São Paulo, segunda-feira, 22 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/LIGAÇÕES PERIGOSAS

Amigo de Lula, Paulo Okamotto preside uma instituição e é conselheiro do Instituto Cidadania, que fez o programa de governo do PT

ONG ligada ao PT recebe apoio do Sebrae

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

O Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), presidido por Paulo Okamotto, amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde os tempos do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, firmou, no início deste ano, uma parceria com o Instituto Cidadania, ONG ligada ao Partido dos Trabalhadores e fundada pelo próprio Lula em 1990, na qual Paulo Okamotto segue figurando como membro do Conselho Fiscal. O Cidadania liderou a elaboração do programa de governo de Lula para as eleições de 2002.
Segundo o coordenador executivo do Instituto Cidadania, Paulo Vannuchi, a parceria envolve orçamento de R$ 2,4 milhões (50% a cargo do Sebrae e 50% do Instituto Cidadania). A verba serviria para materializar o Projeto Política Nacional de Apoio ao Desenvolvimento Local.
No material de divulgação, lê-se: "O Projeto pretende sistematizar uma avaliação abrangente das (...) iniciativas de desenvolvimento local (...) buscando melhorar as condições de vida e produtividade com dinâmicas próprias, a partir de município, bairro ou região, sem esperar soluções que venham de cima."

Projeto adiantado
O folder promocional e o site do projeto são assinados conjuntamente pelo Sebrae e pelo Instituto Cidadania. No site, avisa-se que hoje, em Brasília, será realizada a 7ª Plenária da Coordenação, inclusive com a presença do ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto.
As atividades do projeto iniciaram-se em fevereiro de 2005 e previa-se a entrega dos resultados do trabalho ao presidente Lula em dezembro deste ano. "Mas vai ser difícil, com o clima político do país", admite Vannuchi.

Cronograma
No primeiro trimestre de 2006, segundo o cronograma do projeto, deveriam ser realizadas viagens e organizados eventos para apresentação dos resultados do trabalho a governadores, prefeitos, parlamentares dos vários níveis, associações empresariais e centrais sindicais, ONGs, universidades e centros de pesquisa, meios de comunicação.
Um participante paulista das plenárias do projeto que já foram realizadas disse à Folha que suas viagens a Brasília foram custeadas pela coordenação.
Perguntado se não considera haver conflito de interesses no estabelecimento de parceria entre o Sebrae, presidido por Okamotto, e o Cidadania, ligado informalmente ao PT e com Okamotto no Conselho Fiscal, o coordenador executivo Vannuchi disse que não. "O Comunidade Solidária da ex-primeira dama Ruth Cardoso também fechou parcerias com o Sebrae", afirmou.
Diferentemente do Instituto Cidadania, uma instituição privada, o Comunidade Solidária era um programa de governo, responsável pela coordenação e articulação de programas sociais do Governo Federal, e dele faziam parte 11 ministros de Estado.

Desaparecido
Com uma longa folha corrida de serviços prestados a Lula desde os anos 70, ex-tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, do PT e da campanha eleitoral de Lula à Presidência, em 1989, Okamotto estava longe de escândalos desde 1997, quando submergiu depois de ser acusado pelo ex-secretário das Finanças de São José dos Campos, Paulo de Tarso Venceslau, de ter montado um esquema para arrecadação de fundos para o PT em parceria com o compadre de Lula, Roberto Teixeira.
Okamotto ressurgiu no último dia 10, em meio a mais uma operação de socorro ao amigo Lula. Na ocasião, a CPI dos Correios investigava as condições em que se deram quatro pagamentos feitos por Lula entre dezembro de 2003 e fevereiro de 2004 para quitar uma dívida pessoal com o PT, no valor de R$ 29.436,26.
A CPI quis saber se a dívida teria sido paga com recursos provenientes de caixa dois, operado pelo publicitário Marcos Valério. Okamotto reapareceu para assumir a responsabilidade pelos pagamentos. Disse que retirou o dinheiro de sua conta e o entregou ao PT, que fez os depósitos.

"Brasileiros"
O PT informou que Okamotto, na qualidade de "procurador legal" de Lula, primeiro se recusou a reconhecer a dívida. Depois, parcelou-a em quatro vezes, quitando-a. Mas o fez, segundo a sua própria versão, em dinheiro vivo, o que impede a sua comprovação.
O lema do Sebrae é "Parceiro dos Brasileiros" e seus recursos (só este ano são R$ 800 milhões) provêm da arrecadação de 0,3% da folha de pagamentos das empresas em atividade no país. O INSS é a entidade responsável pelo recolhimento desse montante, depois repassados aos cofres do Sebrae. É o Tribunal de Contas da União quem aprova ou rejeita as contas do Sebrae.
Na qualidade de presidente do Sebrae, o amigo de Lula recebe salário mensal de R$ 24.263,80. O cargo veio-lhe por indicação do presidente da República, como é praxe no órgão, já que só o governo federal detém cinco das treze cadeiras no Conselho Deliberativo Nacional, o órgão máximo de deliberação do Sebrae.
Na sede do Instituto Cidadania, um prédio de três pavimentos no bairro paulistano do Ipiranga, a maior sala é conhecida como sala-fantasma. É a que foi ocupada por Lula entre os dias 7 de setembro de 1990 e o dia 4 de setembro de 1992, período em que permaneceu na presidência da ONG.
Hoje, a sala, que foi QG do movimento pela ética na política, abriga uma estante com suvenires reunidos por Lula durante viagens pelo país na condição de candidato. Muitas são estatuazinhas do próprio Lula.


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