São Paulo, quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JANIO DE FREITAS

De armas e bagagens


Compras antes da certeza do que será adequado ao Plano de Defesa serão incertezas de precipitação injustificável


A VIAGEM à França e à Rússia que o ministro Nelson Jobim, da Defesa, pretende iniciar amanhã, e estender por duas semanas, suscita uma observação compreensiva e duas inquietações.
A saída de cena tem muita utilidade tática para Jobim, que guardou para as vésperas do sumiço o recuo de tudo o que afirmou nos seus dias de John Wayne brasiliense, derrubando pessoas a esmo, desmoralizando várias, ameaçando empresas, para se tornar o defensor dos desvalidos passageiros. E quem vai aos ares a partir de uma sala confortável de aeroporto é o bravo ministro, a caminho da conveniente ausência quando está sujeito a críticas irrespondíveis.
A viagem consta como relacionada a preliminares para a compra de armamentos, com a sugestão, dados os países escolhidos, de que se trate da esquadrilha de caças de última geração, desejada pela FAB. Não é uma boa ocasião para compra de armamentos. O Brasil ainda não tem o seu Plano Nacional de Defesa, havendo apenas a expectativa de que, lá para os meses finais do ano, seja concluído o trabalho que venha a ser, mas também pode não chegar a tanto, o retardatário plano.
Compras antes da certeza do que será mais adequado a tal plano serão incertezas de precipitação injustificável. Também porque, com ou sem plano, nada sugere urgências armamentistas do Brasil, apesar da exploração interessada que nesse sentido seja feita das armas compradas pela Venezuela de Chávez, ou das ebulições andinas.
Além disso, o provável é que um Plano Nacional de Defesa verdadeiro passe, em parte, pelo Congresso, ao menos em comissões técnicas incumbidas de orçamentos militares e de política externa. E Plano de Defesa não é só militar, envolve também componentes de infra-estrutura dependentes de administrações estaduais e municipais. Se é para haver um plano mesmo, nada disso se concilia com precipitações que têm mais propósitos políticos, à velha maneira de conquistar militares com a compra de uns quantos armamentos, do que conveniência real para o país. Tal convívio entre governos e militares é responsável, em grande parte, pela situação ambígua e insatisfatória das Forças Armadas, carentes, ainda, até da clareza precisa sobre a função militar em países como o Brasil e a Argentina, entre tantos outros.
Ainda que a reivindicação de novos caças, pela FAB, venha de anos, Jobim leva, como principal bagagem, a intenção projetada agora pelo convívio do Ministério da Defesa com a Secretaria de Assuntos Estratégicos: desenvolver uma política armamentista, no sentido mais forte da palavra. É a retomada da visão americanóide das duas a três décadas pós-Segunda Guerra, quando os militares dos Estados Unidos tutelaram os da América Latina em função de suas estratégias na Guerra Fria. Em seguida a essa fase, as ditaduras militares levaram os americanos a priorizar a ação policialesca das Forças Armadas em nossas bandas, e não mais a orientação própria das casernas. Além do interesse em incentivar a repressão, a "Doutrina MacNamara" concluíra que militares no poder terminariam por despertar-lhes ímpetos nacionalistas.
Também em outros sentidos, muitos, o armamentismo é um atraso.


Texto Anterior: Eleições: Primeira cassação de político "infiel" é anulada pelo TRE-RO
Próximo Texto: Polícia Federal vai investigar assassinato de Toninho do PT
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.