São Paulo, sábado, 19 de outubro de 2002

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Lula propõe conselho para inclusão social

É possível aumentar significativamente os gastos em programas sociais sem reduzir as despesas da Previdência? Os senhores admitem rediscutir os chamados direitos adquiridos dos servidores públicos no que diz respeito às suas aposentadorias?
Lula já se comprometeu publicamente, em diversas ocasiões, a não mexer nos direitos adquiridos dos funcionários públicos. O que está em discussão é a necessidade de formular um Sistema Previdenciário Único, com fontes de financiamento estáveis e suficientes, envolvendo todos os setores. Com relação aos gastos das políticas sociais, com exceção dos previstos no Orçamento da Seguridade Social e do Fundo de Assistência Social, estão permanentemente sujeitos a cortes e negociações subordinadas aos calendários eleitorais. Além disso, estão pulverizadas em diversos órgãos e ministérios. Por isso, estamos propondo a criação do Conselho de Desenvolvimento Social, que terá como atribuição coordenar e definir metas e instrumentos para a inclusão social, além de um orçamento próprio em nível federal para evitar o contingenciamento de verbas para outros fins.
Os gastos sociais (exceto a Previdência) de diversos programas realizados são da ordem de R$ 45 bilhões por ano, o que é mais do que o dobro dos recursos necessários à implantação do Programa de Cupons de Alimentação do Projeto Fome Zero, por exemplo.
É possível, portanto, no início, redirecionar parte dos recursos já existentes e simultaneamente aumentar os recursos fiscais resultantes de um ritmo maior de crescimento da economia, assim como da redução dos juros e também do melhor gerenciamento dos recursos disponíveis, com redução do desperdício existente.

No que diz respeito à "rede de proteção social" do governo FHC, a quais programas os senhores pretendem dar prioridade? Os senhores pretendem extinguir os programas de cesta básica, tidos como os mais ineficientes e sujeitos a clientelismo e corrupção?
Os direitos humanos incluem o respeito à infância, o direito à alimentação, à educação, à cultura, à segurança, ao trabalho e a condições de trabalho e aposentadoria dignos. Mas, por garantir a vida, uma das grandes prioridades é acabar com a fome. É possível fazer isso sem tirar recursos de outros setores.
A proposta apresentada por Lula, o Projeto Fome Zero, é associar políticas estruturais, que causam a permanência da fome e da miséria, com políticas emergenciais, para "salvar vidas". A principal delas é substituir as cestas básicas por cupons que podem assumir a forma de cartões magnéticos para a aquisição de alimentos. Esse programa é adotado com sucesso em vários países e representa um grande avanço em relação à distribuição de bens de espécie, como as cestas básicas.
Propomos também manter a política de cestas básicas em casos emergenciais, garantida através da formação de estoques de alimentos de segurança, política defendida pelas Nações Unidas.

Alguns dos principais problemas dos programas sociais são o risco de corrupção e clientelismo, a perda de recursos na máquina administrativa, a multiplicação de estruturas administrativas tanto no governo federal como nos Estados e municípios e o controle do alvo do benefício (se são os mais pobres a recebê-lo). Como os senhores pretendem reduzir as estruturas burocráticas e aumentar o controle público sobre os programas sociais?
Nossa visão de política social é a seguinte:
1) Trabalhar simultaneamente as políticas estruturais e as políticas emergenciais. A política compensatória deve ser vista como emergencial e temporária, de forma a criar condições para que as famílias superem a condição de vulnerabilidade;
2) Política social é para garantir cidadania e direitos essenciais. É importante ter a noção de várias camadas de proteção social: aos idosos, aos jovens, às crianças, e considerar tais programas como um direito -e não como uma dádiva divina ou um favor dos políticos clientelistas;
3) A noção da universalização dos direitos sociais garante mais cidadania que a noção da separação de pobres e não-pobres. A discriminação (focalização, contagem, cadastro único, separação de cidadãos e não-cidadãos) fortalece a visão de subcidadãos e de favores pessoais, a qual se quer combater;
4) Combater a fome e construir moradias não é doação. Isso gera desenvolvimento, gera empregos e desenvolve a economia;
5) Os beneficiários têm que ser atores fundamentais: participar das decisões, da seleção e ter contrapartidas, como trabalho comunitário, qualificação profissional, educação e saúde.


Maya Takagi, doutoranda em economia da Unicamp e coordenadora-executiva do Projeto Fome Zero, respondeu às perguntas do candidato de seu partido.



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