São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2004

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Texto é considerado "leviano" e "infeliz"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A retratação do Exército em relação à sua manifestação inicial chegou no final de um dia em que críticas contra a instituição surgiram de todos os lados. Ministros, deputados, senadores e entidades falaram em recaída autoritária e classificaram a nota de domingo como "infeliz", "lamentável", "leviana", "um escárnio", entre outras manifestações.
Dois ministros falaram de forma mais direta. Tarso Genro (Educação) disse que a nota de domingo "não é produtiva" e que seu texto "contradiz a atual relação de respeito democrático que existe entre as Forças Armadas e a sociedade civil". "Lamentável. Acredito que o Brasil teve períodos de gigantescos sofrimentos naquela oportunidade toda", disse Waldir Pires (CGU).
Exército e o Ministério da Defesa sofreram pressão durante o dia para se retratarem -o que ocorreu no final da tarde. "O governo Lula não pode tolerar essa nota, que é violadora dos direitos humanos, defensora do golpe de 1964 e que usa chavões como "movimento comunista internacional". Tem que haver uma retratação ou não dá mais para o [José] Viegas [Defesa] ser ministro", afirmou o deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), integrante do movimento de defesa dos direitos humanos. "Com a segunda nota, o caso fica encerrado", disse.
O presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), disse que a manifestação de domingo representa um tempo que não existe mais. "A nota foi muito infeliz e reporta a um tempo que não existe mais. Na minha impressão, não tem correspondência no comando do Exército", afirmou.
O PPS divulgou nota em que fala em "escárnio". "Falar em movimento subversivo no quadro de um regime que se instaurou pela força das armas, rasgando a Constituição ao derrubar um presidente da República eleito legitimamente pelo povo brasileiro, é, antes de desrespeito ao bom senso, um escárnio", diz o texto, assinado pelo presidente da legenda, deputado Roberto Freire (PE).
Na Câmara, a única voz que se levantou em defesa do Exército foi a do deputado Ricardo Izar (PTB-SP): "Não dá para entender por que o jornal Correio Braziliense faz uma reportagem 29 anos depois da Anistia, depois que tudo acabou. (...) Acho que o Exército não poderia ficar parado depois de uma reportagem dessa. Tinha de fazer uma nota, sim, e foi feita essa nota. Agora, como foi feita, isso é outra coisa", disse
Além dos políticos, entidades com a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) se manifestaram: "A OAB repudia, veementemente, nota (...) [que] faz a apologia ao regime de exceção que vigorou no país patrocinando, impunemente, gravíssimas violações aos direitos humanos."
Para o presidente da instituição, Roberto Busato, a afirmação inicial do Exército de que não há documentos comprovando mortes durante o regime militar (1964-1985) é falha. "Existem outros meios de provar. O que é de notório conhecimento, não precisa ter documentos. O povo sabe bem o que aconteceu naquela época."
A OAB decidiu lançar uma campanha em defesa da República e da democracia, com ato inicial no dia 15 de novembro, no Rio de Janeiro.
A Fenaj cobrou investigação sobre a morte ou desaparecimento de 16 jornalistas durante o regime militar e manifestou repúdio à nota de domingo: "É no mínimo leviana a posição do Exército ao afirmar que não há documentos históricos comprovando as torturas, mortes e desaparecimentos."


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