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NO PLANALTO
A quarta-feira reserva a Dirceu muitas cinzas
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
No instante em que o
tradicional bloco de sujos se rearticula em Brasília, o
camarada Zé Dirceu deveria
evitar as expansões carnavalescas. Melhor sair em retiro meditativo. A leitura pode ser boa
conselheira.
Nenhum livro é mais adequado que o "Testamento Político"
do cardeal Richelieu. Uma obra
rara, difícil de encontrar.
Para sorte do chefão da Casa
Civil, há na ociosa biblioteca do
Palácio da Alvorada uma boa
edição. Foi prensada em 1959
(Editora Atena). É improvável
que Lula venha a folheá-la. Dirceu deveria tomá-la por empréstimo.
Armand-Jean du Plessis, duque de Richelieu (1585-1642),
esteve para o rei Luís 8º da
França assim como Dirceu está
para Lula. Era o primeiro-ministro, o conselheiro número
um. Mandava e desmandava.
Graças à reputação que granjeou, foi para as páginas de "Os
Três Mosqueteiros", de Alexandre Dumas, como um vilão astuto.
Na "seção 2" de seu "Testamento", Richelieu ensina que o
bom conselheiro do rei deve observar duas coisas. A primeira:
"Os maiores espíritos são mais
perigosos do que úteis no manejo dos negócios; se não têm muito mais de chumbo do que de
mercúrio, nada valem para o
Estado".
A segunda: "Nada há mais perigoso num Estado do que pôr
em grande autoridade certos espíritos que não têm luzes suficientes para se conduzirem por
si mesmos e pensam, entretanto, ter demais para necessitarem de conselho alheio". Não há
na Esplanada espírito mais auto-suficiente que Dirceu.
Na "seção 3", Richelieu leciona que, "se um homem está sujeito às suas vinganças, dar-lhe
autoridade é pôr a espada na
mão de um furioso, é expor o
Estado a [...] muitos inconvenientes". Dirceu gosta de dizer,
em timbre de bazófia, que "dois
ou três telefonemas" bastam para aniquilar um inimigo.
Na "seção 4", Richelieu explica que, "de qualquer forma que
se toma a valentia, ela não é necessária a um conselheiro de Estado. Nem há necessidade que o
conselheiro tenha disposição a
expor-se a todos os perigos [...].
É suficiente que tenha o coração
em tão bom lugar que [...] os
empecilhos que possa encontrar
não consigam desviá-lo dos seus
bons e generosos propósitos". As
aurículas e os ventrículos de
Dirceu bombeiam bílis.
Na "seção 5", o cardeal diz
que, "em qualquer Estado que
esteja para o bem fazer, o conselheiro deve distribuir seu tempo
de sorte que tenha as horas para
trabalhar [...] e outras para dar
audiência a todo mundo, a razão exigindo que trate cada um
com cortesia e civilidade [...]".
Richelieu decerto não aplicaria
a uma boa alma como Fernando Gabeira um chá de cadeira
de mais de uma hora.
Na "seção 6", Richelieu sustenta que todo soberano deve
eleger entre os seus conselheiros
aqueles que, como ele e Dirceu,
tenham "autoridade superior"
sobre os demais. "É fácil de representar as qualidades que deve ter esse principal ministro; é
difícil de as achar todas num
mesmo homem [...]. A felicidade ou a desgraça dos Estados
depende da escolha que se fizer."
Na "seção 7", Richelieu trata
das inevitáveis "conspirações" a
que está sujeito o ministro predileto. "Imita-se nisto a pedra
jogada do alto de uma montanha. Seu primeiro movimento é
lento, e quanto mais ela desce,
mais peso toma, redobrando a
velocidade da queda [...]. É
muito difícil parar uma conspiração que, não tendo sido contida no nascedouro, já esteja
muito crescida." A pedra Waldomiro Diniz ainda não alcançou a metade da montanha.
Se chegar ao quarto capítulo
do "Testamento" de Richelieu,
Dirceu aprenderá que o primeiro conselheiro precisa "dormir
como um leão, sem fechar os
olhos [...], para prever os menores inconvenientes que podem
advir". Naquilo que diz respeito
"à conduta dos homens", é preciso "abrir duplamente os
olhos".
Avançando até o capítulo sétimo, Dirceu verá que "é muito
difícil encontrar pessoas que tenham todas as qualidades requeridas para os cargos que se
lhes destinam". Mais: "Se a
máscara com que a maior parte
dos homens cobre o rosto [...]
faz-nos desconhecidos a tal
ponto que, sendo postos nos
grandes cargos parecem tão
maliciosos quanto aí esperava-se que fossem virtuosos [...], é
preciso prontamente reparar o
engano".
Na pele de Dirceu, Richelieu
talvez identificasse na equipe
da Casa Civil outros Waldomiros que o conselheiro de Lula insiste em não ver. O cardeal não
titubearia em levar novas cabeças à bandeja.
Ainda no capítulo sétimo,
Dirceu verá que "um príncipe
que quer ser amado pelos seus
súditos deve preencher os principais cargos e as primeiras dignidades do seu Estado por pessoas tão estimadas por todo
mundo, que logo se possa achar
a causa da escolha no mérito".
Passando em revista os últimos conselhos que ministrou a
Lula, o camarada Dirceu talvez
se arrependa de ter urdido a incorporação de luminares do
PMDB ao primeiro escalão de
Brasília. A temeridade cobrará
o seu preço.
O primeiro-ministro de Lula
pula no ritmo de um samba que
ele próprio alinhavou. Que a
quarta-feira não lhe deite nos
olhos mais cinzas do que as que
faz por merecer.
Nova encrenca: a categoria
dos advogados públicos está
pintada para a guerra. Engloba,
entre outros, os advogados da
União e os procuradores da Fazenda Nacional e da Previdência. Reclamam melhorias salariais e na estrutura de trabalho.
Acenam com uma greve. Brasília faz ouvidos moucos. O movimento acontece num momento
em que o governo está de cócoras.
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