São Paulo, terça, 21 de abril de 1998

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PERSONALIDADE
Motta enviou texto escrito à mão por fax ao sítio do presidente, em Ibiúna, dez dias antes de morrer
FHC revela última carta recebida do "irmão'

da Sucursal de Brasília

O presidente Fernando Henrique Cardoso revelou ontem o teor de um fax que recebeu de Sérgio Motta dez dias antes de o ministro morrer. "Não se apequene. Cumpra seu destino histórico, coordene as transformações do país", escreveu Motta na carta (veja quadro ao lado).
FHC disse, em pronunciamento, que foi a "última manifestação consciente" do ministro, a quem definiu como "mais que um amigo, um irmão". O pronunciamento, feito no Palácio do Planalto, durou cerca de 7 minutos (leia íntegra abaixo).
Em memória de Motta, o presidente decretou luto oficial no país por três dias -até amanhã. Serão suspensas as realizações de cerimônias oficiais e as bandeiras serão hasteadas a meio pau em todos os prédios públicos.
Ao ler o fax, escrito à mão por Motta, num tom próximo do de despedida, FHC não conteve a emoção. Com a voz pausada e os olhos cheios de lágrimas, lembrou que o viu, na sexta-feira passada, em visita ao hospital, "praticamente sem forças".
O fax foi enviado para o sítio do presidente em Ibiúna (SP), minutos antes de Motta ser transferido para a UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital Israelita Albert Einstein.
Os familiares do ministro informaram FHC da morte no domingo, por volta das 24h, no Palácio da Alvorada. Pouco antes, ele havia chegado de uma viagem de três dias ao Chile.
No fax, Motta anexou uma cópia do editorial do "Jornal de Brasília", do dia 9, no qual há elogios ao processo de privatização da banda B da telefonia celular.
"São sinais como esses que quero que seu governo tenha, pois estarão na sua continuidade de vida", escreveu.
Motta creditou ao apoio de FHC o avanço na privatização do setor de telecomunicações. "Nada disso (é verdade!) seria possível na minha área sem seu apoio. Tudo o que propus está revolucionando o setor", escreveu.
Virtude
"Aqui se vê o Sérgio de corpo e alma. Ele atribuindo a outrem, no caso a mim, virtude que foi dele, de transformar o setor das telecomunicações", disse o presidente.
Em outro trecho, Motta afirmou que as "políticas de transformação" do país não podem ser afetadas ou alteradas em decorrência de processos conjunturais.
Ele concluiu com uma recomendação ao presidente. "Você nunca titubeou. Aja assim sempre em todas as áreas e conte comigo."
Motta escreveu ainda ter ficado orgulhoso ao saber que o primeiro-ministro inglês Tony Blair tinha convidado FHC a se integrar ao que chamou de "terceira via" -alternativa ao liberalismo e à intervenção do Estado na economia.
Inspiração
Segundo FHC, a memória de Sérgio Motta servirá de inspiração para os que acreditam "que é possível mudar as coisas, mudar para melhor".
"Ele (Sérgio Motta) se dedicou com muito entusiasmo às tarefas que lhe foram atribuídas para mudar e melhorar o Brasil. Isso vem de longe", disse o presidente.
Na sequência, FHC afirmou que Motta servirá de referência para os tucanos, mas também fará falta para os demais partidos, inclusive os de oposição.
"O Sérgio sempre foi um homem sério e comprometido", afirmou. "A vida é assim."
Para FHC, Motta era um militante que tinha profundas convicções e que lutava por objetivos e ideais. Segundo ele, "seu estilo afirmativo" eventualmente afetava as pessoas.
Porém, destacou, Motta "nunca guardou rancor e sempre foi capaz de refazer amizades".



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