São Paulo, domingo, 22 de fevereiro de 2004

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TRABALHO ESCRAVO

Emenda visa permitir expropriação de fazendas com escravos, mas lei protege áreas produtivas

Terra produtiva pode ficar sem punição, diz Carta

IURI DANTAS
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O texto da emenda constitucional em tramitação no Congresso Nacional que prevê a expropriação de terras nas quais for constatada a existência de trabalho escravo abre espaço para que as áreas consideradas produtivas fiquem imunes à punição.
Isso porque a redação da proposta de emenda não sugere modificações no artigo 185 da Constituição de 1988, que coloca as áreas produtivas como "insuscetíveis" de desapropriação. Os índices de produtividade são verificados pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
O artigo constitucional 185 é considerado até hoje, além de uma proteção para os fazendeiros, como a maior vitória alcançada pela bancada ruralista e pela UDR (União Democrática Ruralista) durante o Congresso constituinte (1987-1988).
O artigo 185 praticamente anulou os efeitos de um outro artigo, o de número 186, tido como pró-sem-terra e que sugere a desapropriação de áreas que não cumprem sua função social (produtividade e respeito às leis trabalhistas e ambientais).
"Sem dúvida [o artigo 185] será o nosso paredão a partir do momento que se aprove essa proposta no Congresso. É uma forma de defesa, e vamos utilizá-lo", afirmou o advogado agrário Fernando Neves Baptista, que presta serviços à UDR nacional.

Expropriações
O objetivo da emenda do trabalho escravo, em discussão, é dar uma nova redação ao artigo 243 da Constituição, que prevê apenas a expropriação de áreas em que haja o cultivo ilegal de plantas psicotrópicas, como maconha. Com a nova redação, as expropriações atingiriam também as áreas onde houvesse trabalho escravo.
Outro advogado agrário, José Theodoro de Araújo diz que nenhum artigo da Constituição, numa referência ao 243, pode ser aplicado ou interpretado de forma isolada. "O contexto geral da Constituição é que vale, em caso contrário, sem dúvida, poderá haver contestação."
Para o advogado agrário Diamantino Silva Filho, "é preciso que o conceito de trabalho escravo fique muito claro no texto legal, porque senão haverá um ditatorial confisco de imóveis rurais", argumenta.
"O trabalho escravo é aquele que o trabalhador exerce tendo como remuneração: o transporte para o local do trabalho; alimentação; roupas; calçados; remédios, que só podem ser adquiridos da fazenda", afirma Diamantino.


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