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SOMBRA NO PLANALTO
Paulo de Tarso Venceslau, que virou adversário da cúpula do PT após ser expulso, diz que ex-assessor era conhecido como "operador" do ministro
Ex-petista vê Dirceu cúmplice de Waldomiro
ELIANE MENDONÇA
DAS REGIONAIS, EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
A cúpula do PT se deixou domesticar pelo poder e, por isso,
adotou a prática de tentar abafar
escândalos. A conclusão é do economista Paulo de Tarso Venceslau, 60, que diz ter sentido na pele
os efeitos dessa prática em 1997,
ano em que acusou prefeituras do
partido de beneficiar com contratos a empresa de consultoria
Cpem (Consultoria para Empresas e Municípios).
A empresa é ligada ao advogado
Roberto Teixeira, compadre de
Luiz Inácio Lula da Silva -é padrinho do filho mais novo do presidente. Por conta das denúncias
que fez, foi expulso do partido, ao
qual foi ligado desde a sua fundação. "No PT é assim: quem esperneia é expulso", declarou.
A militância rendeu ainda episódios como o seqüestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick em 1969, em troca de 15
presos políticos, entre eles o ministro José Dirceu (Casa Civil),
que à época era seu amigo. Venceslau era militante da ALN
(Aliança Libertadora Nacional).
Um mês após o seqüestro do embaixador americano, o economista foi preso e torturado. Segundo
ele, por conta de sua paixão pela
revolução cubana.
De acordo com o economista,
Waldomiro Diniz, ex-assessor de
Dirceu que deixou o governo, a
pedido, após a divulgação de uma
gravação de 2002 na qual ele pedia
propina e dinheiro para campanha a um empresário de loterias,
era conhecido dentro do PT como
o "operador" do ministro.
Ele recebeu a reportagem na sede de um jornal de circulação semanal localizado em Taubaté (130
km de São Paulo), do qual é sócio-proprietário. Seguem os principais trechos da entrevista.
Folha - Pelo que o senhor conhece
de José Dirceu, de quem diz ter sido
amigo por 32 anos, foi sincero o
discurso que ele fez, em forma de
desabafo, na última quarta-feira,
dizendo ter vivido os piores 32 dias
de sua vida?
Paulo de Tarso Venceslau - Pode
ter sido sincero quando disse que
foram os piores dias da sua vida,
mas não quando ele afirmou que
não perdoava sua incompetência
de não ter percebido o que acontecia bem debaixo do seu nariz.
Folha - O senhor acha que houve
conivência com Waldomiro?
Venceslau - É inadmissível achar
que o Dirceu, com o acesso que
tem a todos os órgãos de informação -Polícia Federal, Exército,
Marinha e Aeronáutica- não
soubesse quem era Waldomiro.
Com certeza, o ex-assessor tinha a
cumplicidade dele e espero que a
Justiça apure todos os fatos e no
final não chegue à conclusão de
que o culpado é o mordomo.
Folha - Em sua época de militância, o senhor já tinha ouvido falar
de Waldomiro Diniz?
Venceslau - Sim, claro. Ele é um
antigo conhecido. Eu o conheço
desde quando ele freqüentava o
diretório do MDB [Movimento
Democrático Brasileiro, atual
PMDB]. Na época, ele era um funcionário Caixa Econômica Federal, eu acho. E, dentro do meio político, era conhecido apenas como
um "operador" de José Dirceu.
Folha - O que é um operador?
Venceslau - São chamadas assim
as pessoas que buscam recursos
para viabilizar campanhas, basicamente. O que posso lhe garantir
é que os dois se conhecem há
muito tempo, Com certeza, desde
os anos 90. Afinal, ninguém coloca alguém que não conhece, do
dia para a noite, em seu gabinete.
Folha - Na época do caso Cpem,
José Dirceu era presidente do partido. O senhor chegou a levar para
ele as denúncias?
Venceslau - Sim, antes e depois
de ele ser presidente do partido.
