São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ PT X PT

Ex-ministro declara estar certo da cassação e por isso se recusa a deixar a chapa do Campo Majoritário na eleição interna do PT

Dirceu quer sair do PT de "cabeça erguida"

KENNEDY ALENCAR
FÁBIO ZANINI

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os petistas que procuraram José Dirceu na última semana para que ele deixasse a chapa do Campo Majoritário que concorre nas eleições do partido ouviram do ex-ministro da Casa Civil e deputado federal um apelo: "Sei que vou ser cassado. Me deixem sair do PT com a cabeça erguida".
Os pedidos para que Dirceu se afaste da chapa que representa a tendência dominante no PT são feitas por moderados que temem um "efeito Quércia" no partido. Mesmo morto eleitoralmente, Dirceu manteria forte influência sobre a máquina partidária, como mostram suas seguidas vitórias contra a nova direção petista.
O ex-governador Orestes Quércia controla o PMDB paulista, apesar de ter perdido todas as eleições majoritárias desde que transmitiu o governo paulista a Luiz Antonio Fleury Filho em 1991. Quércia, eleito senador em 1974, na ditadura militar, foi um político importante até deixar o Palácio dos Bandeirantes.
Ciente de que perderá o mandato e os direitos políticos por oito anos devido ao escândalo do mensalão, Dirceu argumenta que, deixar a chapa do Campo Majoritário antes da decisão da Câmara, significaria assumir uma "condenação antecipada": "Não sou bandido e não quero ser humilhado. Cumpri missões partidárias", tem dito o deputado a ministros e assessores do presidente Lula. Ele prometeu que não dará declarações ou adotará atitudes para prejudicar o governo, tentando dividir responsabilidade com Lula.
Em troca, quer controlar o processo de sua saída do partido. Com a cassação, diz Dirceu, ele perderá a filiação partidária e estará fora do PT de qualquer modo: não poderá mais influenciar as decisões do Diretório Nacional. Deputados de seu grupo político que também correm o risco de cassação também deixariam a vida partidária compulsoriamente.
O problema é que o processo de cassação deverá ser longo, e os moderados do PT têm marcada a eleição direta do novo presidente do partido para 18 de setembro. Com Dirceu na chapa do Campo Majoritário e com suas intervenções nos bastidores, eles avaliam que poderão perder o domínio de dez anos sobre o partido.
O receio é o de uma alta abstenção, que leve não mais do que 25% dos 820 mil filiados às urnas, desiludidos com a crise que demoliu a imagem ética do PT. Nos últimos três anos, após a eleição de Lula, o PT ganhou 400 mil filiados, dobrando de tamanho.
Segundo cálculos de um dos coordenadores do Campo Majoritário, 250 mil dessas adesões são resultado do trabalho coordenado pelo ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira -hoje fora do partido-, a mando de José Dirceu.
Mas agora teme-se que esse inchaço, que parecia uma boa idéia para perpetuar no poder o grupo que o promoveu, saia pela culatra. "Essas filiações todas são frágeis, sem conteúdo. A maioria dos novos filiados certamente vai ficar em casa. Pior ainda, é provável que alguns deles, sentindo-se enganados, acabem optando pela esquerda", diz um dos expoentes do Campo Majoritário.
Hoje nem os mais convictos otimistas do Campo Majoritário crêem na possibilidade de uma vitória no primeiro turno, como se previa há menos de três meses. E, num segundo turno, temem a aliança entre representantes de correntes atuantes e disciplinadas no partido -como Raul Pont (Democracia Socialista) e Valter Pomar (Articulação de Esquerda)- e um candidato como Plínio de Arruda Sampaio, membro histórico do PT e que pode seduzir a militância "independente".
"Foi feito um processo de filiação em massa pelo Campo Majoritário, gente que veio sem a adequada formação política. Ouvi dizer que fizeram isso até pela internet. O número exato de membros é uma incógnita", diz Plínio.
Se o quórum for realmente baixo, acredita a esquerda petista, sua força aumenta. "Os filiados que entraram o fizeram na esteira da empolgação com Lula e hoje perderam isso. Ao mesmo tempo, nossos apoiadores são os militantes históricos, mais enraizados, que vão comparecer em grande número à eleição", declara Plínio.
Para enfrentar a ameaça de perder o controle do PT para a esquerda, os moderados gostariam que Dirceu seguisse o gesto do ex-presidente do PT José Genoino e se retirasse da chapa. Ao mesmo tempo, avaliam que terão de recorrer aos filiados recentes e que precisarão mobilizá-los por meio da burocracia partidária, como cabos eleitorais profissionais.


Texto Anterior: FHC já pensa na eleição de 2006 como candidato
Próximo Texto: O publicitário: BMG pretende tomar bens de Marcos Valério
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.