São Paulo, quarta-feira, 21 de dezembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ HORA DA FATURA

Advogados do empresário alegam que as dívidas "constituem fato público e notório'; CPI suspeita que empréstimos sejam de fachada

Valério cobra na Justiça R$ 100,6 mi do PT

PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como operador do "mensalão", recorreu à Justiça para cobrar do PT os empréstimos que alega ter feito para o partido: em duas ações, ele exige R$ 100.582.166,35 da legenda, em valores corrigidos.
Como o PT não reconhece as dívidas, alegando que elas não estão registradas e não foram aprovadas pela direção partidária, os advogados de Valério citam nas ações artigos do Regimento Interno e do Estatuto do PT. Segundo os advogados, o regimento dá à Secretaria de Finanças da legenda, então a cargo de Delúbio Soares, poderes para arrecadar recursos financeiros em nome do partido.
As ações, impetradas na última sexta nas 10ª e 11ª Varas Cíveis da Circunscrição Judiciária do Distrito Federal pelo escritório Rodolfo Gropen Advocacia, tratam dos empréstimos tomados por Valério para o PT e da parcela de outro que ele pagou como avalista do partido -R$ 55.941.227,81 e R$ 351.508,20, respectivamente.
Antes de recorrer à Justiça, os advogados do empresário dizem ter feito "tentativas amigáveis" de receber a dívida da direção do PT, mas o partido não reconheceu as dívidas que Valério contraiu nos bancos Rural e BMG.
Na ação ordinária de cobrança são cobrados os seis empréstimos feitos para o PT em nome da SMPB Comunicação, Graffiti participações e Rogério Lanza Tolentino e Associados (advogado e sócio de Valério). Os valores atualizados, conforme a petição, somam R$ 100.082.166,35. Essas dívidas foram contraídas entre fevereiro de 2003 e abril de 2004.
São R$ 55,9 milhões da dívida original e mais R$ 44,1 milhões de juros, atualização monetária e encargos financeiros (IOF e CPMF).
Na ação monitória, Valério pede que a Justiça reconheça ser ele credor de R$ 500.769,00 e, a partir disso, que seja executada a cobrança. Esse valor se refere a uma parcela de um empréstimo de R$ 2,4 milhões tomado no Banco BMG pelo PT. A parcela, de R$ 351 mil, foi paga por Valério, que era avalista nesse empréstimo juntamente com Delúbio e José Genoino, ex-presidente do PT.
Um dos advogados de Valério, João Manoel Martins disse que nas ações eles procuram "se cercar de todos os lados", de forma a contestar os argumentos do PT. Eles afirmam que operações desse tipo podem ser "objeto de contrato tácito ou mesmo verbal" e que essas dívidas já "constituem fato público e notório, [para] o qual a lei processual civil dispensa a produção de provas", citando reportagens na imprensa sobre os empréstimos e os depoimentos nas CPIs -especialmente os prestados por Delúbio, nos quais reconhece ter pedido os empréstimos.
Na ação, é citado o regimento interno do PT para tentar derrubar a alegada falta de aprovação da direção. Registraram o artigo 24, que diz que à Secretaria de Finanças do partido compete, entre outras coisas, "propor, organizar campanhas e meios de arrecadação de recursos para o partido".
Os advogados citam ainda o artigo 167 do estatuto do PT, que diz que "as instâncias dirigentes, em geral, e as secretarias de finanças, em particular, são responsáveis" pela criação "de formas e mecanismos que ampliem a arrecadação" e alegam que o estatuto "autoriza o tesoureiro-geral, que acumula a função de secretário-geral de Finanças, a proceder, isoladamente, à contratação de operações financeiras em nome do PT".
Em tese, segundo Martins, se a Justiça acatar os argumentos de Valério, o PT será cobrado judicialmente e, se não pagar, poderá ter bens e recursos financeiros penhorados. O advogado disse que ações desse tipo podem demorar, no mínimo, três anos.
A CPI dos Correios, que investiga o "mensalão", já levantou a suspeita de que os empréstimos seriam fachadas para acobertar desvio de dinheiro público. O senador Delcídio Amaral (PT-MS), presidente da CPI, declarou que a tese dos empréstimos para caixa dois "absolutamente não se sustenta". Um fato que reforça essa suspeita são os recursos da Visanet transferidos pelo Banco do Brasil à DNA, outra agência em que Valério era sócio: ao menos R$ 10 milhões dos valores transferidos estariam sem os serviços prestados correspondentes.


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