São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 2005

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CASA SEVERINA

Eleição revela divisão interna do partido, que vê na conquista da Câmara chance de aumentar cacife para 2006

PP comemora ascensão de seu baixo clero

VERA MAGALHÃES
DO PAINEL, EM BRASÍLIA

PT e PMDB duelam para ter a maior bancada na Câmara, mas é um partido que chegou a ser dado como em extinção que passa a dar as cartas na Câmara com a eleição de Severino Cavalcanti (PE) para a presidência. O PP comemora a ascensão do chamado baixo clero ao comando do partido e da Casa.
A vitória de Severino mostra a existência de dois grupos também no PP. De um lado, os "intelectuais", como os próprios amigos do presidente chamam Delfim Netto (SP), Francisco Dornelles (RJ) e Ricardo Barros (PR), os dois últimos da ala que apoiou o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
De outro, os mais próximos de Severino, como o líder José Janene (PR), o companheiro Pedro Corrêa (PE) e os legítimos representantes do baixo clero Ciro Nogueira (PI) e Benedito Dias (AP), que coordenaram sua campanha.
São os últimos que deixam claro que querem ter a primazia na proximidade com Severino, embora os outros também estejam em franco processo de aproximação desde a vitória. Delfim, por exemplo, rapidamente foi alçado à condição de principal interlocutor do novo presidente da Câmara com o governo.
A iniciativa partiu antes do Planalto que de Severino, que confidencia a amigos que o ex-czar da economia sempre o "desprezou". Mas setores do governo acham que o pernambucano precisará recorrer a Delfim para formar opinião sobre temas espinhosos, como a autonomia do Banco Central.
Há ainda os que vêem em Severino um passaporte para reaproximar o PP de antigos aliados. Ricardo Barros, que foi líder do governo FHC, só aderiu à campanha nos últimos dias, mas procurou a oposição com um discurso de reaproximação. Lembrou que Severino é oposição ao PT em Pernambuco e que as alianças para 2006 estão longe de fechadas.
Esses deputados, alguns dos poucos representantes da elite da Câmara num grupo de similares a Severino, serão referências para um presidente que confia, mesmo, no seu grupo mais próximo.
É nesse meio que sobe a estrela do presidente do PP, Pedro Corrêa, tido como "parceiro" do comandante da Câmara. Embora o PP tenha passado a, ao menos publicamente, desdenhar a possibilidade de ter um ministério, há quem advogue o nome de Corrêa para a vaga que um dia seria de Pedro Henry (MT), o antigo líder, em baixa na nova configuração de forças na Casa.
Em sentido inverso, quem galga posições no xadrez do Legislativo é o até ontem desconhecido segundo vice-presidente da Casa, o piauiense Ciro Nogueira. Foi dele a idéia de lançar Severino, é de sua lavra o slogan "Uma Câmara para todos" e saiu do seu bolso boa parte da verba da campanha.
"O Severino é a figura mais querida do partido. Quando o PT lançou o [Luiz Eduardo] Greenhalgh, eu disse a ele: tem de ser você", disse o deputado à Folha.
Severino voltou de Buenos Aires nos últimos dias de 2004 para ser convencido a disputar a presidência. Tão logo anunciou a pretensão, passou a receber apelos para desistir. Coube ao consultor Mário Rosa a idéia de registrar em cartório a determinação de não voltar atrás.
Uma série de coincidências ajudou a impulsionar a campanha. Por exemplo: Severino insistiu em ter o apoio de Anthony Garotinho, mas não conseguiu. "Foi o melhor que podia ter acontecido, porque o Garotinho tirou votos do Virgílio", diz Nogueira.
O fato de Severino ter sido excluído de um debate de rádio também ajudou a criar um clima de "preconceito" que, na avaliação do novo clero, granjeou muitos votos para o "azarão".
Severino só viajou uma vez durante a campanha. Em compensação, foi o primeiro a encher os corredores da Câmara e até outdoors no aeroporto de Brasília de propaganda. A coordenação de campanha diz que a parafernália não custou mais de R$ 70 mil, que teriam saído de contribuições dos apoiadores.
Após a vitória, todos no PP são Severino desde pequenos. José Janene chegou a comprar briga durante uma reunião de líderes para defender o presidente da Casa. Lembra que, mesmo antes da campanha, era em sua casa que Severino almoçava duas vezes por semana. O líder do PP diz que "avisou" ao governo que não tinha como evitar o apoio maciço ao rei do baixo clero.
Tanta euforia se justifica pela proximidade de 2006. O PP vê na conquista da Câmara a chance de aumentar seu cacife. E começa aos poucos a desembarcar da aliança com Lula. "Não queremos um ministério para ficar 10 meses. Preferimos ficar independentes", avisa Janene.


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