São Paulo, domingo, 24 de fevereiro de 2002

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ELIO GASPARI

Direito de resposta da procuradora Zandonade

Leia a seguir direito de resposta a artigo de Elio Gaspari concedido à procuradora da Fazenda Nacional Adriana Zandonade, em cumprimento da sentença proferida pela juíza federal substituta Marcia Souza e Silva de Oliveira, da 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo, nos termos do artigo 29 da lei nº 5.250/ 67.

 

A matéria jornalística publicada sob o título "O médico do DOI deixou uma aula para a procuradora Zandonade", na edição de 12 de março de 2000, nesta coluna, reclama esclarecimentos, pois transmite inverdades que agridem minha imagem pessoal e profissional.
Inicialmente, cabe registrar: a defesa da União no processo mencionado pelo jornalista foi por mim elaborada e subscrita não porque eu "quisesse" tê-lo feito, mas porque se tratava de dever inerente à função pública que exerço. Ao fazer a defesa da União, um procurador jamais "se mete em história" que não lhe diz respeito, apenas cumpre um dever legal.
É preciso observar que, se, por um lado, repugna ao interesse público a defesa de atos ilegais, praticados sob máscara de autoridade, por outro lado, a Constituição Federal assegura a todos os litigantes e acusados em geral o direito ao contraditório e à ampla defesa. Do ponto de vista processual, é elementar que quem acusa a União, ou quem quer que seja, pela prática de ato criminoso, deve, no mínimo, apresentar provas que corroborem tais acusações.
O ilustre jornalista, apoiando-se em peça processual que, estranhamente, quando da publicação de seus comentários, sequer havia sido juntada aos autos, fica indignado pelo fato de não ter sido aceito o depoimento do tenente-médico Amilcar Lobo como verdade absoluta. Em sua indignação, contudo, ignora noção básica: é ao Poder Judiciário que cabe decidir se as provas e os argumentos de uma parte são suficientes para que se tomem por verdadeiras suas alegações. Por outras palavras, é ao Poder Judiciário -não a jornalistas e nem a advogados- que compete julgar.
Quanto ao processo em questão, não há referências sobre o livro de autoria do tenente-médico seja na petição inicial, seja nos documentos com ela apresentados. Além disso, o jornalista deveria ter observado que não foi apenas a "procuradora Zandonade" que deixou de acatar "o depoimento do oficial" como prova absoluta da verdade. À fl. 37 do processo que comenta em seu artigo, consta que a matéria foi apreciada pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em outro processo instaurado pela senhora Inês, com o objetivo de responsabilizar o proprietário do imóvel em cujas dependências afirma haver sofrido a barbárie. Naquele processo, onde o tenente-médico foi ouvido, o mencionado Tribunal decidiu, categoricamente, que: "A rigor, de forma induvidosa, nem mesmo a presença da autora no local ficou caracterizada". Tal acórdão transitou em julgado.
Logo, se eu houvesse procedido como quer o articulista, aí sim teria cometido faltas graves, ética e funcional, pois, além de não oferecer defesa alguma, estaria "julgando" desde logo a questão proposta e subtraindo, com isso, a competência do Juízo Federal a cuja apreciação está o feito submetido.
No exercício de função pública, formulei a defesa da União utilizando os meios legais disponíveis, nos limites traçados pela Ética e sem jamais atacar a pessoa que pugnou por eventuais direitos, procedimento que, aliás, sempre pautou minha conduta profissional. Não defendi -jamais defenderia- a tortura ou a prática de atos ilegais, desumanos, degradantes ou criminosos, a atuação de "torturadores" ou "aparelhos tripulados por oficiais", como equivocadamente sugere o artigo em referência, que, por outro lado, silenciou quanto aos argumentos jurídicos sustentados na contestação.
As afirmativas no mínimo levianas e totalmente divorciadas da verdade em relação à minha pessoa, contidas na publicação ora respondida, mais do que repúdio, suscitam apreensão aos que militam perante o Poder Judiciário, pois o uso da imprensa não para informar, mas para agredir injustamente uma procuradora, por haver exercido com rigor ético a sua função institucional, é estratégia que se revela herdeira do triste período da história nacional que o próprio jornalista critica.
A verdade não é feita apenas com as alegações de uma das partes. Se tivesse o jornalista se inteirado quanto aos termos do processo judicial que é objeto de seus comentários, certamente não se teria posto a navegar em águas tão turvas.
Adriana Zandonade



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