São Paulo, quinta-feira, 21 de outubro de 2004

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ECOS DO REGIME

José Firmino afirma que vigiou presidente durante congresso em 93

Cabo reformado diz que Lula foi espionado nos anos 90

Alan Marques/Folha Imagem
O cabo reformado José Alves Firmino segura bandeira do PT usada durante operações de espionagem das quais teria participado


ADRIANA CHAVES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM GOIÂNIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, partidos políticos, sindicatos e entidades estudantis foram alvos de espionagem na história recente. A afirmação é do cabo reformado José Alves Firmino, 34, que apresenta uma série de documentos para confirmar a atuação de arapongas no início e meados dos anos 1990.
Ele conta que agiu como espião infiltrado por várias vezes na década de 90. Um exemplo é documento nº 03 de 1993 do Serviço de Inteligência do Exército que descreve o 8º Encontro Nacional do PT, realizado em Brasília.
As denúncias são reforçadas por uma documentação desviada do Exército. Embora o caso já tivesse sido encaminhado à Comissão de Direitos Humanos da Câmara em 1997, voltou à tona depois que fotos inéditas supostamente do jornalista Vladimir Herzog foram encontradas no meio dos documentos.
O Centro de Comunicação Social do Exército informou que não vai comentar as afirmações de Firmino.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
 

Agência Folha - Como era sua atuação no Serviço de Inteligência do Exército?
José Alves Firmino -
Geralmente me passava por jornalista ou estudante ligado a algum movimento. O Exército conseguia os documentos. Em alguns casos a matéria até chegava a ser publicada em um jornal de Marabá (PA), que não me lembro o nome.

Agência Folha - Era sempre assim que você se infiltrava?
Firmino -
É. Por exemplo, no MST eu entrava como repórter, pedia exclusividade [para a suposta cobertura jornalística], justamente para que, caso aquele acampamento fosse invadido pela polícia, a mídia não tomasse conhecimento.

Agência Folha - Você ingressou no Exército em 1989. Quando você começou a atuar como espião?
Firmino -
A partir do ano de 1990, ainda como soldado. Mas ativo mesmo, fazendo infiltrações, a partir de 1992. Aí ficava infiltrado em partidos políticos, sindicatos, fazia campanas para o Lula, o Cristovam Buarque, a Alerte Avelar Sampaio, hoje deputada distrital, a Maninha, deputada federal pelo PT, o Agnelo Queiroz, ministro do Esporte, Sérgio Arouca. Além de lideranças de países como Cuba, que sempre foi uma preocupação do Exército. Assim como a Coréia.

Agência Folha - E sempre como repórter desse jornal de Marabá? Ele circula?
Firmino -
Sempre Marabá. É um jornalzinho lá, ligado aos órgãos de informação, se não for do próprio Exército. E depois, para dar um suporte maior, foram destacados alguns agentes para tirar documentos da Fenaj [Federação Nacional dos Jornalistas], espelhos de jornalistas. A missão foi distribuída para vários agentes. Em agosto de 1997, eu entreguei os documentos originais para a Comissão de Direitos Humanos e o caso veio a público.

Agência Folha - E o alvo principal era o PT?
Firmino -
PT, PC do B, PPS, esses partidos mais de esquerda. Mas aconteceu, por exemplo, o MR-8, ligado ao PMDB.

Agência Folha - Você tem uma foto com Lula. Onde foi tirada?
Firmino -
É de 1993, no 8º Encontro do PT. Na época, o general fez um comentário sobre a fala de abertura do Lula. Nele, avalia que há várias divergências dentro do PT, que o Lula estava dividido e que provavelmente não ganharia a eleição. E isso se confirmou. A aproximação era para saber que linha o Lula ia seguir, se era a ala moderada ou a radical, que preocupava o Setor de Inteligência.

Agência Folha - O Lula era espionado só em ocasiões específicas?
Firmino -
Sempre que o Lula ia a Brasília a equipe de São Paulo avisava a nossa, que fazia campana e o seguia aonde ele fosse.

Agência Folha - Como você teve acesso à documentação?
Firmino -
Me mandaram queimá-la. Eu estava sendo ameaçado na época e só uma parte, que falava da minha vida, das infiltrações, para provar. Aí eu recebi um presente na minha casa, eram três caixas entregues por um oficial. Não tem como um cabo arrancar 50 mil documentos.

Agência Folha - As fotos do Herzog já estavam no material encaminhado à comissão. Então, por que só agora você está falando sobre isso?
Firmino -
Porque nem eu sabia. Foi um repórter que descobriu a foto jogada lá na comissão e descobriu o documento por causa da morte do Herzog. Eu cansei de denunciar. Fui candidato a vereador em Goiânia neste ano porque pensei que a política iria me possibilitar ter acesso para continuar denunciando.


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