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ANÁLISE
Crise na base exigirá intervenção de Lula
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A derrota sofrida ontem pelo
governo foi política e econômica.
Foi política porque ficou evidente
que a base de Lula no Senado é
frágil e os líderes governistas não
atuam em grupo. Foi econômica
porque o valor do salário mínimo
em R$ 275 é diferente do que defende a equipe do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho.
O problema econômico tende a
ser resolvido na Câmara. Os deputados podem reverter a decisão
do Senado. O salário mínimo voltaria para os R$ 260 desejados pelo Planalto. Mas a crise política
não será solucionada sem uma intervenção direta do presidente.
A gênese da descoordenação foi
o encaminhamento que o governo deu à emenda constitucional
que permitiria a reeleição dos presidentes da Câmara, João Paulo
Cunha (PT-SP), e do Senado, José
Sarney (PMDB-AP).
Primeiro, Lula não tratou o assunto com atenção. Depois, foi
ambíguo ao abordar o tema com
João Paulo e Sarney. Por fim, recuou e deixou que cada ministro
atuasse como bem desejasse.
O resultado foi trágico. A Câmara rejeitou a emenda da reeleição
em 19 de maio. A derrota foi humilhante para João Paulo e Sarney
-que passaram o primeiro ano
do governo Lula ajudando o Planalto a fazer o que bem entendia
dentro do Congresso.
O revés cindiu a área política em
dois grupos distintos. De um lado,
o ministro da Casa Civil, José Dirceu, que apoiou João Paulo e Sarney. Do outro, o ministro da
Coordenação Política, Aldo Rebelo, que se alinhou com o líder do
PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL). Renan é adversário de
Sarney e aspira ser presidente da
Casa -a eleição é em fevereiro.
Ato contínuo, quando o Palácio
do Planalto precisou de toda a
força disponível para aprovar o
salário mínimo de R$ 260, o grupo de Dirceu, João Paulo e Sarney
se movimentou só o necessário
para não ser classificado como
traidor. Dirceu chegou a pensar
em ajudar a aprovar a MP do mínimo no Senado para faturar a vitória, mas percebeu que seria uma
tarefa muito difícil e retirou o time de campo. A responsabilidade
maior ficou nas mãos do ministro
Aldo Rebelo e de Renan Calheiros. Os líderes governistas no Senado têm pouco poder. Não puderam ajudar a reverter o cenário
adverso. A derrota foi inevitável.
O resultado prático será medido
pela reação de Lula. O presidente
pode concluir que não é possível
ter um ministro como José Dirceu
-que, ao se sentir contrariado,
não consegue agir de maneira
desprendida em uma votação importante como a do salário mínimo. Nesse caso, o chefe da Casa
Civil sairia pior do que entrou
nessa disputa.
Mas Lula também pode concluir que não tem como demitir
Dirceu, o principal dirigente petista e homem forte do aparelho
partidário. Nessa hipótese, mesmo sabendo que Aldo Rebelo foi
sabotado, teria de remover o deputado do PC do B do Planalto e
entregar a coordenação política
de volta a Dirceu -na forma de
outro coordenador que aceitasse
se subordinar à Casa Civil.
Para sorte de Lula, não há projetos vitais para o governo a serem
votados num futuro próximo. Se
a Câmara reverter a decisão do
Senado, tudo estará resolvido no
capítulo do salário mínimo. Congressistas ficarão em recesso
branco até o fim do processo eleitoral, em outubro.
Ainda assim, o Palácio do Planalto continuará sem votos para
aprovar leis ordinárias e MPs, que
requerem apenas maioria simples. Para os dois últimos anos de
mandato, Lula terá de consertar
sua articulação política. É quase
certo que o desconfortável assunto da reeleição de João Paulo e de
Sarney terá de voltar à pauta.
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