São Paulo, segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

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Conceito inicial de programa é abandonado

FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há contradições não só numéricas mas também conceituais entre os resultados da política de assentamentos de terra divulgados pelo governo Lula e o que pregava o próprio documento que deveria balizar sua ação: o 2º Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), de 2003. O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) anuncia ter cumprido a meta número um: das 400 mil novas famílias assentadas previstas no plano, assentou 381 mil.
Mas, pelo que demonstra o cruzamento de dados feito pela Folha, foram contabilizadas no total famílias nas terras há anos -algumas com títulos concedidos pelos governos estaduais.
Outras famílias da estatística passaram pelo processo de regularização fundiária. O problema é que o PNRA é explícito ao separar regularização e números de assentados. A "Meta 2" do programa é justamente alcançar o número de 500 mil famílias com posses regularizadas.
O governo também abandonou conceito central do plano. Lá estava escrito: "A centralidade está no instrumento de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária dos latifúndios improdutivos que, entretanto, deverá combinar com outros instrumentos disponíveis, como é o caso de arrecadação de terras públicas e devolutas" -70% das áreas deveriam vir de desapropriação, segundo o texto.
O MDA admite que houve "inversão" da prioridade. Pelo levantamento preliminar, só 40% dos assentamentos tiveram origem em terras desapropriadas. Especialistas dizem que, ao abandonar "o instrumento principal" para aquisição de terra, o governo abandona o conceito de reforma agrária.
"Desde a campanha que se falava da desapropriação como instrumento principal da reforma. O governo esvaziou sua própria proposta. É preciso mexer no índice de concentração de terras, mexer com assentamentos novos", diz José Juliano de Carvalho, economista e professor aposentado da USP.
"O espírito da reforma agrária é a intervenção punitiva do Estado em relação aos proprietários cujas terras não cumpriram sua função social", diz Plinío de Arruda Sampaio, do PSOL.
Os especialistas mostram mais um ponto não cumprido: no PNRA, as cerca de 200 mil famílias acampadas são descritas como "demanda emergencial". "Isso não aconteceu", diz Plínio.
Apesar disso, ainda que crítico do resultados do governo, o principal movimentos agrário do país, o MST apoiou a reeleição de Lula.
O apoio, diz Carvalho, é explicado pelas ações positivas do governo, como a melhoria do crédito e da infra-estrutura. A mais expressiva, afirma, foi dar tratamento "digno" aos movimentos sociais -uma melhora em comparação à "criminalização" levada a cabo por FHC.


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