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São Paulo, segunda-feira, 22 de dezembro de 2003

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OPERAÇÃO ANACONDA

Conversa grampeada com o agente da PF César Herman Rodriguez mostra negociação para um falso empréstimo

Rocha Mattos é acusado de falsificar IR

FREDERICO VASCONCELOS
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O juiz federal João Carlos da Rocha Mattos, da 4ª Vara Criminal de São Paulo, foi acusado de falsificar a declaração de Imposto de Renda entregue neste ano para ocultar aquisição de bens (acréscimo patrimonial) sem comprovação de renda em 2002.
Relatório da equipe de inteligência da Polícia Federal conclui que se trata de caso de "lavagem de dinheiro".
Numa conversa telefônica grampeada pela Operação Anaconda, em 11 de abril, Rocha Mattos combinou com o agente da PF César Herman Rodriguez a simulação de um "empréstimo" de R$ 48 mil, com efeito retroativo a dezembro, quatro meses antes do telefonema. Rocha Mattos e Rodriguez estão presos.
"Você tem condições de me emprestar, no papel, né, pro dia 23, 24 de dezembro do ano passado, 50 mil reais?", perguntou o juiz.
Para evitar suspeitas, Rocha Mattos sugere ao policial, no telefonema: "Olha, é melhor, em vez de 50, [que] é um número muito redondo, 48 mil, tá?"
Rodriguez concorda com o "empréstimo", promete passar seus dados cadastrais por fax. Na declaração de Imposto de Renda de Rodriguez, relativa ao exercício 2003 (ano-calendário 2002), o policial discriminou no quadro da declaração de bens e direitos: "Empréstimo de R$ 48.000,00 realizado em 23.12.2002 para João Carlos da Rocha Mattos".
Rocha Mattos registrou em sua declaração, no quadro de dívidas e ônus reais: "Empréstimo contraído em dezembro/2002, com Cesar Herman Rodriguez, CPF 470.342.706-00: R$ 48.000,00".
No dia do "grampo", o juiz comenta o afastamento do desembargador Roberto Haddad, do Tribunal Regional Federal, na véspera, dia 10 de abril último.
A denúncia por formação de quadrilha feita pelo Ministério Público Federal afirma que, "dada a intimidade existente entre César Herman e João Carlos, vale-se o magistrado da colaboração do servidor da Polícia Federal para burlar o fisco".
A denúncia traz parte da conversa em que o juiz diz que a operação não despertaria suspeitas: "Para todos os efeitos, fica tranquilo. E outra coisa, eu, ainda na condição de juiz, é claro que qualquer pessoa emprestaria dinheiro, para agradar, né? Fica bem legal ainda, entendeu?"
Rodriguez lembra a amizade dos dois, mas pede ao juiz Rocha Mattos que formalize o empréstimo, sugerindo que ele faça uma promissória, com correção.
"Faz para mim, eu assino isso aí", respondeu Rocha Mattos.
Ao definir como seria feito o acerto de contas, o juiz revela que já previa afastar-se da Justiça.
"E depois, se eu não puder te pagar, a gente faz... Eu pago em serviços jurídicos, é uma merda, daqui há algum tempo você também não está, não é? Tudo bem."
O Ministério Público Federal juntou à denúncia a transcrição de outra gravação, uma conversa entre Norma Cunha, ex-mulher de Rocha Mattos, e o agente Rodriguez.
Segundo a denúncia, "o falso empréstimo é de conhecimento tanto da ex-companheira de João Carlos, Norma, bem como da atual (Aline)". Norma alega que Rodriguez "esquentou" dinheiro para encobrir a compra de um imóvel para Aline por Rocha Mattos. E afirma temer que Aline viesse a ser "responsável por mandar todos para a cadeia".
No segundo diálogo, a ex-mulher do juiz provoca Rodriguez: "Você está se saindo muito mal como planejador tributário".



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