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JANIO DE FREITAS
Em má hora
É uma notícia apenas relativa: Luiz Inácio Lula da
Silva, segundo o próprio, está
mudando de opinião sobre os
transgênicos. A primeira parte
da frase, referente à mudança
de opinião, não é notícia: por
definição, só há notícia se há algo novo. A segunda, sim, implica a novidade de que a soja geneticamente modificada pela
empresa americana Monsanto,
proibida em grande parte da
Europa e ainda no Brasil, afinal
vislumbra o fim de sua longa
batalha -política, comercial,
judicial e sobretudo financeira- para dominar o gigantesco
plantio brasileiro.
O presidente ligou a mudança
de opinião à influência de informes científicos. Fez bem em
prestar tal esclarecimento, porque se sabe que o lobby da Monsanto é muito poderoso, tem
conquistas importantes por aí
afora, e o governo dos Estados
Unidos deseja muito que o Brasil engula, nos vários sentidos
da palavra, a soja da Monsanto.
Mas, se o esclarecimento presidencial foi útil, ao menos para
as pessoas que não crêem no jogo das questões internacionais,
a hora da menção à influência
de notícias científicas foi muito
infeliz. Por coincidência, na
ocasião mesma em que se toma
conhecimento da mudança presidencial de opinião, cientistas
do governo do Canadá revelam
a descoberta de que o herbicida
com glifosato estimula a profusão de um fungo cujas toxinas
matam seres humanos e animais, além do potencial de arrasar plantações.
Pois bem, a soja transgênica é
um vegetal modificado pela
Monsanto para suportar, o que
não acontece com a soja original, as quantidades necessárias
ao herbicida Roundup, fabricado pela mesma Monsanto, para
ser eficaz contra ervas invasoras.
O governo Lula veio para mudar. Mas, na falta das esperadas
mudanças, muda de opinião. E,
apesar de fazê-lo sempre na
mesma direção, não seria mau
que o presidente ouvisse outros
cientistas, além dos que são pró-soja transgênica, antes de mandar ao Congresso o projeto que
a Presidência prepara sobre
biossegurança. A fórmula adotada em princípio, no projeto,
para não ser contra a soja da
Monsanto nem ficar desabridamente a favor, é criar percursos
burocráticos mais longos para a
autorização dos plantios. Trata-se, porém, de saúde e de vida
dos consumidores, e isso exige
definições claras e firmes, sem
tergiversações.
Do ponto de vista que predomina no governo -o do economicismo acima das contingências existenciais- a liberação
da soja transgênica será como
um presente aos agricultores
dos Estados Unidos, reconhecidos pelo governo Lula como beneficiários de subsídios e outros
favorecimentos que prejudicam
a produção agrícola e as exportações brasileiras. Mesmo com o
protecionismo, as exportações
da soja transgênica americana
são dificultadas pela preferência européia por soja normal,
caso da brasileira, ainda que
com preço maior.
Certos transgênicos já se mostraram inofensivos e úteis, mas
a soja resistente ao Roundup
ainda é, no mínimo, uma incerteza inquietante.
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