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HERANÇA MILITAR
Lei atual só considera vítima quem morreu em dependências policiais no regime militar; famílias querem ampliá-la
Lula sofre pressão por lei para desaparecidos
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, que foi preso durante 31
dias por comandar greves no final
da década de 70, é pressionado
agora por antigos companheiros
a fazer uma nova lei que responsabilize o Estado pelo desaparecimento de pessoas em razão de
participação em atividades políticas sob o regime militar (64-85).
A lei que hoje está em vigor é
considerada muito restrita, já que
limita o conceito de vítima a pessoas que morreram "em dependências policiais ou assemelhadas". Isso exclui todos os que
morreram em passeatas ou manifestações públicas ou os que se
suicidaram quando na iminência
de serem presos pela polícia.
A expectativa em torno do tema
é grande. Muitos dos desaparecidos eram pessoas próximas a Lula
e a outros petistas que hoje estão
no primeiro escalão do governo.
É o caso do ministro-chefe da
Casa Civil, José Dirceu, que foi
anistiado político. Em 1996, Dirceu enviou uma carta à Comissão
Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos defendendo a responsabilidade do Estado na morte do estudante José Guimarães,
apesar de seu caso não se enquadrar na lei federal em vigor.
"O Estado deve reconhecer a
responsabilidade pela sua morte e
reparar sua família", escreveu
Dirceu na carta, colocando-se como testemunha do assassinato do
estudante por policiais durante
manifestação em 1968.
Como esse, o governo terá outros cem casos para analisar. O
problema é que na maioria dos
pedidos as vítimas não morreram
em dependências policiais, como
prevê a atual lei.
O secretário nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda,
reconhece que muitos pedidos serão negados se não houver um fato novo. "Evidentemente, dentro
da lei atual, serão novamente indeferidos."
A expectativa, principalmente
diante de um governo do PT, é
grande. O presidente do Tortura
Nunca Mais de Goiás, Waldomiro
Batista, 51, disse temer que o movimento tenha sido usado como
bandeira política para o partido
chegar ao poder. "Será que nós só
servimos de bandeira para partido de esquerda?"
Mal-estar
Se o tema é delicado para o PT,
ações consideradas desastradas
do secretário nacional de Direitos
Humanos poderão dificultar ainda mais o diálogo dos familiares
com o governo federal.
Nilmário Miranda, que foi
membro da comissão dos desaparecidos, teve sua ligação com os
familiares abalada após aceitar a
indicação do coronel da Polícia
Militar mineira Severo Augusto
da Silva Neto para o cargo de subsecretário nacional de Segurança
Pública, apesar de ele responder a
processo sob a acusação de prática de tortura.
"Isso é um caso superado e não
vai interferir em nada, é outro
âmbito", afirma o secretário, que
recebeu críticas pesadas de grupos de direitos humanos.
Miranda vem sendo criticado
também pela demora em anunciar propostas de trabalho e por
não consultar os familiares sobre
a composição da comissão
-procedimento que, segundo
eles, era comum durante a gestão
de Fernando Henrique Cardoso.
"Tínhamos mais abertura no
governo anterior do que no governo do PT", reclamou um dos
familiares, que prefere não ser
identificado.
O mal-estar chegou a tal ponto
que os parentes ameaçaram boicotar a primeira reunião da comissão com o secretário de Direitos Humanos, prevista para o
próximo dia 27.
O advogado Luís Francisco Carvalho Filho, presidente da comissão desde dezembro de 2001, interveio e enviou uma carta a Miranda para cancelar o encontro.
"A comissão já enfrenta uma série
de resistências por parte de setores do Estado e é inconcebível
que, nesse contexto, os familiares
não sejam consultados. Eu não
aceito ser presidente sem o apoio
dos familiares", afirmou.
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