Isso porque eu descobri toda a falcatrua em 93, e a história só veio à
tona em 97. Quer dizer, fiquei
quatro anos no partido na esperança de que o PT tivesse autonomia suficiente para punir os corruptos e se mostrar digno daquilo
que pregava. Mas aí percebi que o
PT, na verdade, era o Lula.
Folha - O senhor se recorda do
que José Dirceu lhe disse à época?
Venceslau - Tem uma frase da
qual nunca vou me esquecer. Ele
disse: "Lula é um verdadeiro atraso para o partido". Ele [Dirceu]
sabia de tudo, estava informado
de cada detalhe, mas, mesmo assim, selou um acordo com Lula
que fez com que chegassem onde
estão hoje. Mas é evidente a hipocrisia e o cinismo marcados na relação dos dois [Dirceu e Lula].
Folha - Na época do escândalo
Cpem houve alguma pressão de petistas para que o senhor silenciasse? Houve algum oferecimento de
vantagens em troca de silêncio?
Venceslau - Sim, mas de uma
forma velada. Eu mesmo ouvi várias vezes do atual senador Aloizio Mercadante, na época, a pergunta: "O que é que você quer. Diga o que você quer com isso?" Como se eu tivesse feito tudo o que
fiz em troca de alguma vantagem.
Folha - Em uma entrevista de 96,
o senhor chegou a dizer que Dirceu
"acobertou as falcatruas". Acredita que isso possa estar acontecendo mais uma vez?
Venceslau - Sem dúvida nenhuma. Aliás, no caso Cpem, eu servi
de exemplo para mostrar aos demais militantes o que acontecia
com quem ia contra as idéias do
comando do partido. Se eles já
abafaram um escândalo, por que
não fariam de novo? A política para eles [Dirceu e Lula] está acima
de qualquer coisa.
Folha - O que o senhor sabe a respeito de Rogério Buratti? Temos a
informação de que ele assessorou
Dirceu e foi caixa de campanha do
presidente da Câmara, João Paulo
Cunha (PT). O senhor sabia disso?
Venceslau - Conheci Buratti na
época em que ele freqüentava a
executiva do partido, em São Paulo. Para mim, esse caso envolvendo o Buratti não causou surpresa.
Folha - Como é a relação de empresas ligadas a petistas com prefeituras do partido? Existe uma
prática de contratações?
Venceslau - Não sei se é uma prática. Mas é algo facilmente identificado, como produtoras de vídeo
e empresas de consultoria.
Folha - Na opinião do senhor, José Dirceu deveria ser afastado ou
afastar-se da Casa Civil durante as
investigações do caso Diniz?
Venceslau - É o mínimo que ele
deveria fazer, a exemplo do que
fez Eduardo Jorge, durante o governo de Fernando Henrique
Cardoso [1995-2002].
Folha - São típicas do PT as negociações feitas entre o governo e os
partidos da base aliada para enterrar a CPI dos Bingos e a do Diniz?
Paulo - Não do PT. É típico do
poder. E as pessoas que hoje estão
em Brasília estão domesticadas
pelo poder. O que vejo hoje é um
grupo de pessoas que já foi bem
intencionado, mas que mudou
completamente o comportamento. O poder corrompe as pessoas,
ao ponto de elas chegarem a perder os valores éticos e morais.
Folha - Depois de todo o episódio,
qual a avaliação que o senhor faz
hoje? Valeu a pena?
Paulo - Valeu, por um único motivo. Eu vou morrer podendo
olhar para o meu filho sem ter
vergonha de nada. O que já não
acontece com o Zé [José Dirceu].
Por exemplo, o recente episódio
com o Zeca Dirceu [filho do ministro], que conheci desde pequenininho, que mostra como ele
acabou sendo induzido a se beneficiar pelo tráfico de influência.
Pois, se ele não fosse o filho do
chefe da Casa Civil, ele não teria a
abertura que teve para fazer o que
fez. Isso é muito triste.
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