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ANÁLISE
Governo ignora lições da floresta atlântica
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
O mais deprimente na batalha em torno do Código Florestal não são as repetidas tentativas dos ruralistas de desmontá-lo, nem as repetidas reações do
Meio Ambiente para manter as
proibições. O que deprime é o
fato de essa mesma batalha já
ter sido travada antes, na mata
atlântica, sem que o governo tenha tirado dela nenhuma lição.
A floresta perdeu, claro.
Aconteceu em 1961, ano de
aprovação do Código Florestal,
a mesma lei que se tenta mudar
agora. A legislação estabelecia
que 20% da área das propriedades rurais fosse deixada como
reserva legal de floresta. Quem
tivesse desmatado a mais deveria recompor suas propriedades, sob pena de multa.
"Mas o fim da isenção fiscal
para áreas com floresta, além
das injeções cada vez maiores
de créditos na agricultura, tiveram o efeito pernicioso de tornar extremamente caro até para os fazendeiros mais conscienciosos preservar o mínimo
de 20% de floresta, e inteiramente além de seu orçamento
reservar quaisquer trechos de
mata." Assim, escreveu há 15
anos o brasilianista Warren
Dean no livro "A Ferro e Fogo",
que tanto Carlos Minc quanto
seu rival Reinhold Stephanes
fariam bem em ler.
Por conta disso, as áreas desmatadas de floresta atlântica
no Sudeste não puderam ser recompostas a partir de 1970.
O mesmo destino aguarda a
Amazônia: com uma exigência
de 80% de reserva legal, imposta por uma medida provisória
que alterou o código em 1996, e
um passivo ambiental imenso
(o limite de desmatamento antes disso era 50%), ficou caro
demais para os fazendeiros reflorestarem suas áreas. Ninguém nunca fez isso, apostando
que o limite de 80% seria derrubado um dia. E esse dia parece estar chegando.
Quase cinco décadas depois
da aprovação do código, o Brasil continua sem uma política
fiscal florestal. Não há isenção
fiscal para áreas de floresta
nem crédito oficial para reflorestamento ou para o manejo
sustentável de madeira em
áreas replantadas com mata
nativa. Em compensação, sobra
crédito barato e apoio governamental para plantar capim.
O governo poderia resolver
essa tragédia com uma canetada esperta. Não o faz. No apagar
das luzes da gestão Marina Silva, em 2008, uma tal Operação
Arcoverde prometia cortar pela
metade os juros da atividade
madeireira e do reflorestamento. Inexplicavelmente, Minc
manteve a proposta na gaveta
por um ano e meio, para ressuscitá-la agora com novo nome. A
medida é bem-vinda. Mas chega com 48 anos de atraso.
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