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Pesquisadora propõe buscas em Xambioá
Myrian Alves, estudiosa da guerrilha do Araguaia, diz que 21 corpos podem ter sido enterrados em cemitério municipal
Ex-assessora da Comissão de Direitos Humanos diz que militares não estavam preocupados em ocultar os corpos de militantes mortos
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO
O cemitério municipal de
Xambioá (TO) deveria ser vasculhado pelo Exército que, em
julho, irá ao Araguaia à procura
de corpos de guerrilheiros mortos. A sugestão é da pesquisadora da guerrilha Myrian Alves.
Os militares usaram o cemitério para sepultar guerrilheiros mortos durante a repressão
ao movimento organizado pelo
clandestino PC do B nas selvas
do Araguaia nos anos 60 e 70.
Alves calcula que pelo menos
21 corpos podem ter sido enterrados no cemitério da pequena
cidade (cerca de 12 mil habitantes) na margem direita do rio
Araguaia, pouco mais de 500
km ao norte de Palmas (TO).
Em cumprimento à sentença
da Justiça Federal, em julho
tropas do Exército irão ao Araguaia para procurar restos
mortais dos cerca de 60 guerrilheiros desaparecidos de 1972 a
1975. A chance de achar restos
mortais de envolvidos no conflito é muito grande: "Para mim
é balela dizer que os corpos foram deixados na floresta".
Até hoje, a única ossada de
guerrilheiro identificada é a de
Maria Lúcia Petit, exumada em
1991 de uma cova no cemitério.
Em 1996, antropólogos da
Argentina estiveram em Xambioá e recolheram, em sepulturas oficiais do cemitério, três
esqueletos. Um deles, concluíram os pesquisadores, "pode
corresponder a um grupo de
seis pessoas que participaram
da guerrilha do Araguaia".
Os seis guerrilheiros foram
identificados no relatório. Entre os nomes estava o de Bergson Gurjão Farias, o Jorge, primeiro militante comunista
morto na mata, em 1972. Os outros cinco também podem ter
sido sepultados em Xambioá.
Relatório pericial concluído
neste ano por encomenda da
Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados
diz ser bastante possível que a
ossada seja de Gurjão Farias.
Ex-assessora da Comissão de
Direitos Humanos, Myrian Alves diz que os militares não estavam preocupados em ocultar
os corpos na mata, tanto que fizeram sepultamentos no cemitério, conforme depoimentos
de moradores, testemunhas e
até de militares que participaram da repressão à guerrilha.
"Eles mostravam os corpos à
população. Eles queriam que os
moradores soubessem que os
guerrilheiros estavam mortos,
o que acontecia com eles. Se enterraram alguns no cemitério,
porque os outros, mortos às vezes na mesma hora, seriam enterrados em outro lugar? Isso
não tem lógica, um no cemitério, outros longe", disse Alves.
Reforça a conclusão da pesquisadora o fato de, na guerrilha urbana, corpos de desaparecidos terem sido enterrados
em cemitérios oficiais como indigentes, como o de Perus (SP).
Até mesmo as cabeças cortadas de guerrilheiros podem estar no cemitério. Pelo menos
cinco deles tiveram as cabeças
separadas dos corpos, deixados
na floresta. Em exumações em
Xambioá, foram achados crânios isolados, o que levanta a
suspeita de que as cabeças foram enterradas ali. Afinal, não é
comum enterrar uma cabeça
longe do restante do corpo.
Como na época o Araguaia
era região isolada, os guerrilheiros conquistaram a princípio a amizade dos camponeses,
pois davam aulas para as crianças e medicavam os doentes. "O
dr. Juca [João Carlos Haas Sobrinho] era muito querido, era
conhecidíssimo da população.
Nas buscas, sempre surgia alguém para dizer que ele foi enterrado ali, em tal lugar. Os testemunhos sempre eram coincidentes. Se ele está ali, porque os
dois que morreram no mesmo
episódio [Manoel Nurchis e Ciro Flávio] não estariam?"
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