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ANÁLISE
Candidata sem rebolado
FERNANDO DE BARROS E SILVA
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
Como um criador generoso,
ou um pai que vai casar a sua filha, Lula se esforçou para
emancipar a sua criatura no 4º
Congresso Nacional do PT. Fez
um discurso de 46 minutos para cumprir, nas suas palavras, "a
tarefa extremamente difícil de
convencer vocês a votar na
companheira Dilma".
A brincadeira tinha um fundo verdadeiro. Apesar do empenho para apresentar Dilma
como nome natural do PT e da
coalizão do governo, a condição
de Lula de fiador do processo ficou evidente: "Eleger a Dilma
não é uma coisa secundária para o presidente, é prioritário
para mim neste ano".
Frases de Lula como "Dilma
não pode ser candidata do vazio
porque é a candidata do mais
importante partido de esquerda do país", ou, então "só quem
não conhece Dilma pode achar
que ela faria o papel de tampão", pareciam confirmar, nas
entrelinhas, o artificialismo
que a sua fala procurava afastar
da candidatura.
Se Lula desempenhou o seu
papel, Dilma procurou fazer a
lição de casa. Não poupou elogios ao mestre. Logo de saída,
rendeu homenagens ao "nosso
líder, o meu líder, o presidente
Lula, o Lula". Atrás dela, um
imenso painel com a foto dos
dois abraçados trazia enunciado: "Com Dilma, pelo caminho
que Lula nos ensinou".
Na sequência, os dois discursos acabaram evidenciando as
diferenças de estilo e tamanho
dos personagens. Lula falou de
improviso. Com a desenvoltura
habitual e a audiência na mão,
desfiou um roteiro em que enumerava razões para o PT acolher Dilma. Falou da "coragem
política", da "capacidade gerencial", da "condição feminina".
Dilma leu o seu discurso no
teleprompter. Bebeu água várias vezes, parecia um pouco
nervosa, uma debutante. Apesar do esforço para dar naturalidade à sua fala, havia nela algo
burocrático e momentos de tédio professoral.
O discurso de Dilma tinha
três partes distintas: uma primeira, com acento sentimental, voltada para sua biografia e
história política; a segunda, em
que elencou os feitos do governo Lula, mas evitando fazer
menção à gestão FHC; e a última, enumerando desafios do
futuro. No final, chegou a chorar ao homenagear os amigos
mortos pela ditadura.
Foi uma festa e Dilma saiu
aclamada. Ouvimos músicas
exaltando a candidatura em vários ritmos -neossertanejo,
marchinha de Carnaval, batuque afro, no estilo olodum, até a
"Aquarela do Brasil". A superprodução, porém, não foi suficiente para garantir uma arrancada apoteótica. Fica a sensação de que ainda falta rebolado -"rebolation"- à candidata.
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