dinheiro para que ele incriminasse Hildebrando.
A Folha obteve um desses interrogatórios prestados ao delegado Jones Leite, da Polícia Federal, responsável no Acre pela apuração do crime organizado, obtido de Belino Barroso Carvalho, o "Caniço", diante de três procuradores, no dia 1º de novembro.
Nele, "Caniço" acusa a procuradora, o marido dela, o ex-deputado e o seu braço direito, Alex Fernandes Barros, de intimidá-lo para que acusasse três deputados de tentativa de suborno.
"Caniço" disse ainda que Vanda esteve na casa de Hildebrando, onde foi feito esse acerto, e que ela disse a ele que poderia fazer a acusação contra a CPI "pois ele não iria se arrepender nem ser preso".
Segundo "Caniço", Hildebrando queria levá-lo a Brasília para depor a seu favor no caso da cassação, mas desistiu ao descobrir que ele era acusado de homicídio. Com medo, "Caniço" disse ao delegado e aos procuradores que no dia prometeu à família Pascoal fazer sua parte no trato, mas, em vez disso, passou a se esconder.
"Nós abrimos um procedimento e estamos apurando o envolvimento dela nesse caso. É muito grave tentar tumultuar os trabalhos de uma CPI e criar fatos para acusar deputados", disse Monteiro Filho. Ele espera ainda ouvir outras duas testemunhas.
Procurada na sexta-feira à tarde, Vanda confirmou o encontro com "Caniço", mas disse que "seria louca se tivesse conversado nesses termos com um bandido", que ela diz nunca ter visto antes.
Vanda disse que esteve na casa do ex-deputado para tratar de um problema que envolvia o então advogado de Hildebrando, Eri Varela, e que chegou a conversar com "Caniço", mas não tratou do possível depoimento dele à CPI.
"Não posso acreditar numa coisa dessas. Vem um bandido, que todo mundo sabe que é de uma família que mexe com drogas, e inventa essa história. É a palavra dele contra a de uma procuradora de Justiça que tem 25 anos de serviços prestados, que tem uma conduta ilibada. Nunca ninguém teve nada para falar de mim."
Paralelamente, o procurador-geral criou um grupo especial de trabalho formado por 12 promotores para investigar vários casos que ele diz ter encontrado "literalmente engavetados".
Pelo menos um auto de investigação, que, segundo ele, estava "jogado num armário", envolvia o ex-deputado Hildebrando e um primo (Aureliano Pascoal) num caso de sequestro e cárcere privado de uma mulher. O caso não teve o prosseguimento necessário que deveria ter sido dado, numa espécie de "esquecimento".
"Estamos agora pagando uma dívida histórica com a sociedade acreana, de pelo menos três anos de omissão e de silêncio", afirmou à Folha a promotora Patrícia Rego, 30, uma das mais combativas do grupo especial, que apresentou à Justiça três denúncias dos crimes tidos como insolúveis, envolvendo 11 pessoas, das quais apenas uma -por ter imunidade parlamentar- não foi presa.
Vanda também rebateu essas acusações. "Tenho um nome a zelar." Disse ainda que não fazia acusações, mas que a responsabilidade dos 35 inquéritos parados não era dela, mas dos promotores "que tinham a obrigação de apurar", citando Patrícia entre eles.
Patrícia, que foi ameaçada de morte pelo esquadrão há dois anos quando tentava dar curso às investigações do sequestro, afirmou à Folha que na época faltou "apoio institucional" do Ministério Público Estadual, como garantias de segurança à vida dela.


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