São Paulo, quinta-feira, 17 de outubro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FOLCLORE POLÍTICO

Pitas e pitos

RONALDO COSTA COUTO

Apesar de médico de formação refinada, com quatro anos de pós-graduação na Universidade Popular de Berlim, Alemanha, o gentil governador paulista Adhemar de Barros estava sempre na mira dos adversários por distrações com a língua pátria. Coisas e maldades da política.
Até hoje falam em Minas do inesquecível discurso de campanha que ele teria feito num município conhecido pela fartura de piteiras ou pitas, árvores lindas, verdíssimas, muito decorativas.
Praça cheia, palanque superlotado, microfone testado. O locutor despeja elogios no presidenciável e passa-lhe a palavra.
Mar de aplausos, gritos fortes de viva e já ganhou.
Adhemar, empolgado: "Nesta região, onde abunda a pita...". Percebe a calamidade fonética e recomeça: "Nesta região, onde a pita abunda...".

Por cima
A eleição presidencial de 1955 pega fogo em Limoeiro, Pernambuco. Quase sai guerra entre as forças dos candidatos Juarez Távora, Adhemar de Barros, Plínio Salgado e Juscelino Kubitschek.
O legendário coronel Chico Heráclito fecha com JK. Entra pesado na briga, radicaliza, passa pitos, ganha, esfrega a vitória na cara dos adversários.
Já eleito, Juscelino se encontra com ele no aeroporto de Recife. O escritor Marcos Vilaça, da Academia Brasileira de Letras, então adolescente, estava lá todo enfatiotado, de paletó novo e camisa de linho branca.
Ele não se esquece da alegria e das palavras dos dois ao se abraçar. JK: "Coronel, agora que eu sou presidente, o que o senhor quer de mim?". "Nada, doutor Juscelino. Eu só quero ver o senhor cuspindo de cima."

Visão brasileira
João Guimarães Rosa (1908-67), em Tutaméia: "Comprei uns óculos novos, / óculos dos mais excelentes: / não têm aros, não têm asas, / não têm grau e não têm lentes".

Momento nacional
Conde Francesco Matarazzo (1854-1937), imigrante italiano, símbolo de sucesso e riqueza, que começou no comércio de Sorocaba em 1882, aos 27 anos, e construiu o maior, mais complexo e rico império empresarial da história republicana: "Não se pode brigar com os banqueiros, mas não se deve abusar do crédito".


RONALDO COSTA COUTO, 59, escritor, doutor em história pela Sorbonne, escreve às quintas-feiras nesta coluna



Texto Anterior: No Ar - Nelson de Sá: Do "medo" ao "golpe"
Próximo Texto: Segundo Turno: Lula quer debater Alca com 'companheiro Bush'
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.