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São Paulo, quarta-feira, 19 de fevereiro de 2003

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EUA suspeitaram de conta em 97

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

A apreensão de documentos relacionados às contas bancárias da agência do Banestado (Banco do Estado do Paraná) de Nova York, pela Polícia Federal, revelou que o Departamento de Justiça dos EUA bloqueou dinheiro de uma conta sob suspeita de lavagem de dinheiro do narcotráfico.
Na correspondência enviada ao Banestado em 1997, a procuradora federal de Nova York Mary Jo White indicou que a conta nš 1406-6, aberta em nome da "offshore" uruguaia Nager Fidelity S/ A, conteria dinheiro de Sâmia Haddock Lobo, ex-mulher de Antônio Mota Graça, o "Curica", segundo a polícia um dos contatos dos cartéis colombianos no Brasil. Ambos foram indiciados pela CPI do Narcotráfico, em 1999.
A conta da Nager movimentou US$ 72,8 milhões entre 24 de março e 29 de setembro de 1997, segundo o Ministério Público.
A equipe da PF constituída pelo delegado Castilho Neto e pelos peritos Renato Barbosa e Eurico Montenegro apreendeu documentos da agência do Banestado em Nova York no ano passado. Em dezembro, foi concluído o laudo que analisou 137 contas, que teriam movimentado US$ 30 bilhões nos anos de 1996 e 1997.

Fortaleza
Os procuradores da República e a Polícia Federal de Fortaleza (CE) começaram a investigar a conta da Nager há uma semana. Os crédito vinham de vários correntistas "laranjas" via Foz do Iguaçu.
De acordo com os papéis apreendidos, o procurador da Nager Fidelity, que anotou Montevidéu como sede, é o brasileiro Carlos Eduardo Bechara Mussi, 45. Na ficha de abertura da conta, o banco anotou, a caneta, que Bechara "trabalhou com o Alex da AccTur e abriu a própria empresa em janeiro de 1997".
O empresário Alexander Ferreira Gomes, 39, conhecido como "Alex", controla o grupo AccTur, que inclui uma casa de câmbio e outras 11 empresas no Ceará.
Gomes foi alvo de processo na Justiça Federal de Fortaleza, sob acusação de ter levado US$ 615 mil do Rio para o Ceará, em 1992, sem explicar a origem dele. Em 1995, a AccTur realizou operações no valor de US$ 17 milhões.
O pedido de bloqueio de dinheiro da conta da Nager foi feito em setembro de 1997 pelo Departamento de Justiça dos EUA. Um dia depois, o advogado de Nova York David Eric Spencer, que prestava serviços para o Banestado na abertura de empresas "offshore" (com sede virtual em paraísos fiscais), mandou uma carta ao gerente da agência Waldir Perin.
Spencer contou ao gerente ter telefonado para a assistente da procuradora federal, Jane Levine. Ela teria dito que o banco deveria dizer à "cliente" -sem especificar se falava sobre a Nager ou sobre Sâmia- apenas que "a conta está congelada", "sem dar as razões para tal congelamento".

"Transações narcóticas"
Em 11 de setembro, a procuradoria americana enviou nova carta à agência do Banestado. Nela, a procuradora Mary Jo White explicou que o governo americano tinha "razoáveis motivos" para supor que a conta do Banestado guardava dinheiro "procedente de transações narcóticas ilegais e dinheiro usado para facilitar transações narcóticas ilegais".
O inquérito que começou a tramitar a respeito da Nager foi enviado ao Ceará pela Justiça Federal de Foz do Iguaçu (PR), onde o envio de US$ 30 bilhões para o exterior, por meio de contas CC-5 (para residentes no exterior), é investigado pela polícia desde 1998.
O caso Nager deu origem a uma nova linha de investigação no Ministério Público Federal. O procurador Luiz Francisco de Souza, de Brasília, está colhendo documentos para saber se o Banco Central foi ou não omisso na fiscalização sobre as operações dos correntistas que utilizaram o Banestado para lavar dinheiro.
De acordo com o procurador, a investigação de narcotráfico, que desembocou em crime financeiro por meio da Nager, chegou ao conhecimento de autoridades brasileiras, que por sua vez não teriam feito nada a respeito.
Segundo Luiz Francisco, elementos colhidos nas diligências da PF indicariam que Tereza Grossi, diretora de Fiscalização do BC, apesar de ter ciência das operações ilícitas do Banestado, não teria tomado providências.
Em entrevista à Folha, na semana passada, Grossi disse ter levantado indícios de operações suspeitas na agência em NY nas duas inspeções de que participou.
Ela levou, então, o caso à OCC, o órgão dos EUA que fiscaliza o mercado. A OCC confirmou ter sido acionada por Grossi.
"Não é possível aceitar que ilícitos conhecidos desde 1997 ficassem sem providências até 2002. Há algo errado", afirma Luiz Francisco.
O BC argumenta, porém, que fez a notificação das irregularidades ao OCC em 1998 e que, no ano seguinte, o órgão americano multou a agência de Nova York do Banestado.


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