|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
POLÊMICA
A greve do Judiciário em SP justifica intervenção federal?
NÃO
Ameaça esquece responsável
CAETANO LAGRASTA NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Assusta ouvir (ou ler) o
pensamento do ministro
Presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Edson Vidigal,
a pregar a intervenção federal
em nosso Estado, tendo em vista
a greve dos funcionários do Poder Judiciário estadual; e, em
contrapartida, conforta a palavra de esperança do pesquisador e diretor de genética molecular do Instituto do Coração,
Dr. José Eduardo Krieger (edição de ontem da Folha), na busca de critérios científicos, que
instruam legisladores e juízes
O primeiro, ao embalo da
inauguração do pavilhão nacional no pátio da Corte, em nome
da democracia, profere ameaça,
a pretensos incentivadores do
movimento paredista, esquecendo-se do principal responsável, o Governador do Estado,
cuja intransigência pré-eleitoral,
sem qualquer base estatística;
estapafúrdios cortes no orçamento e constante lembrança à
lei de responsabilidade fiscal,
tornam letra morta a independência econômico-financeira
do Poder Judiciário.
A ameaça é proferida em termos inadequados, ao contrário
do que seria de esperar: "ou sentam-se todos à mesma mesa para conversar e acabar logo com
isso ou nós aqui de cima vamos
ter que encontrar uma solução",
partindo de inusitada superioridade hierárquica, arroga-se atribuir àqueles postura intransigente e desidiosa.
Sempre é bom lembrar que é
do STJ a competência para julgar os governadores, nesta residindo a crescente perda de poder político da justiça estadual e
o descrédito e penúria a que
submetida; mas não o julgamento de greve nos serviços essenciais.
Esquece-se o ministro Presidente de questionar ou mencionar quantos encontros foram
promovidos pelo TJ-SP com o
governador e que tipo de promessas ou negativas proferiu este, deixando aquele totalmente
desarmado perante seus funcionários e os que necessitam de
Justiça; esquece-se ainda de verificar qual a real extensão da
paralisação e o número dos julgamentos proferidos, em primeiro e segundo graus, apesar
do estado de greve; de cogitar se
esta seria justa e, por fim, de manifestar quais atitudes tomaram
os de lá de cima com relação à
regulamentação do direito de
greve nos serviços essenciais.
Cabe, neste ponto, à guisa de
parâmetro, a advertência do
cientista José Eduardo Krieger
quanto aos adiamentos e negociações espúrias, embutidas na
votação da Lei de Biossegurança, e apoio irrestrito à idéia de se
criar uma instituição que dê informações sobre ciência a legisladores e juízes, evitando-se que
prevaleça o confortável auto-engano.
Outra não é a situação na esfera jurídica a necessitar de instituições que pesquisem e analisem dados estatísticos confiáveis visando não apenas o enfrentamento de situações limite,
como a da greve, mas uma verdadeira reforma, que afaste a
improvisação, o "achismo" ou a
manipulação de dados.
O recém lançado Relatório de
Gestão, do ano 2003, do TJ-SP,
merece leitura atenta, para que
se tenha a exata compreensão
do gigantismo do movimento
forense, suas deficiências crônicas; o expressivo número de cargos vagos (funcionários, 11.000)
sem concurso etc, devidos primordialmente à redução arbitrária de seu orçamento, por imposição do Executivo.
Por fim, cabe perguntar se não
se iludem os que habitam as vizinhanças do poder central, especialmente alguns magistrados
mais afoitos e promíscuos, atraídos por falsos acenos de tratamento fidalgo e benesses orçamentários, quando se consumam, diariamente, ameaças à liberdade de imprensa, ao exercício de profissões, como a dos
advogados e psicólogos.
Assim, a cooptação de magistrados à dúbia conduta do governo seja central ou periférico
não é capaz de adequar a conduta de um Executivo, onipresente
e tentacular, que se impõe a um
Legislativo inoperante, como
forma de se atingir o efetivo Estado de Direito.
CAETANO LAGRASTA NETO, 61, é desembargador do Tribunal de Justiça de
São Paulo
Texto Anterior: Judiciário: Servidores decidem hoje se encerram greve Próximo Texto: Sim: Vidigal põe o dedo na ferida Índice
|