|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELEIÇÕES 2006/MÁQUINA PÚBLICA
Sob Lula, contas pendentes
chegam a R$ 39,6 bilhões
Volume de despesas é mais de três vezes limite de gastos para investimentos no ano
Tesouro tem deixado de
lado grande volume de
gastos ao fazer cálculo de
superávit primário para não
comprometer meta de corte
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Os sucessivos recordes em
economia de gastos obtidos pelo governo federal, o chamado
superávit primário, nos últimos anos, ocultam despesas
não pagas que alcançaram R$
39,6 bilhões no início do último
ano de mandato do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
O número é considerado
"preocupante" pelo TCU (Tribunal de Contas da União).
O volume de contas pendentes de pagamento no início de
2006 era mais de três vezes o limite de gastos determinado para investimentos no ano. Fixado por decreto presidencial em
R$ 13 bilhões, o limite de gastos
não é suficiente nem para pagar
os investimentos já contratados até dezembro de 2005, no
valor de R$ 13,2 bilhões, segundo o Siafi (sistema informatizado de acompanhamento dos
gastos federais).
No último ano de Lula, restam três opções: 1) cancelar
parte dos gastos já comprometidos, a maior parte objeto de
contratos e alguns referentes a
serviços e produtos já entregues -o que pode resultar em
calote; 2) radicalizar os cortes
de gastos em ano eleitoral ou 3)
aumentar ainda mais o volume
de despesas pendentes, conhecidas no jargão das contas públicas como "restos a pagar".
Nesse último caso, Lula ou
seu sucessor começará o mandato em 2007 com parte importante dos tributos a serem
arrecadados comprometida
com gastos passados. O maior
constrangimento vai ocorrer
nos ministérios da Saúde, da
Defesa e dos Transportes, que
registram o maior saldo de contas pendentes. Questionada sobre as alternativas acima, a Secretaria do Tesouro Nacional
foi algo evasiva na resposta.
Disse que o volume de restos a
pagar em 2006 "não deve ser
superior ao montante registrado ao final de 2005".
Fora da contabilidade
Ao calcular o superávit primário (economia destinada ao
pagamento de juros da dívida
pública), o governo não leva em
conta despesas não pagas.
Dados do Tesouro Nacional
mostram que os superávits obtidos a partir dos acordos com o
FMI, em 1998, deixaram de lado grande volume de despesas.
Na série histórica, os piores
desempenhos foram registrados em 1999 (início do segundo
mandato de Fernando Henrique Cardoso), em 2003 (primeiro ano de Lula) e em 2005.
Em 2003, quando oficialmente
o governo economizou R$ 39,6
bilhões para juros e encargos da
dívida, os restos a pagar somaram R$ 33,5 bilhões (equivalente a quase 85% do superávit
do governo central).
Se a conta dos restos a pagar
fosse incluída, seria anulada
parte importante da meta de
corte alcançada em 2003, em
conjunto com estatais, Estados
e municípios, equivalente a
4,25% do PIB. No segundo ano
de Lula, a conta dos restos a pagar encolheu mais de R$ 10 bilhões. Entre 2004 e 2005, voltou a crescer: 78%.
Levantamento feito pela
ONG Contas Abertas a pedido
da Folha mostra os efeitos perversos dos restos a pagar.
Mesmo em valores corrigidos, Lula registra recorde em
investimentos neste ano, mas
98% dos gastos referem-se a
despesas assumidas até 2005.
Dos investimentos pagos, há
R$ 88 milhões autorizados pela
lei orçamentária de 2006 contra R$ 3,7 bilhões de obras e
serviços cujo pagamento encontrava-se pendente. Ou seja,
a cada ano, é preciso optar entre pagar as contas anteriores
ou cumprir os gastos autorizados pela lei orçamentária.
Os restos a pagar ganharam
destaque no noticiário há pouco mais de três anos. A 13 dias
de passar a faixa presidencial
para Lula, Fernando Henrique
Cardoso mandou cancelar R$
26,1 bilhões (R$ 2,7 bilhões
correspondiam supostamente
por serviços concluídos) de
despesas pendentes de 2001.
Cerca de 2.000 contratos administrados pela Caixa Econômica Federal na área de saneamento e urbanização foram para o limbo. Mais de mil obras
foram paralisadas na ocasião.
Outro decreto, baixado pelo
próprio Lula em fevereiro de
2003, cancelou mais R$ 18,1 bilhões de despesas pendentes,
dos quais R$ 700 milhões já haviam sido objeto de liquidação.
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Outro lado: Tesouro contesta TCU e afirma que conta é natural Índice
|