São Paulo, sexta-feira, 22 de julho de 2005

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Eventual impeachment já é debatido

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

"Impeachment". A palavra que há duas semanas ninguém ousava pronunciar já faz parte abertamente das conversas nos gabinetes, restaurantes, cafezinhos e corredores do Congresso Nacional, onde parlamentares de quase todos os partidos vêem uma rapidez estonteante na crise política, cada vez mais próxima do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Derrotada a discussão em torno de uma saída para Lula, que abriria mão da reeleição para desanuviar o ambiente político, proliferam idéias para se contrapor à possibilidade -temida pela maioria, mas considerada real por muitos- de os escândalos e as provas não deixarem alternativa que não seja a abertura de um processo contra o presidente.
Até mesmo o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen, que se opunha à tese do fim da reeleição, articulando para garantir o mandato de Lula até o fim e sua candidatura em 2006, já se mostra impressionado com a celeridade da crise.
Na terça-feira, ele se reuniu durante três horas com o pivô das denúncias, deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), e anteontem foi ao Rio com o líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN), para um almoço com a cúpula da Rede Globo. Em foco, as conseqüências da crise. Há quem compare os movimentos com aqueles da época do impeachment de Fernando Collor, em 1992.
Como voz discordante, o senador e vice-presidente do PFL, José Jorge (PE), apresenta dois sólidos argumentos. "Como falar em impeachment, se a popularidade de Lula se mantém estável e a estratégia do governo é acabar com o fio que resta da credibilidade do Congresso?", indaga. "Quem vai ter moral para cassar o mandato do Lula? Este Congresso aqui?"
Daí o aparecimento de idéias alternativas. Roberto Jefferson, que divulgou o nome e as contas milionárias do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza numa entrevista para a Folha, passou a defender a convocação de uma constituinte paralela ao atual Congresso, com candidatos avulsos (sem partido), para refazer o processo eleitoral, a composição e o funcionamento da Casa.
À esquerda, o deputado Fernando Gabeira (ex-PT, atual PV-RJ) se diz convencido de que Lula não tem condições de concluir o mandato e contou que vem discutindo com PPS e PDT a viabilidade constitucional de convocação de eleições diretas em todos os níveis, em janeiro do próximo ano. "Seria como começar do zero."
A fila dos que consideram que Lula poderá ser arrastado pelo vendaval de denúncias cresce.
Para o líder tucano no Senado, Arthur Virgílio (AM), "o impeachment não é conveniente, mas pode ser inevitável". Para o deputado Rodrigo Maia (PFL-RJ), integrante da CPI dos Correios, "[a oposição] não queria isso, mas fica cada dia mais difícil alguém acreditar que Lula não tinha nada a ver com tudo isso".
Muitos consideram que quem mais tenta preservar Lula são justamente PSDB e PFL, e o temor tem rosto e nome: José Alencar, o vice-presidente.
Ao mesmo tempo em que poderia impulsivamente baixar os juros com uma canetada, pondo em risco a estabilidade econômica, eles vêem um outro fantasma: e se Alencar flexibilizar a economia e consolidar apoios empresariais e militares que tem naturalmente? Ele seria, nesse caso, um forte candidato à Presidência em 2006.
Nessa linha de raciocínio, Lula fraco e tendo de se explicar dia e noite numa campanha seria um adversário muito melhor para um tucano do que José Alencar cheio de gás político.


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