São Paulo, quarta, 18 de novembro de 1998

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Grupo diz que seria usado como sparring

ELVIRA LOBATO
da Sucursal do Rio

O ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e a direção do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) estimularam o consórcio Telemar a disputar a telefônica Tele Norte Leste com o grupo liderado pelo Opportunity até minutos antes de começar o leilão de privatização da estatal.
A atuação do ministro foi confirmada à Folha por integrantes do consórcio Telemar. Segundo relato dos executivos do consórcio, o governo começou a agir na semana que antecedeu o leilão.
Os sócios do Telemar afirmam estar convencidos de que o governo só os estimulou por acreditar que perderiam a disputa para o Opportunity. Ou seja, eles iriam desempenhar o papel de sparrings: lutadores de boxe usados nos treinos dos campeões.
O consórcio começou a ser formado duas semanas antes do leilão e, segundo seus executivos, com grande dose de acaso.
Os empresários Sérgio Andrade, da construtora Andrade Gutierrez, e Antônio Dias Leite (ex-sócio da Globo na empresa de TV a cabo Multicanal) começaram a discutir uma parceria para o leilão da Telebrás.
Até aquele momento, poucos consórcios haviam sido formados para disputar as empresas de telefonia fixa (Telesp, Tele Centro Sul, Tele Norte Leste e Embratel), e as negociações eram comandadas por operadoras estrangeiras.
O grupo paranaense Inepar, que já era sócio da banda B (telefonia celular) no Paraná e Santa Catarina, também buscava uma oportunidade para participar do leilão.
Esses três empresários acabaram se encontrando com a BR Telecom, ligada ao grupo Riolistas, que edita as listas telefônicas do Rio.
A BR Telecom havia estudado os "data-rooms" de todas as empresas da Telebrás e estava igualmente à procura de sócios.
Acabou contratando o banco Fonte Cindam -que tem entre seus quadros o ex-presidente do BNDES Eduardo Modiano- para auxiliá-la na tarefa.
Por essa ocasião, juntaram-se a eles Carlos Jereissati, do grupo La Fonte, e o fundo de pensão do Banco do Brasil, Previ.
² Incentivo
No dia 20 de julho, portanto nove dias antes do leilão, os candidatos deveriam entregar a documentação na CLC (Câmara de Liquidação e Custódia) da Bolsa do Rio para a pré-habilitação. Cada um decidiu encaminhar sua papelada individualmente, deixando para definir o consórcio mais adiante.
É nesse momento, segundo os executivos, que o ministro das Comunicações e a alta direção do BNDES passam a incentivá-los explicitamente a disputarem a Tele Norte Leste com o consórcio liderado pelo Opportunity.
Nos dias que antecederam o leilão, representantes do consórcio foram recebidos pelo ministro Mendonça de Barros e pelos presidente e vice-presidente do BNDES, respectivamente André Lara Resende e José Pio Borges.
O governo havia autorizado o BNDES a financiar os empresários nacionais que participassem da privatização das teles em 50% do preço mínimo de venda.
Segundo relato dos integrantes do consórcio Telemar, as autoridades citadas garantiam que eles teriam financiamento oficial.
O edital de venda da Telebrás não exigiu a presença de uma operadora estrangeira no consórcio. Mesmo assim, o BNDES sinalizou para o consórcio Telemar que gostaria que ele tivesse um sócio internacional, que trouxesse experiência administrativa e tecnologia.
Na véspera do leilão, os integrantes do Telemar propuseram à Telefónica de España que aderisse ao grupo na condição de acionista minoritária. Segundo as regras fixadas pelo governo, um mesmo grupo não poderia comprar o controle de duas empresas de telefonia fixa, mas poderia ser majoritária em uma e minoritária em outra.
²
Surpresa
Até a véspera do leilão, era dado como certo que a Telefónica de España iria apostar todas as fichas na compra da Tele Centro Sul, uma vez que já era sócia da telefônica CRT, do Rio Grande do Sul.
Para a compra da Telesp fixa, os favoritos eram a norte-americana BellSouth (em parceria com o grupo Safra) e o consórcio formado pela Telecom Italia, Bradesco e Organizações Globo.
Nessa engenharia, o consórcio integrado pelo Opportunity e fundos de pensão -com participação minoritária da Telecom Italia- era o favorito para arrematar a Tele Norte Leste.
Ocorre que o leilão foi uma completa surpresa. A BellSouth desistiu da Telesp, e os espanhóis ofereceram ágio de 64,3% e arremataram a empresa por R$ 5,78 bilhões.
O Opportunity acabou ficando sozinho na disputa pela Tele Centro Sul e levou o que não queria. A Tele Norte Leste, para surpresa do próprio governo, foi comprada pela Telemar com apenas 1% de ágio.



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