São Paulo, sexta-feira, 23 de agosto de 2002

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'Mídia contribui para desinteresse eleitoral'

Folha - Qual é a influência da mídia na cena política americana?
Thomas E. Patterson -
Recentemente, aqui nos EUA, o principal aspecto da cobertura da mídia tem sido mostrar ao público os "defeitos" dos candidatos, o que prejudica o jogo político. A cobertura da imprensa é muito crítica, dando ao eleitorado a impressão de que a política é "viciada".
Na última eleição presidencial, por exemplo, [George W.] Bush e [Al] Gore foram alvo de incontáveis reportagens negativas. Isso tanto no que se refere ao conteúdo de seus programas quanto no âmbito pessoal. Em termos percentuais, cerca de 60% eram negativos, e somente 40% eram positivos. Isso mina a reputação dos candidatos perante os eleitores e gera um certo desinteresse.
A mídia americana gosta de atacar qualquer aspecto dos candidatos que seja passível de críticas. Nada é velho demais ou insignificante demais caso possa "render uma boa história". Assim, nos últimos dias da campanha presidencial, em 2000, a notícia de que Bush tinha sido pego dirigindo alcoolizado 25 anos antes foi manchete dos principais jornais durante três ou quatro dias.
Questões relacionadas à política externa e às propostas dos dois candidatos nessa área foram ofuscadas pela notícia que acabei de mencionar. A verdade é que a mídia procura "boas histórias", temas que sejam rentáveis editorialmente. E, em última análise, a imprensa americana prefere fatos negativos a positivos.
Com isso, ela não contribui para o debate político de modo positivo. Buscando a audiência a qualquer custo, a mídia não cumpre o papel social que é esperado dela e não assume a responsabilidade política que lhe cabe.

Folha - Como o público americano reage a essa constatação?
Patterson -
Todo mundo gosta de boas histórias, porém isso não significa que o interesse dos eleitores pela política aumente por causa delas. Nos estudos que fizemos sobre a eleição de 2000, descobrimos que, quando a história sobre Bush dirigindo alcoolizado veio à tona, houve uma grande resposta popular. Contudo isso ocorreu porque se tratava de algo sensacionalista. Ou seja, as pessoas querem ver o circo pegar fogo, mas isso não melhora o conceito que elas têm dos políticos.
A longo prazo, por outro lado, esse tipo de notícia prejudica o debate político na sociedade porque, na verdade, não tem nada de verdadeiramente político em seu conteúdo. Para os eleitores, a reputação dos candidatos e a validade das eleições têm diminuído com o tempo por causa desse tipo de cobertura da imprensa. É claro que isso não ocorre de modo maciço, porém é importante ressaltarmos que isso acaba ocorrendo.

Folha - Isso enfraquece as bases do sistema democrático?
Patterson -
Não creio que se trate de uma ameaça. Todavia é certo que esse tipo de cobertura não ajuda a fortalecer a democracia. A arena eleitoral tem um melhor funcionamento quando as pessoas são mais bem informadas e participativas. Isso não é uma verdadeira ameaça ao sistema democrático porque, com o tempo, as pessoas tendem a esquecer-se da tempestade de críticas de que são alvo os candidatos.
A maioria das democracias mais sólidas consegue transpor esse tipo de obstáculo porque o sistema como um todo é mais forte do que os ataques a ele desferidos. Por outro lado, seria positivo que o debate político levasse mais em consideração questões de conteúdo do que fatos isolados, que podem minar a credibilidade de algum candidato.



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