São Paulo, quarta, 24 de junho de 1998

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ELIO GASPARI
Uma nova encrenca

O departamento de astrologia política do Palácio do Planalto conseguiu um prodígio: desestabilizou os governadores dos três maiores colégios eleitorais do país. Se em 1994 alguém dissesse que no segundo semestre de 1998 o PSDB estaria com um pé fora do poder em São Paulo e em Minas Gerais, seria considerado um lunático. Se acrescentasse que a esta altura o tucanato fluminense estaria esterilizado, seria caso de internação. Pois quatro anos de política imperial resultaram exatamente nisso.
Um sincero eleitor de FFHH, sujeito capaz de acreditar nas virtudes reformistas de seu partido, está a pouco mais de cem dias da eleição na seguinte situação:
1) Em São Paulo, assiste ao sangramento de Mário Covas. Por mais que o estime, teme que ele não chegue ao segundo turno.
2) Em Minas Gerais, pode assistir à implosão de Eduardo Azeredo. Por mais que o louve, vai se habituando à idéia de vir a votar em Itamar Franco.
3) No Rio de Janeiro, o PSDB simplesmente entrou em órbita. Resta-lhe Cesar Maia.
Esse sincero eleitor de FFHH está sendo delicadamente conduzido para as seguintes situações:
1) Em São Paulo, caso queira honrar a coligação presidencial, pode votar em Paulo Maluf, coisa que ele, como o professor Fernando Henrique Cardoso, se orgulha de nunca ter feito. Do contrário, vota no candidato do PDT ou do PT, ambos anexos à chapa de Lula.
2) Em Minas, pode votar em Itamar, mas a partir do momento em que toma essa decisão, é obrigado a ouvir com mais atenção os despautérios do ex-presidente contra FFHH. Nada garante que seja capaz de resistir à tensão de votar ao mesmo tempo no insultante e no insultado.
3) No Rio, se por qualquer razão resolver não digerir o ex-prefeito Cesar Maia, seu curso natural será uma recaída brizolista, com todas as sequelas que isso acarreta.
Nesses três Estados vivem cerca da metade dos eleitores brasileiros. Em 1994, eles deram a FFHH 16,3 milhões de votos, contra 7,4 milhões dados a Lula. Numa conta marota, meramente ilustrativa, se esses três Estados tivessem votado no sentido inverso (dando a Lula a vantagem que deram a FFHH), a chapa petista teria sido a mais votada no primeiro turno.
Hoje, parece improvável que o presidente consiga no Rio de Janeiro uma vantagem de 1,5 milhão de votos, como conseguiu em 1994. Se ganhar por 1,5 mil, talvez se dê por satisfeito, pois arrisca perder. Não há pesquisa que ampare uma diferença de 4,4 milhões em São Paulo. Também parece exagerado acreditar que possa vencer com 3 milhões de frente em Minas (com Itamar candidato, fustigando-o).
Em 1994, seria perfeitamente razoável que três amigos se encontrassem, dizendo que votaram em FFHH, Covas, Azeredo e Marcello Alencar. Havia algo em comum nas quatro escolhas. Agora, esses três cidadãos arriscam um novo encontro, tendo votado em FFHH, Maluf, Itamar e Cesar Maia. Quatro anos depois, em vez de ganharem em coerência, perderam o nexo.
Isso não significa que FFHH esteja a caminho de uma derrota, até porque o engenheiro Leonel Brizola é capaz de fazer coisas incríveis para desestabilizar o eleitorado de Lula. Significa apenas que o tucanato comprou mais uma encrenca.



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