São Paulo, domingo, 21 de março de 2004

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CASO CC5

Documentos mostram que direção do Banestado e funcionários do Banco Central tinham conhecimento de esquema

BC sabia que contas tinham nome de laranjas

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM LONDRINA

A direção do Banestado e funcionários do Banco Central em Curitiba (PR) sabiam que contas CC5 (de não-residentes), usadas para enviar dinheiro para o exterior, estavam em nome de laranjas, de acordo com documentos e transcrições de depoimentos obtidos pela Agência Folha.
O Banestado (Banco do Estado do Paraná) foi privatizado em outubro de 2000. Antes disso, segundo força-tarefa formada por procuradores da República e policiais federais, foram abertas no banco diversas contas CC5 em nome de laranjas (pessoas usadas, muitas vezes sem saber, como agentes de transações irregulares ou fraudulentas, deixando oculta a identidade do verdadeiro autor).
Um dos documentos obtidos pelos procuradores Carlos Fernando dos Santos Lima e Vladimir Barros Aras, da força-tarefa, mostra como o assunto laranjas foi tratado pela diretoria do banco. É um parecer de maio de 1997 assinado pelo então assessor jurídico da presidência do Banestado, Fausto Pereira de Lacerda Filho.
O primeiro parágrafo diz: "A propósito da consulta vinculada à conveniência ou não de o banco manter as contas correntes, abertas em nome de laranjas, para viabilizar a movimentação cambial de doleiros, em que pese o desconforto moral que a prática possa acarretar, (...) há que considerar que, do ponto de vista legal, tal conduta se apresenta absolutamente legítima".

Detalhes
Em documento interno do Banestado datado de 18/02/1998, assinado pelo então responsável pelo câmbio em Foz do Iguaçu (PR), Benedito Barbosa Neto, e dirigido a um auditor do banco, há detalhes de como o banco operava com as contas de laranjas.
Barbosa Neto escreve, no documento, que a Tupy Câmbios e a Youssef Câmbios operavam com contas de laranjas por um período de 20 dias no máximo, sendo então substituídas por outras contas de laranjas.
O objetivo, segundo a Agência Folha apurou, era não chamar a atenção do Banco Central para grandes movimentações.

Banco Central
Em depoimentos à Justiça Federal, o doleiro Alberto Youssef, dono da Youssef Câmbios, afirma que dois funcionários do Banco Central em Curitiba -os responsáveis pelas operações de câmbio no Paraná George Pantelíades, o "Grego", e Rafael Schimidt Neto, o "Alemão",- sabiam das contas de laranjas.
Essa informação foi confirmada em depoimento por Gabriel Nunes Pires Neto, ex-diretor de câmbio e operações internacionais do Banestado.
Segundo a força-tarefa, depoimentos e documentos indicam que ex-funcionários do Banestado recebiam comissão dos doleiros que operavam as contas de laranjas para manter o esquema.
Os doleiros que pagavam essas comissões eram Youssef, de Londrina (PR), e José Luiz Mesa e Carlos Palmerola, da Tupy Câmbios, de Campinas (SP).
As contas de laranjas eram mantidas, principalmente, nas agências do Banestado em Foz do Iguaçu e Londrina.
Em depoimento à Justiça Federal, Youssef afirmou que pagava até US$ 120 mil por mês, especialmente entre os anos de 1996 e 1998, para diretores, gerentes e operadores de câmbio do Banestado.
O ex-diretor do banco Gabriel Nunes Pires Neto, também em juízo, confirmou o recebimento das comissões pela diretoria do banco. Ele próprio era um dos beneficiados no esquema.

Prisão de ex-diretor
Com base sobretudo nesses depoimentos, o juiz Sérgio Fernando Moro, da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba, determinou na última quinta-feira a prisão preventiva do ex-diretor e ex-vice-presidente do Banestado Aldo de Almeida Júnior.
Acusado de remeter R$ 1,9 bilhão para contas do Banestado em Nova York e para paraísos fiscais, Almeida Júnior foi preso sob a acusação de ter destruído provas. Ele já havia sido preso por 23 dias e libertado por decisão do TRF (Tribunal Regional Federal) de Porto Alegre.
Almeida Júnior ocupou os cargos de direção no Banestado entre janeiro de 1995 e outubro de 1997, quando teria montado o esquema com contas de laranjas para os doleiros.
Ele foi substituído por Gabriel Nunes Pires Neto na diretoria de câmbio do banco, que, segundo a força-tarefa, continuou com o esquema.


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