São Paulo, domingo, 22 de março de 1998

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SUCESSÃO
Lei eleitoral contém brechas, e Tribunal Superior Eleitoral tende a absolver candidatos acusados de abuso
Uso da máquina deverá ficar impune

SILVANA DE FREITAS
da Sucursal de Brasília

O uso da máquina administrativa nas eleições deste ano deverá ficar impune por dois motivos: a lei eleitoral contém brechas e há no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma tendência de absolver acusados de abuso.
O TSE criou um obstáculo para a cassação de candidaturas ou de mandatos de eleitos: passou a exigir prova de que o ato ilegal apontado na ação tenha influenciado o eleitor a ponto de alterar o resultado da eleição.
A Folha apurou que essa exigência significará, na prática, uma espécie de salvo-conduto (caminho livre) a quem usar a máquina em proveito de sua candidatura.
A obtenção dessa prova é considerada praticamente impossível, porque os eleitores não indicam, ao votar, a razão da escolha de determinado candidato.
O advogado Antônio Vilas Boas Teixeira de Carvalho, que representa o presidente Fernando Henrique Cardoso, já está explorando o precedente criado pelo TSE.
Ele pediu ao tribunal que arquive duas investigações solicitadas pelo PT, com base em reportagens de jornais, sobre uso da máquina para influenciar a convenção do PMDB, no último dia 8.
Na convenção, a ala governista do partido saiu vitoriosa, ao conseguir rejeitar a proposta de candidatura própria -o que pode levar o PMDB a apoiar FHC.
Segundo Carvalho, o resultado da convenção não tem relação com o voto que será dado pelo eleitor em 4 de outubro nem alterou o equilíbrio das eleições.
O TSE entende que é preciso ficar provado o chamado "nexo de causalidade" antes que um político seja declarado inelegível durante alguns anos por ter cometido abuso do poder político.
Essa decisão, unânime, foi tomada no julgamento de um caso de Mato Grosso, de 1994. Ficou comprovado que o então governador Jaime Campos (PFL) e pelo menos quatro prefeitos usaram carros oficiais para ir a uma reunião de caráter eleitoral.
A lei que disciplina a eleição deste ano só permite o uso de meio de transporte oficial na campanha de FHC. Em tese, cada viagem dos governadores que concorrem à reeleição terá que envolver pelo menos dois aviões.
A locomoção do candidato deve ser paga pelo comitê de campanha e a dos servidores públicos, pelos governo. A regra vale até para automóveis.
A própria lei, que estabelece as regras da primeira disputa à reeleição no país, vai contribuir para aumentar o risco de uso indevido da máquina administrativa.
Não deixa explícito, por exemplo, o que os ministros podem e não podem fazer na campanha. Também não foi suficientemente clara ao estabelecer uma série de condutas proibidas aos agentes públicos, inclusive os candidatos à reeleição -que podem continuar nos cargos durante a campanha.
Ex-ministro do TSE, o advogado Torquato Jardim disse à Folha que o Congresso, ao elaborar a lei, adotou conceitos excessivamente subjetivos. Como exemplo, citou o item segundo o qual o presidente FHC poderá levar "comitiva em campanha" em viagem eleitoral.
As instruções baixadas pelo TSE para regulamentar as normas da lei eleitoral também não foram precisas sobre o tipo de servidor que poderá acompanhar FHC.
Relator das instruções, o ministro Eduardo Alckmin disse que o TSE não poderia esclarecer todas as dúvidas criadas pela lei. "Sempre há uma dose de subjetividade nesse tema (uso da máquina). Não há como alcançar a objetividade absoluta."
Torquato Jardim avalia que poderá ser inócua uma norma dirigida exclusivamente aos candidatos a presidente e governador: proibição de participação em inaugurações de obras públicas no período de 90 dias antes das eleições.
Segundo o advogado, o candidato à reeleição poderá exibir, no programa do horário eleitoral gratuito, as imagens de obras que tiver inaugurado até 3 de julho.



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