São Paulo, domingo, 22 de setembro de 2002

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Missão impossível?


Os programas dos quatro principais candidatos ao Planalto prevêem, todos eles, uma combinação de inflação baixa, superávit comercial expressivo e taxa elevada de crescimento econômico, mas a última vez em que isso de fato ocorreu foi em 1950


GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os programas dos principais presidenciáveis se baseiam em uma combinação de resultados nunca obtida na história recente do Brasil: boa taxa de crescimento econômico, superávit comercial expressivo e inflação baixa.
O último ano em que os três feitos foram obtidos simultaneamente foi o de 1950, quando o país tinha um PIB (Produto Interno Bruto) de US$ 15 bilhões (equivalente ao do Equador de hoje) e vivia o início do processo de industrialização, enquanto o mundo se recuperava da Segunda Guerra.
O levantamento feito pela Folha procurou utilizar critérios pouco rígidos, se comparados às ambições dos candidatos: crescimento de 4% ou mais, superávit da balança comercial equivalente a pelo menos 1% do PIB e inflação anual de, no máximo, 15%.
Luiz Inácio Lula da Silva (PT), José Serra (PSDB), Ciro Gomes (PPS) e Anthony Garotinho (PSB) buscam taxas de crescimento superiores a 4,5%, pretendem elevar o atual superávit, de 1,5% do PIB, e prometem uma inflação em níveis civilizados. Pela estratégia comum a todos, a elevação das exportações tornaria o país menos dependente do capital externo, que hoje o país é obrigado a buscar pagando juros altos. Aberto o caminho para a queda das taxas, os investimentos das empresas e o consumo das famílias se expandiria, fazendo a economia crescer.
O crescimento geraria mais lucros, salários e empregos. A arrecadação de impostos aumentaria, e o governo, já com uma carga de juros menor, teria finalmente recursos para investimentos e programas sociais. A forma de atingir esses objetivos difere em nuances nos programas de governo (veja textos nesta página). A história ajuda a entender como será difícil.

Uma coisa de cada vez
Nas últimas décadas, o mais comum foi o país chegar a apenas um dos três resultados utilizados no levantamento (veja quadro).
No período mais prolongado de crescimento econômico, que vai da segunda metade da década de 60 ao final da década de 70, passando pelo "milagre econômico" do regime militar, o controle da inflação e a balança comercial foram sacrificados. A expansão industrial e tecnológica demandava do exterior máquinas e, principalmente, petróleo. O governo federal intervinha na economia para impulsionar setores considerados estratégicos, e o aumento de gastos puxava junto a inflação.
Com crescentes déficits nas transações com o exterior -que incluem, além do comércio, transações como o pagamento de juros e a remessa de lucros- e pouco disposto a sacrificar o crescimento, o país acumulou uma dívida externa que se tornou impagável no início dos anos 80.
O processo de redemocratização da vida política foi acompanhado, na economia, pela necessidade de produzir enormes superávits comerciais que permitissem regularizar os pagamentos aos credores externos. Os saldos da balança foram alcançados com desvalorizações da moeda nacional e bloqueios de diversos tipos às importações, que contribuíram para a explosão inflacionária.
Sem crédito no exterior, flertando com a hiperinflação e sob pressões políticas para o aumento de gastos públicos, o país passou a registrar taxas de crescimento medíocres e irregulares.

Plano Real
Lançado em 1994, o Plano Real sobrevalorizou a moeda nacional, barateou as importações e trouxe a inflação para os menores níveis desde os anos 40, quando foram lançados os primeiros índices de preços nacionais. O efeito imediato da melhora do poder aquisitivo trazida pelo plano foi um grande aumento do consumo, trazendo a esperança de que o crescimento seria, enfim, retomado.
O mesmo aumento do consumo, no entanto, provocou também a explosão das importações. Com déficit comercial, o país voltou a recorrer a empréstimos e investimentos estrangeiros.
Essa dependência não seria problemática com um cenário internacional favorável. Desde 1995, porém, crises no México, na Ásia, na Rússia, na Argentina e, agora, no mundo desenvolvido fizeram secar o fluxo de capital externo.
A partir de 1999, com a desvalorização do real, o governo passou a perseguir de novo os superávits comerciais. Ao mesmo tempo, teve de conter a alta do dólar, para não correr o risco de ver a inflação sair do controle. Os juros continuam em alta, para manter alguma entrada de recursos externos, desestimular o consumo e as importações, segurar a queda do real e cumprir as metas de inflação.
Neste ano, será registrado o primeiro superávit comercial razoavelmente expressivo desde 1994, decorrente da explosão do dólar (que trouxe uma inflação acima do desejado, mas ainda baixa para padrões locais) e do segundo ano consecutivo de crescimento pífio.


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