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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ ESTATAIS
BMG, credor do PT, lucrou R$ 209 mi com a estatal; comissão vê possível "valerioduto"
CPI suspeita de operação entre banco mineiro e CEF
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O BMG, banco credor de supostos empréstimos de R$ 29,2 milhões para o caixa dois do PT, teria lucrado R$ 209,8 milhões
-seis vezes mais- em um conjunto de seis operações realizadas
com a Caixa Econômica Federal
de venda de carteiras de empréstimos feitos a aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Entre dezembro de 2004 e setembro deste ano, o BMG recebeu
da Caixa R$ 1,094 bilhão pelas seis
operações. Os aposentados e pensionistas deviam ao BMG, nessas
carteiras de empréstimos,
R$ 935,2 milhões. A diferença, de
R$ 158,8 milhões, foi paga ao
BMG como remuneração por
captação de clientes. Além disso,
o banco teria recebido mais R$ 51
milhões em decorrência do cálculo do saldo devedor das carteiras.
Documentos com detalhes das
operações foram requisitados ao
banco estatal pelo senador Álvaro
Dias (PSDB-PR) e analisados por
uma equipe de técnicos do Senado. A conclusão a que chegaram é
que se trata de uma das prováveis
fontes de dinheiro do caixa dois
do PT operado pelo publicitário
mineiro Marcos Valério de Souza.
"Temos razões de sobra para
supor que essas operações tenham sido instrumento para calçar os tais empréstimos, que sempre reputamos fictícios, operações meramente contábeis", afirmou o senador, que ontem mesmo solicitou ao TCU (Tribunal de
Contas da União) uma auditoria.
Quando o assunto foi abordado
em depoimento do principal executivo do BMG à CPI dos Correios, há dois meses, Ricardo Guimarães atribuiu a venda dos ativos "à necessidade urgente do
BMG de adquirir liquidez em virtude do "risco sistêmico" surgido
quando da intervenção do Banco
Santos". A oferta do BMG à Caixa
Econômica Federal foi formalizada 17 dias depois de o Banco Central decretar intervenção no Banco Santos, em novembro de 2004.
"Não é papel da Caixa Econômica Federal socorrer instituições", reagiu Álvaro Dias. O senador acredita que houve gestão temerária na estatal e vai pedir a
convocação do presidente da
CEF, Jorge Mattoso, à CPI.
Às pressas
A cronologia das negociações
entre BMG e Caixa revela um negócio fechado às pressas. Entre a
proposta formal do banco mineiro e a resolução do Conselho Diretor da Caixa que autorizou a
primeira compra de créditos referentes a empréstimos concedidos
a aposentados e pensionistas passaram-se apenas 23 dias.
A autorização é assinada pelo
presidente Jorge Mattoso. Na ocasião, o acerto era pagar um ágio
ao BMG, supostamente para cobrir custos de captação de clientes, em 12 parcelas.
Mas menos de dois meses depois, em fevereiro deste ano, o
próprio Mattoso assinou outra resolução com mais vantagens ao
banco mineiro: em vez de parcelado, o ágio é pago à vista.
De acordo com os técnicos do
Senado, além do ágio de R$ 158,8
milhões já integralmente pago ao
BMG, o banco teria tido lucro extra de R$ 51 milhões pela fórmula
usada para calcular o saldo devedor dos contratos.
Na data da primeira autorização
assinada por Mattoso, um parecer
técnico da Caixa alertava para
pontos negativos da operação: "A
avaliação dos riscos operacionais
da proposta fica prejudicada em
virtude da ausência de definição
dos fluxos operacional, financeiro
e tecnológico da operação".
Outro problema apontado pela
área técnica do banco foi a não-transferência dos documentos referentes aos empréstimos para a
Caixa, o que prejudica o controle
dos contratos.
A cronologia das operações revela mais um detalhe estranho: a
venda de parte da carteira de empréstimos é concretizada apenas
três meses depois de o BMG ser
autorizado por medida provisória
a operar o crédito a aposentados e
pensionistas do INSS com desconto em folha, em setembro de
2004. A MP já era considerada
uma benesse do governo Lula ao
BMG, que, ao lado do Banco Rural, teria providenciado R$ 55,2
milhões que alimentaram repasses do PT a políticos aliados, via
"valerioduto".
"A documentação revela que a
CEF fechou às pressas um negócio de alto risco operacional",
afirma nota técnica do gabinete
do senador Álvaro Dias.
Lucro transferido
De acordo com a análise dos técnicos, a Caixa não teve propriamente um prejuízo nas operações
com o BMG, mas a estatal teria
deixado de lucrar R$ 350,1 milhões. O cálculo foi feito com base
no lucro que a Caixa teria caso tivesse emprestado diretamente a
aposentados e pensionistas pela
mesma taxa cobrada pelo BMG
(2,8% ao mês), em vez de comprar a carteira do banco mineiro.
"O lucro da Caixa foi de pelo
menos a metade do que poderia
ter sido. A Caixa deixou de ganhar
para que alguém ganhasse", concluiu Álvaro Dias.
Outro detalhe: a Caixa já desembolsou R$ 1,09 bilhão, incluindo o
ágio pago ao BMG, mas vai demorar três anos para cobrar os empréstimos dos aposentados e pensionistas. Ou seja, enquanto o
BMG já lucrou R$ 209 milhões, a
Caixa vai levar até 2008 para lucrar R$ 346 milhões.
De acordo com documentos
apresentados por Valério, o BMG
aparece ligado ao esquema de caixa dois do PT em 25 de fevereiro
de 2003, menos de dois meses depois da posse do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Essa é a data
do primeiro empréstimo de R$ 12
milhões à SMPB, uma das agências de Valério, que seria repassado a pessoas indicadas pelo ex-tesoureiro petista Delúbio Soares.
Dos quatro empréstimos concedidos às empresas do publicitário,
o primeiro foi o único quitado. O
BMG seria credor atualmente de
cerca de R$ 50 milhões do esquema do caixa dois do PT. Os empréstimos não foram cobrados
até o início das investigações.
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