|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIO GASPARI
De Tancredo@edu para Lula@com.br
Estimado presidente, Estamos aqui só nós dois,
doutor Getúlio e eu. Ele o detesta
e assegura que o senhor não sabe
que dia é hoje, pois confunde a
história de nosso povo com a cronologia do governo de sua gente.
Há 51 anos, o presidente Vargas
matou-se com um tiro no peito.
Eu tinha 44 anos e era seu ministro da Justiça. Nunca esqueci
aquela noite no Palácio do Catete. Doutor Getúlio prefere não
lhe falar, mas me autorizou a
mandar-lhe esta mensagem. Ele
a leu.
Antes de mais nada, para que
o patrício não embale ilusões,
quero dizer-lhe que por cá sabemos de tudo. Coisas que só o senhor e o ministro Antonio Palocci sabem e coisas que o doutor
Tarso Genro preferiria não saber. É com esse cabedal que lhe
escrevo.
Seu governo acabou, sua lenda
diluiu-se e seu PT divide-se entre
patriotas perplexos, aproveitadores apanhados e mandriões
dissimulados. Outro dia, o marechal Castello Branco passou por
aqui rindo muito. Ele diz que o
senhor caiu na mão da politicagem porque não reformou a máquina sindical corrupta que tanto denunciou. O próprio Castello
julga conveniente que lhe ofereça um caminho. Faço-o mais
preocupado com as instituições
nacionais do que com sua biografia. Serei claro até onde posso: quero preservar o mandato
de um cidadão escolhido pelo
voto direto de 53 milhões de eleitores. Vou um pouco além: não
podemos permitir que os brasileiros sejam governados, nem
por um dia, por um presidente
eleito indiretamente. Fui claro?
Sugiro-lhe o seguinte: desista
da reeleição, mas não conte a
ninguém, nem a dona Marisa, a
quem Risoleta manda suas lembranças. Faça do doutor Antonio Palocci o seu candidato. Sem
trair os compromissos de sigilo
que sou obrigado a cumprir, posso adverti-lo de que o ilustre ministro ainda tem muito lixo no
caminho, sobretudo umas latas
de molho de tomate com ervilha.
Não entendi o que isso quer dizer, mas nada me custa preveni-lo.
Seu tumultuado passado permite que vá ao povo lembrando
que sempre condenou a reeleição, oferecendo-se ao julgamento da nação com a candidatura
do doutor Palocci. É verdade que
o senhor vai oferecer como futuro a negação de seu passado,
mas essa escolha foi sua e, convenhamos, vosso passado foi uma
invenção. Um pio desejo alheio.
Quando eu ia tomar posse, em
1984, calculei consumir o primeiro biênio com medidas impopulares. Pergunte ao Francisco
Dornelles, o meu admirável sobrinho que coloquei no Ministério da Fazenda. O senhor fez coisa parecida, mas tomou gosto
pelos aplausos da plutocracia e
já se passaram quase três anos
de ruína para a produção. O distinto amigo tornou-se um militante do ardil, mas esse ponto é
despiciendo. O fato é que o doutor Palocci é hoje o preferido da
banca daqui e do Ultramar. Ao
contrário do que sucedeu ao
doutor Getúlio em 1954 e até ao
Jango em 1964, a porta da direita
está à sua disposição, generosa e
grata. Tome-a, porque a da esquerda finou-se.
Não lhe prometo que esse caminho leve o doutor Palocci ao
Planalto.
Também não lhe digo que me
deixei impressionar pela entrevista que ele deu no domingo.
Asseguro-lhe, contudo, que a
candidatura do ministro da Fazenda levará o estimado presidente de volta a São Bernardo
sem que seu governo arraste ao
descrédito as instituições nacionais.
Como humilde concidadão,
subscrevo-me pela pátria,
Tancredo Neves
Texto Anterior: Alckmin articula parceria com Aécio Próximo Texto: Escândalo do "mensalão"/CPI dos Correios: Banco não licitou contrato com firma ligada a Delúbio Índice
|