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JANIO DE FREITAS
O tempo desnecessário
A Mensagem do Executivo
lida pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva no Congresso deve ter sido um discurso
brilhante e sólido. Com Getúlio
comecei a ouvir discursos presidenciais, ainda incapaz de os
compreender, e desde então os
tenho ouvido com o máximo de
atenção, embora o mínimo de
vontade. Mas só o de agora me
lembrou os de Getúlio: por motivos muito diferentes, não entendi nada neste, como não entendia naqueles.
O presidente informa-nos de
que "a estabilidade da nossa
moeda encontra-se ameaçada"
e de que "o vírus da inflação voltou a ser uma ameaça real para
o organismo econômico brasileiro". Mas também nos assegura que, diante disso, "o governo
tem adotado as políticas adequadas".
Se o governo executa as "políticas adequadas", a "estabilidade da nossa moeda" não "se encontra ameaçada", mas defendida. Outra hipótese está, porém, igualmente ofertada: se "a
estabilidade encontra-se ameaçada", as "políticas adequadas"
não o são. E, nesse caso, estão
mais para ameaça do que para
defesa.
A "queda do dólar" que é celebrada em um parágrafo ocupa-se, em outro parágrafo, do mesmo dólar cuja "cotação voltou a
subir em relação ao real", o que
nega a existência da "política
adequada". E é ainda o mesmo
dólar que, em mais outro parágrafo, leva ao reconhecimento
de que "o câmbio permanece
instável e distorce nosso sistema
de preços internos".
Se há "câmbio instável", a "estabilidade da nossa moeda" não
"se encontra ameaçada": não
existe, simplesmente, dada a lamentável impossibilidade de
que "a nossa moeda" seja a um
só tempo instável e estável.
Como "o câmbio permanece
instável e distorce nosso sistema
de preços internos", não é de admirar a constatação presidencial de que "as pessoas assistem
inquietas à diminuição do poder de compra de seus salários,
com a alta de muitos preços".
E a "política adequada" se
adequa, então, a quê? Não sei,
fui, ou sou, incapaz de entender
o discurso que deve ter sido brilhante e sólido. Apenas sei, mas
também não entendo, que as
medidas caracterizadoras da
"política adequada" -aumento dos juros estrangulantes, busca de maior saldo nas contas do
governo, corte de investimentos
e de verbas sociais - "durarão
o tempo necessário".
Qual é esse tempo? Não sei,
também. Mas posso lembrar
que, no começo do seu governo,
Fernando Henrique dizia ser de
um ano, Malan dizia ser de dois
anos. Quando, passado o ano,
um aumentou sua previsão para dois anos, o outro levou a sua
para três ou quatro. Durou oito
e só deixou o país, segundo o
diagnóstico do atual presidente,
em "situação gravíssima". Durou e não acabou: continua sendo a "política adequada".
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