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CASA SEVERINA
Orçamento de quase R$ 2,5 bilhões atende a mais de 20 mil pessoas e só é inferior aos de três municípios do país
Verbas da Câmara superam as de 8 Estados
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em uma de suas várias tentativas frustradas de presidir a Câmara, o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) disse o seguinte:
"Isso aqui é um mundo maior do
que vários Estados".
Severino está certo. Os R$ 2,477
bilhões do orçamento anual da
Câmara fazem dessa Casa do Poder Legislativo uma potência financeira maior do que oito Estados brasileiros -essa é uma das
razões de ser tão cobiçada.
De acordo com dados do Tesouro Nacional para o ano de
2003 -os únicos disponíveis,
mas a relação de comparação
continua semelhante até hoje-,
os governadores de Acre, Alagoas, Amapá, Piauí, Rondônia,
Roraima, Sergipe e Tocantins administram orçamentos menores
do que o de Severino.
Entre os 5.562 municípios do
país, só três têm uma verba anual
maior que a Câmara dos Deputados: São Paulo, Rio de Janeiro e
Belo Horizonte. As demais 5.559
cidades têm menos dinheiro para
gastar do que o emergente Severino Cavalcanti e os outros 512 deputados federais.
A divisão dos R$ 2,477 bilhões
pelos 513 deputados dá R$ 4,82
milhões por congressista na Casa
criada para representar os interesses diretos dos eleitores brasileiros. Nenhuma cidade brasileira
tem tanto dinheiro por eleitor.
Só para comparação, segundo o
Tesouro Nacional, o orçamento
de São Paulo em 2003 foi de R$
11,511 bilhões. À época, o eleitorado da maior cidade brasileira era
de cerca de 7,7 milhões de pessoas. Ou seja, dá R$ 1.494,94 por
eleitor paulistano por ano.
Mesmo que se inclua na Câmara o número total de assessores,
aposentados, pensionistas e ocupantes de cargos de confiança,
além dos 513 deputados, chega-se
a um total de 20.579 pessoas. A
parcela do orçamento anual para
cada uma fica ainda em expressivos R$ 120.365,42.
Essas contas são feitas com base
no Orçamento proposto e aprovado para 2005. Não estão contabilizados eventuais aumentos de
gastos com a elevação de salários
prometida por Severino durante
sua campanha vitoriosa.
A Câmara é como uma pequena
cidade do interior com orçamento de metrópole. Os 513 deputados têm 15.666 funcionários na
ativa para atendê-los. Desses,
9.821 estão à disposição nos gabinetes dos congressistas, que podem também nomear outros
2.266 para os chamados CNEs, os
"cargos de natureza especial"
-pessoas que podem atuar nos
Estados e ganham de R$ 1.697,47
a R$ 5.474,10 por mês.
Esses CNEs concentram-se na
Mesa Diretora da Câmara e nos
gabinetes das lideranças partidárias. Na direção da Casa são 165
CNEs -sendo que Severino terá
21 à sua disposição na presidência. Nos gabinetes dos líderes partidários estão outros 386 CNEs.
Na história recente da Câmara,
nunca tantos representantes do
chamado baixo clero estiveram
tão presentes na Mesa Diretora.
Entre os sete titulares, cinco são
do Nordeste, um do Centro-Oeste
e um do Norte.
Quando se considera os 11 integrantes da Mesa Diretora da Câmara (sete titulares e quatro suplentes), nota-se que três (27,3%)
deputados são de Alagoas. Uma
desproporção em relação ao que
representa a bancada alagoana no
total da Casa -só nove (ou 1,75%
dos 513 deputados) são eleitos pelo Estado de Alagoas.
Do outro lado do Congresso,
outro alagoano está em posição
de destaque. Renan Calheiros
(PMDB) vai presidir o Senado Federal pelos próximos dois anos.
Desde a vitória de Fernando Collor de Mello para presidente da
República, em 1989, que Alagoas
não tinha tanta relevância na política nacional.
Como atua o baixo clero
O deputado do baixo clero é basicamente alguém que não teve
força política para conseguir ser
notado pela mídia dentro da Câmara. Aparecer num jornal de TV
é uma das formas de sobrevivência do congressista. Seu nome fica
em evidência e ele ou ela tem uma
chance maior de reeleição na próxima disputa.
Sem acesso à mídia, sua saída é
uma só: conseguir alguma verba
no Orçamento da União para
obras em cidades onde estão seus
eleitores. Todos os anos a história
se repete. Em novembro e dezembro os deputados coletam assinaturas de apoio a emendas ao Orçamento. Quando conseguem, o
passo seguinte é fazer a notícia
sair nos jornais de seu Estado.
O ato subseqüente é dizer: "Preciso do apoio dos meus eleitores
para pressionar o governo a liberar a verba da emenda". Aí começa uma série interminável de visitas a gabinetes na Esplanada dos
Ministérios. Como o país está há
décadas tentando reduzir seu déficit, as emendas paroquiais dos
deputados são as primeiras a terem sua liberação dificultada. Essa é uma das razões básicas para a
crônica desavença entre o baixo
clero e o Poder Executivo.
É comum ver deputados resmungando no caminho que os leva do plenário para o edifício conhecido como Anexo 4, onde estão a maioria dos gabinetes. É um
caminho longo, que inclui uma
passarela subterrânea apelidada
de túnel do tempo, pelas suas esteiras rolantes e paredes arredondadas serem semelhantes ao cenário de uma antiga série de TV
norte-americana com o mesmo
nome.
Grande parte do anedotário e
dos costumes da Câmara remete
um pouco aos anos 70 e 80. O
Anexo 4, por exemplo, é conhecido como Serra Pelada. Sua fachada amarela foi a deixa para que os
funcionários da Casa apelidassem
o edifício com o nome da região
do Pará onde prosperou um garimpo de ouro no início da década de 80.
O saguão da entrada principal
da Câmara é conhecido até hoje
como chapelaria, embora há muitos anos ninguém apareça por ali
com um chapéu para guardar.
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