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CELSO PINTO
As novas tarefas da Camex
O Brasil "não tem mais do
que 20 meses para trazer as
taxas de juros para níveis decentes". São apenas dois anos
para completar a transição em
direção a um crescimento sustentável.
É a partir dessa constatação
que José Roberto Mendonça de
Barros, secretário de Política
Econômica da Fazenda, define
o papel que exercerá a partir de
abril, como secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex). Ele vai ajudar
a formular e coordenar as políticas que poderão viabilizar a
transição.
Para os juros caírem e a economia decolar, diz ele, é precisar completar o ajuste fiscal,
viabilizar o acerto externo pelo
crescimento das exportações e
avançar na reestruturação produtiva. A Camex só não se envolverá mais fundo na área fiscal.
Em compensação, pretende
avançar muito na reestruturação produtiva. "No fundo,
transformando alguns conceitos que amadureceram em
idéias operacionais claras", define. Conceitos, por exemplo,
como o da necessidade de formular políticas para cadeias
produtivas, não apenas para
setores isolados. Ou o conceito
de que não dá para obter resultados no comércio exterior, ou
na política industrial, repetindo fórmulas que somam subsídios com proteção.
O problema, admite, é que o
governo sabe mais claramente
o que não deve fazer, em termos de política industrial, do
que o que deve fazer. É preciso
"eliminar a desvantagem competitiva do setor produtivo nacional".
O que passa por pelo menos
seis pontos: 1) redução de impostos; 2) redução dos juros e
reestruturação do mercado de
capitais (dando acesso, por
exemplo, a pequenas e médias
empresas); 3) redução do custo
Brasil; 4) defesa da concorrência; 5) políticas horizontais
(por exemplo, de ciência e tecnologia) e 6) treinamento e
educação.
Esta, obviamente, é uma
agenda para todo o governo. A
Camex reúne, mensalmente,
todos os ministérios potencialmente envolvidos na tarefa. O
ministro Clóvis Carvalho funciona como coordenador das
políticas da câmara. A entrada
de José Roberto, abaixo dele,
deve fazer com que a Camex
suba um degrau e avance mais
na formulação de políticas.
Pode ficar parecendo com o
antigo projeto de criar um Ministério de Comércio Exterior,
sem formalizá-lo. José Roberto
garante, contudo, que jamais
foi examinada a hipótese de
transformar a Camex, no futuro, num ministério deste tipo.
Ela pode acabar sendo, apenas,
um arranjo operacional temporário. Certamente vai haver
problemas de disputa de poder
e de idéias.
Um efeito prático será o de
que o governo deverá discutir,
formular e assumir de forma
muito mais desenvolta uma
política industrial (que foi
anátema durante algum tempo) e produtiva de forma geral.
José Roberto diz que a noção
de que o país não vai andar
apenas pelo "laissez-faire" é
uma idéia vencedora no governo.
Como o país não tem muito
mais tempo para viver pendurado em juros altos, essa nova
ênfase no setor produtivo pode
ter outro efeito prático, que ele
não comenta. Se a oposição insistiu tanto em caracterizar o
primeiro mandato de FHC como o "governo dos banqueiros", o esforço será tentar vender a idéia de que o segundo
mandato será mais dedicado
ao mundo da produção real.
Prêmio Nobel
Em 91, o Prêmio Nobel de
economia (de 90) William
Sharpe, encontrou-se com o
Prêmio Nobel de economia (de
70) Paul Samuelson. "Você está vendendo suas ações?", perguntou, de chofre, Samuelson.
"Não, e você?", devolveu Sharpe. A resposta de Samuelson:
"Também não, mas não estou
conseguindo dormir bem à
noite".
Sharpe contou ontem esta
história, num almoço com
quatro jornalistas, no Rio, para ilustrar as dificuldades de
previsão nos mercados e justificar porque evita fazê-las.
Sharpe ganhou seu Nobel pela
fórmula que desenvolveu para
avaliação de performance de
fundos de investimento e de
ações. O Banco Marka e a Nikko Securities, que estão completando uma associação numa empresa de gestão de recursos no Brasil, trouxeram
Sharpe ao país.
Coerente, Sharpe não arrisca
dizer se a crise asiática acabou,
muito menos se o mercado
acionário americano vai sofrer
novas correções. Consultor de
cinco fundos de pensão, que
administram US$ 200 bilhões,
o que Sharpe afirma é que a
política de investimentos destas instituições na Ásia e nos
países emergentes não mudou
muito. Nem deve mudar muito.
Lições que ficam, para países
como o Brasil, são em favor da
transparência, da qualidade
dos ativos bancários e de não
ter um sistema onde pareça
que os bancos serão sempre,
em última instância, salvos pelo governo. A crise deixa como
herança, também, uma rediscussão, que ele acha oportuna,
dos modelos de análise de risco
do sistema financeiro.
A idéia que manter capital
mínimo para cada tipo de ativo é suficiente para domar o
risco, como prevêem as regras
da Basiléia (seguidas em todo
o mundo, inclusive no Brasil),
já não basta. Aceitar sistemas
mais sofisticados, criados pelos
próprios bancos, é um bom caminho a ser aperfeiçoado.
Vale, também, o bom senso.
"A primeira coisa que deve
preocupar é quando uma área,
numa instituição financeira,
está ganhando muito dinheiro", diz. "É sinal de que está
assumindo muito risco".
Tentar saber o que Sharpe
pensa, de fato, sobre o futuro,
olhando onde está investindo
seu dinheiro, também não funciona. Perguntado se depois da
crise asiática havia colocado
mais ou menos dinheiro em
ações ou renda fixa, ele ri e
desconversa: "Nenhum dos
dois: comprei um barco".
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