São Paulo, sexta-feira, 18 de outubro de 2002

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FOLCLORE POLÍTICO

Na república do emprego

AUGUSTO MARZAGÃO

Então presidente da República, Jânio Quadros recebeu o ministro do Exército, general Odylio Denys, para um pequeno jantar no Palácio da Alvorada. A mesa estava alegre e, como sempre, não faltaram na conversa alguns problemas familiares. Cada comensal tinha o seu caso a relatar. Um ministro importante, por exemplo, contou que estava sem conseguir encontrar um trabalho para um sobrinho que acabava de se formar em direito. Jânio apressa-se em convocar o seu secretário particular, José Aparecido de Oliveira, a quem pede uma lista de cargos vagos de assessores nos principais órgãos federais.
Trazida a lista, o presidente informa com satisfação ao ministro: "Aqui está um cargo disponível de assessor do tesoureiro dos Correios e Telégrafos". O padrinho do emprego quis saber qual era o salário. Diante da resposta de Jânio, pediu desculpas para dizer que o cargo não servia porque "era muito dinheiro para o menino". Surpreso, JQ apresentou uma opção mais modesta, porém o ministro achou que ainda era um salário excessivo. Nesse ponto o presidente desabafa: "Caro ministro, abaixo desse salário só emprego por concurso público".
Passemos a outra história do copioso folclore janista. Jânio tinha vindo de São Paulo de trem para uma audiência com o presidente Juscelino Kubitschek no Rio. Encontrando JK nervoso, com o jornal "O Globo" daquele dia na mão, se atreveu a perguntar: "Presidente, noto-o apreensivo. Alguma crise militar?". Juscelino respondeu que não e explicou: "A minha mulher, Sara, tem uma sobrinha que vai se casar com um jovem advogado e ela me pediu que arranjasse um cargo bom para o rapaz. Como estivesse vago o Cartório Guaraná, eu nomeei meu futuro sobrinho para ser o novo titular. A lei me faculta nomear para esses cargos de livre provimento quem eu considerar apto. Veja, governador, o título do editorial do "O Globo" na primeira página -"Guaraná Caçula". Tem cabimento?".
Terminada a audiência e depois de chegar ao Hotel Glória, acompanhado por Geraldo Carneiro, o governador comentou com o secretário particular de JK: "Caro Geraldo, se o seu presidente está resolvendo nessa base casamentos na família, então acho que vou me divorciar de Eloá. Ele tem outra sobrinha solteira?".


AUGUSTO MARZAGÃO, jornalista, autor do livro "Memorial do Presente", ex-secretário particular de Jânio Quadros e José Sarney e ex-secretário de Comunicação Institucional de Itamar Franco, escreve às sextas nesta seção

cecifrei@unisys.com.br



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