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DANÇA DOS MINISTROS
Dirceu conduz negociações, mas já foi desautorizado 3 vezes
Lula ouve muito, mas reluta em tomar decisões rápidas
KENNEDY ALENCAR
RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Numa novela que se arrasta há
mais de um ano, a entrada do
PMDB no primeiro escalão do governo revela o estilo centralizador
de tomada de decisões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ele ouve muito. Sobretudo o chamado "núcleo duro" do PT. Mas
reluta em tomar decisões rápidas.
Por isso a operação fisiológica
de ampliação da base congressual
do governo se dá a conta-gotas. O
chefe da Casa Civil, José Dirceu, é
uma das principais vítimas do estilo presidencial: ele já foi desautorizado algumas vezes nas negociações com os aliados em geral e
com o PMDB em particular.
Em dezembro de 2002, Dirceu
acertou com a antiga cúpula do
PMDB, que apoiara o tucano José
Serra na eleição daquele ano, a entrega de duas pastas ao partido:
Integração Nacional e Minas e
Energia. Lula recuou na última
hora. Dirceu teve de engolir.
Na época, o senador José Sarney
(AP), que negociava o apoio do
novo governo à sua eleição para
presidente do Congresso, minou
o acerto de Dirceu, argumentando que a cúpula do partido perderia poder ao longo de 2003. Foi o
que aconteceu. Hoje, Sarney é o
principal interlocutor do PMDB
com o governo. Depois, vêm os líderes do partido na Câmara, Eunício Oliveira (CE), virtual ministro das Comunicações, e no Senado, Renan Calheiros (AL). O presidente do PMDB, Michel Temer,
ligado à antiga cúpula, participa
dos entendimentos, mas a costura
é capitaneada por Sarney.
O principal motivo do recuo de
Lula foi o temor de ficar prisioneiro de uma chantagem peemedebista para aprovar projetos de interesse do governo no Congresso.
Lula avaliou que, uma vez entregue os ministérios, teria de fazer
negociações de varejo político
(cargos e emendas) a cada votação importante no Congresso.
Optou por começar a atender o
partido no varejo, premiando os
aliados mais fiéis, e jogar duro para dar os ministérios, levando a
maioria da sigla a apoiá-lo em troca da expectativa de poder.
Federação de caciques regionais, o PMDB é um partido nada
ideológico e muito fisiológico. Dificilmente sobrevive fora do poder. Lula soube tirar proveito disso, dizendo que só daria os ministérios depois de aprovar as reformas tributária e da Previdência
-objetivos que ele alcançou.
Em maio, veio a segunda grande
desautorização de entendimentos
patrocinados por Dirceu. Diante
das dificuldades no início da tramitação das reformas, o chefe da
Casa Civil insistiu com Lula para
nomear logo os ministros do
PMDB. Alegou que não queria
depender dos governadores.
Lula julgou a opinião de Dirceu
uma armadilha e o proibiu de
avançar na negociação com o partido. Preferiu fazer reuniões com
governadores e conversar com os
oposicionistas PSDB e PFL para
obter força, intimidando eventual
rebeldia peemedebista. "O PMDB
não fará comigo o que fez com
Fernando Henrique Cardoso", dizia Lula, citando episódios como
o da imposição de ministros peemedebistas para evitar uma CPI
da compra de votos para aprovar
a emenda da reeleição, em 1997.
A terceira grave desautorização
a Dirceu veio em novembro,
quando Lula voltou da viagem à
África. O presidente chegou e encontrou um cenário armado por
Dirceu para fechar rapidamente
as negociações com o PMDB.
Ainda faltava aprovar as reformas no Senado, mas as dificuldades de então assustaram o ministro, que achou que precisaria do
PMDB. Lula discordou novamente e ficou contrariado com conversas de Dirceu nas quais ele
prometeu aos aliados realizar a
reforma até 15 de dezembro.
Na época, Dirceu agravou o descontentamento de Lula ao dar
uma declaração defendendo a integração militar da América do
Sul. Numa reunião no Planalto,
Lula o repreendeu, dizendo que
aquilo era assunto de presidente.
Foi a hora em que Dirceu disse
que não falaria mais com a imprensa. Lula ficou dias tratando
friamente o ministro, que chegou
a ter crise de hipertensão e fez exames cardiológicos no Incor (SP).
Desde então, ele evita melindrar
Lula. Nas conversas com os partidos aliados, deixa claro que negocia, mas que o presidente dará a
palavra final. A delegação a Dirceu para conduzir os entendimentos é parte do estilo de Lula. O
presidente fala pouco com os aliados. Prefere entrar só no final.
Mesmo Sarney é obrigado a tratar
primeiro com Dirceu. Foram raras as conversas diretas de Lula
com a cúpula do PMDB.
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