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Possível investigação do relacionamento de juiz preso com grupo de Toninho da Barcelona preocupava acusados
Esquema temia por vinculação a doleiro
DA REPORTAGEM LOCAL
Conversas telefônicas interceptadas pela Operação Anaconda
indicam que o grupo hoje preso
na Polícia Federal sob acusação
de participar de um esquema de
venda de sentenças judiciais temia as repercussões da revelação
de vínculos entre o doleiro Antônio Oliveira Claramunt, o Toninho da Barcelona, e o juiz federal
da 7ª Vara Criminal, João Carlos
da Rocha Mattos.
"É ruim porque vincula ele [Rocha Mattos], inclusive ao pessoal
que está preso", disse, em conversa grampeada, o agente federal
César Herman Rodriguez -braço direito do juiz Rocha Mattos-
ao delegado federal José Augusto
Bellini em 24 de março último.
O "pessoal preso" citado por
Rodriguez eram, segundo a polícia, os funcionários da casa de
câmbio de Claramunt em São
Paulo, a Barcelona Tour, que foi
alvo de uma investigação do Ministério Público Federal.
Em 17 de março, a operação
contra a Barcelona resultou na
prisão de cinco pessoas, além de
captar conversas telefônicas de
quatro delegados e quatro agentes
federais com o doleiro. Claramunt conseguiu escapar, e obteve
no mês passado habeas corpus no
Supremo Tribunal Federal.
Sete dias depois dessas prisões,
a Folha revelou que o apartamento ocupado pelo juiz Rocha Mattos pertencia a uma empresa
"offshore" cujo procurador era
Carlos Alberto da Costa Silva, advogado de Claramunt em processos na Justiça Federal. Na reportagem, ele aparece citado apenas
como "advogado de doleiros".
Na conversa, Rodriguez disse
ter achado a vinculação "ruim".
Bellini disse que, na sua opinião, a
revelação não ia "dar em porra
nenhuma", porque seria vista como uma "briga de velhos" -entre Rocha Mattos e a sua ex-mulher Norma Regina Emílio Cunha. Rodriguez não concorda
com isso: "Não vai, é? Deixa descobrir as outras coisas aí, estão no
caminho certo".
Claramunt é investigado pelo
Ministério Público Federal como
um dos principais doleiros de São
Paulo e foi indiciado pela CPI do
Narcotráfico, em 99, sob acusação
de lavagem de dinheiro.
De acordo com o relatório final
da CPI, a Barcelona Tour enviou
para o exterior, entre 1995 e 1999,
US$ 1,34 milhão, mas recebeu
US$ 29,7 milhões. "Os rendimentos declarados no período são incompatíveis com essa movimentação financeira", concluiu a CPI.
A conversa entre Rodriguez e
Bellini não é a única a tratar do
doleiro. Ele é referido pelo menos
quatro outras vezes.
De acordo com o relatório da
Coordenação de Inteligência da
Polícia Federal, que deu base à denúncia do Ministério Público Federal, em 3 de setembro de 2002,
Rodriguez telefonou para Norma
Cunha para pedir que ela ligasse
para Toninho da Barcelona e
marcasse um encontro com ele
até as 12h30 daquele dia.
Norma pede então para Rodriguez ligar para um número de telefone, porque Toninho "acabou
de entrar na Maranhão [rua onde
mora o juiz Rocha Mattos]".
Meses mais tarde, depois das
prisões dos funcionários da Barcelona Tour, a Operação Anaconda voltou a registrar uma conversa entre Norma e Rodriguez. Ela
informou ao policial federal que
naquele dia começariam os depoimentos do Toninho e pede
que Rodriguez vá assisti-los. Ela
achou que "pode ter muita coisa
interessante", segundo o relatório
de inteligência da PF.
Quatro dias depois, Norma telefonou para o agente federal para
saber como foram os interrogatórios, como está "o negócio" do
Toninho e "o que está rolando".
Ficou preocupada ao saber que
Rodriguez, ao contrário do que
ela pedira, não foi acompanhar os
depoimentos. A ex-mulher do
juiz Rocha Mattos indagou: "E o
pessoal da polícia está preocupado com que, se não com isso?".
As investigações sobre o "caso
Barcelona" resultaram na abertura de procedimentos no Ministério Público Federal para averiguar
participação de policiais civis e federais. Também foram enviadas
às corregedorias das polícias Civil
e Federal cópias das conversas interceptadas, para que fossem feitas apurações internas.
Os nomes desses policiais são
mantidos em sigilo pelo procurador que cuida da investigação sobre a Barcelona, Sílvio Luís Martins de Oliveira.
De acordo com a denúncia feita
pelas procuradoras da República
Ana Lúcia Amaral e Janice Ascari,
"a toda evidência, o interesse de
Norma pelo rumoroso caso de
Toninho da Barcelona não é casual", "restando induvidoso que é
assunto afeto ao interesse do grupo criminoso".
"Constata-se que as ações da
quadrilha envolvem, também,
outros ramos do crime organizado como lavagem de ativos e crimes contra o sistema financeiro
nacional", diz a denúncia das procuradoras.
(LILIAN CHRISTOFOLETTI, RUBENS VALENTE e FREDERICO VASCONCELOS)
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