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São Paulo, quinta-feira, 20 de março de 2003

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QUESTÃO INDÍGENA

ONGs atacam prática da era FHC mantida por presidente

Indigenistas ameaçam ir à Justiça contra governo Lula

RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de continuar submetendo ao Conselho de Defesa Nacional os processos de homologação de terras indígenas foi duramente atacada ontem por 15 organizações-não-governamentais indígenas e indigenistas, após um seminário em Brasília.
Por lei, o decreto de homologação, última fase do processo que garantirá a terra aos índios, pode ser assinado pelo presidente sem a apreciação do conselho, órgão consultivo para "assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático", formado por ministros, parlamentares e comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica.
A consulta, rara nos anos 90, só foi retomada em meados do ano passado, no governo Fernando Henrique Cardoso. Nos primeiros meses do governo Lula, tornou-se regra. O primeiro destino dos processos, ao saírem da Casa Civil, tem sido o gabinete do general Jorge Félix, chefe do Gabinete de Segurança Institucional e secretário-geral do conselho.
Na "Carta em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas", divulgada ontem, as ONGs indígenas e indigenistas ameaçam ir à Justiça contra atos do governo Lula que representem "providências estranhas ou omissões".
"[Tais atos] Podem vir a caracterizar crime de responsabilidade e ato de improbidade, sem prejuízo da responsabilidade civil da União", diz o documento.
A carta, resultado de um seminário realizado no Ministério Público Federal, é assinada pela Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), que reúne 75 organizações e 165 povos indígenas (com cerca de 200 mil índios), pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário), que tem 411 missionários em 112 pontos do país, pela Associação Brasileira de Antropologia e outras 12 entidades.
Segundo a carta, os órgãos públicos têm oportunidade de manifestação no decorrer do processo e "não se pode fazê-lo retroceder a etapas há muito superadas, sem que isso se configure grave desvio da legalidade".
Oito processos que aguardavam apenas a assinatura de Lula agora encontram-se "sob análise" dos conselheiros. São relacionados a cerca de 13,6 mil índios, em 2,55 milhões de hectares em três Estados (Roraima, Amazonas e Pará).
De acordo com parecer do setor jurídico da Casa Civil, ao qual a Folha teve acesso, um dos motivos levados em conta pelo órgão para protelar a homologação é a "pública e notória ocorrência de inúmeras manifestações no Estado (...) contrárias às demarcações de terras indígenas". Outros seriam "a grande extensão das áreas e presença de não-índios".
"É um tremendo retrocesso. É obrigação do governo homologar", disse o presidente da Coiab, Jecinaldo Saterê Mauê.
"Queremos crer que seja só uma manifestação voluntarista desinformada do governo", disse Márcio Santilli, ex-presidente da Funai e diretor da ONG Isa (Instituto Socioambiental).


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